Maravilhas do Mundo Prog: Triumph – City [1977]

Maravilhas do Mundo Prog: Triumph – City [1977]

Por Mairon Machado

O ano de 1976 foi o mais importante para a história do rock progressivo no Canadá. Afinal, foi a partir dali que o Rush, com o lançamento de 2112, fincou os pés no chão e mostrou ao mundo que mesmo com a queda vertiginosa do progressivo na Inglaterra, era possível sobreviver do estilo na América do Norte, seguindo uma carreira de sucesso com os álbuns A Farewell to Kings (1977), Hemispheres (1978), Permanent Waves (1980) e Moving Pictures (1981).
Mas o Rush já vinha fazendo shows e participando do cenário musical desde o início da década de 70. Geddy Lee (baixo, vocais), Alex Lifeson (guitarras) e Jonh Rutsey (bateria) serviram de influência para muitos jovens canadenses que saboreavam o hard zeppeliano da fase inicial consagrado em canções como “Finding My Way” e “Working Man”. A entrada de Neil Peart para o lugar de Rutsey consolidou o Rush como o principal nome do rock canadense depois do The Band, e mudou a vida de diversos garotos que passaram a aprender bateria.
Rik Emmet, Gil Moore e Mike Levine

Foi nessa atmosfera dominada pelo Rush que nasceu outro grande trio canadense, o Triumph. Formado em 1975 no bairro de Mississauga, Ontario, sua história começou quando o office-boy Richard Gordon “Rick” Emmett (guitarra e vocais), conheceu “Gil” Moore (bateria e vocais) e Michael “Mike” Levine (baixo).

A amizade musical entre os três levou-os a formar o Triumph em poucas semanas, tendo como ideia, seguir a linha de um outro grande monstro do Canadá, o Moxy, o qual fazia um hard mais ameno em comparação às pesadas composições do Rush, tendo nos vocais um ex-colega de Gil, Buzz Shearman.
Gil estava interessadíssimo em seguir o que Shearman estava fazendo no Moxy. Afinal, foi quando ambos trabalhavam no grupo Sherman & Pabody que nasceu o embrião do que veio a ser o Moxy. Mas, do outro lado, Rick e Levine vinham com outras experiências musicais. Rick era um guitarrista de mão cheia. Tendo uma habilidade incrível com a mão direita, fez aula de violão clássico e era um fascinado seguidor do rock inglês. Já Levine era multi-instrumentista, tocando teclados, baixo, guitarras, violão e bateria (se necessário), também viciado no rock inglês.
Rik Emmet e Mike Levine
Rik Emmet e Mike Levine
A fusão desses três elementos só podia gerar uma coisa: boa música. E assim foi, como pode ser conferido no álbum de estreia, Triumph (1976). Um petardo, com canções hardeiras extremamente grudentas, e que trazia algo inesperado para o que estava planejado: um tempero progressivo na longa canção “Blinding Light Show / Moonchild”. Em um disco que parece ter saído de uma sessão de gravações do Led Zeppelin, essa canção serviu como inspiração para que o grupo passasse a investir em algo mais viajante, que explorasse ainda mais o talento do agora batizado Rik Emmet (já que um erro na grafia da capa de Triumph acabou fazendo com que o C fosse apagado, tornando o guitarrista conhecido então como Rik).
Gil Moore

Depois de um ano fazendo shows e compondo, o grupo lançou Rock & Roll Machine no final de 1977, e nele registraram uma peça seminal e fantástica, que apesar de pertencer a um grupo não ligado ao rock progressivo, possui toda a sonoridade, imponência e precisão do gênero, sendo assim legitimamente merecedora do título de maravilha prog. O nome dessa pequena suíte: “City”.

Dividida em três partes, “City” é uma avassaladora canção, com dois terços como instrumental, mostrando o talento de Rik Emmet na guitarra e no violão. Ela abre com “War March”, inspirada no “Bolero” de Ravel, em uma melodia apreensiva, começando com os sintetizadores e com barulhos de ondas no mar. Gil executa o tema de “Bolero” na caixa, com acompanhamento de Levine, para Rik começar um solo repleto de distorção. O volume das batidas vai crescendo, assim como a faixa de inspiração, e a guitarra faz as batidas na mesma cadência da bateria.

O solo ganha mais vigor com a entrada do órgão, enquanto o volume do tema aumenta, encerrando a primeira parte em diversas viradas de Gil, chegando em “El Duende Aconizante”, onde o tema central da peça clássica “Asturias” (de Isaac Albeniz) é relembrado. Rik comanda o violão em uma belíssima sessão flamenca, esbanjando dedilhados rápidos e virtuosismo com um acompanhamento sensacional, em uma levada rápida e contagiante. O solo de Rik é muito veloz, e é complicado entender como ele executa as notas com tanta rapidez em um violão de cordas de aço.

Rik Emmett
Por fim, os teclados e o dedilhado do violão abrem “Minstrel’s Lament”. Os vocais agudos de Rik cantam a letra, acompanhados pelo violão. Aos poucos, sintetizadores imitando flautas e violinos são adicionados, bem como violão e mellotron dão continuidade à letra, ganhando um suave ritmo com a entrada do baixo e da bateria, acompanhados pelo violão e pela marcação da guitarra.

Rik canta muito, e o tema de “War March” abre espaço para um dos mais lindos solos que Rik compôs. Com notas muito lentas, ele preenche a canção como um recheio de uma trufa, emocionando e arrancando arrepios para cada pequena escala extraída de suas cordas. A canção ganha velocidade, entrando em uma sequência de terças menores, onde Rik encerra a letra, acompanhado por mais um solo de guitarra, terminando essa maravilha com acordes de órgão e uma forte batida nos pratos.

Versão norte-americana, batizada de Rock ‘N’ Roll Machine

“City” saiu apenas na versão canadense de Rock & Roll Machine, já que nos Estados Unidos o álbum foi lançado como sendo uma mescla dele mesmo com seu antecessor. Nessa segunda edição, que saiu inclusive com uma capa totalmente diferente, “Blinding Light Show / Moonchild” ocupou o lugar de “City”. O erro permaneceu também na versão europeia, e somente com a chegada do CD, esses países tiveram a oportunidade de conhecer a maravilha dessa semana.

Depois de Rock & Roll Machine, o Triumph lançou Just a Game, que já trazia a sonoridade que marcaria a banda, com refrões grudentos, riffs clássicos e belíssimas participações individuais de cada um dos membros, fazendo do nome Triumph o principal rival (em vendas e em seguidores) do Rush. O flerte com o progressivo só viria aparecer novamente, de forma muito encolhida, no álbum Thunder Seven (1984), mas sem alcançar a glória do que foi registrado em “City”.

Versão inglesa de Rock & Roll Machine

O grupo acabou depois de muitas brigas, principalmente entre Rik e Gil, deixando um legado de dez discos, milhares de fãs e hinos essenciais para o rock.

3 comentários sobre “Maravilhas do Mundo Prog: Triumph – City [1977]

  1. Não consegui encontrar para ouvir a faixa que é tema da coluna, mas em se tratando de Triumph, baseado no que já conheço a respeito do grupo, sei que posso endossar as palavras do Mairon… a banda é competentíssima, e Rik é um guitarrista fantástico, antecipado em relação à enxurrada de guitar heroes extremamente técnicos que surgiriam nos anos 80.

  2. Agora sim! Que bela canção! Como se já não bastasse o acento espanhol impresso por Rik no violão, seu longo solo melódico mais para o final da faixa é bom demais!

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