Glenn Hughes (Porto Alegre, 28 de abril de 2018)

Glenn Hughes (Porto Alegre, 28 de abril de 2018)

Ver um show de um grande artista é sempre um momento marcante em sua vida. Ver esse mesmo artista pela segunda vez, apresentando somente clássicos exclusivos da banda onde se consagrou, diante um metro de seus olhos, é ainda mais inesquecível. E foi isso que me aconteceu no último dia 28 de abril, no Bar Opinião em Porto Alegre. Depois de dois anos, pude reencontrar novamente o baixista e vocalista inglês Glenn Hughes, e desta feita, com a turnê Glenn Hughes Performs Classics Deep Purple.

Assisti ao homem em 2015, em um belíssimo show no formato trio, onde além de Hughes, destacou-se o loiro guitarrista Doug Aldrich (Ex-Whitesnake, Dio, entre outros), que tocou muio naquela noite. Fechava o trio o batera Pontus Engborg, e ali, Hughes passeou pela sua carreira solo e pelos trabalhos com Trapeze, Deep Purple e Black Country Communion. Encerrei a resenha daquele ano na expectativa de que a promessa de Hughes retornar a Porto Alegre seria cumprida, e que mais discos eu iria assinar.

Me & Mr. Hughes

Isso por que daquela feita, houve um excelente Meet & Greet com The Voice Of Rock, onde ele foi super atencioso, e autografou tudo o que levei. Dessa vez, a EV7 Live, através do produtor Eliel Vieira, fez novamente o Meeting, e óbvio que me fui sem piedade, com mais uma leva de discos para assinar. Além de trovar com Hughes, o meeting prometia a autobiografia recentemente lançada por ele, um pôster, credencial laminada e um tempo de bate-papo com Mr. Glenn, além de fotos.

Mas, nem tudo é perfeito. Se em 2016 apenas 4 aventureiros desembolsaram a grana para trocar uma ideia, pegar uns autógrafos e tirar muitas fotos, em 2018 foram 20 os participantes. Isso acabou diminuindo bastante o contato com Glenn, que não pôde conversar com os fãs como queria. De qualquer forma, nos poucos minutos que estive com ele novamente, ele foi muito atencioso e querido. Uma alma aberta, que te deixa embasbacado com sua gentileza e simpatia. Não autografou tudo que levei (autografou o livro, dois vinis e um CD), mas isso é o de menos. Poder trocar uma rápida fala com ele já valia a noite. Mas ainda tinha a parte sonora. Vale ressaltar que não recebemos o pôster prometido no anúncio do Meeting, mas o produtor Eliel acabou dando em troca um copo promocional da turnê brasileira, o que foi uma atitude no mínimo sensata do rapaz, para o qual deixo meus elogios por sua honestidade.

Glenn Hughes e o Rickenbacker vermelho, em ação

Falando em organização, me desculpa a produtora que trouxe Glenn para o país, mas a agenda ficou no mínimo confusa. Afinal, em 15 dias por terras brasilis, o artista percorreu uma verdadeira maratona, saindo de Brasília (17/05), passando por Belo Horizonte (19/05), São Paulo (21/05), Limeira (22/05), Curitiba (24/05), Manaus (26/05) até chegar em Porto Alegre. Da capital gaúcha, Glenn foi para o Rio, onde se apresentou dia 29/05, e encerrou a turnê em Vila Velha, no dia 01/05. Não seria melhor ter concentrado os shows na região sudeste e encerrado em Manaus, tendo começado justamente pelo sul, já que ele vinha de Buenos Aires? Uma logística bastante confusa, que acabou sendo percebida no palco, já que Hughes por algumas vezes demonstrou cansaço.

De qualquer forma, passado o encontro, era hora de ir para a frente do palco garantir o melhor lugar. Fiquei embaixo do microfone de Glenn, e dali, pude ver de pertinho quando ele subiu ao palco, acompanhado de Søren Andersen (guitarras), Jesper “Jay Boe” Hansen (teclados) e Fer Escobedo (bateria), empunhando o velho Fender dos anos 70, e estourar as caixas de som com uma pancada versão de “Stormbringer” (do álbum homônimo de 1974). O som das caixas Marshall era sensacional, e onde eu estava, de frente para elas, tomava conta do ambiente.

Jay Boe

Em “Might Just Take Your Life” e “Sail Away”, faixas mais calma do aclamado Burn (1974), pude ouvir os teclados e a guitarra, e percebi que o time que acompanhou Hughes tentou chegar o mais próximo das versões ao vivo da Mark III estabelecidas nos clássicos Made in Europe e California Jam. Até as fisionomias e trejeitos eram meio similares. Andersen permaneceu no seu canto, praticamente imóvel, como Blackmore no California Jam. Jay Boe colocava as pernas sobre os teclados lembrando Lord. As costeletas de Escobedo traziam memórias da contra-capa de Made in Europe. Enfim, tudo certinho para termos certeza que o tributo era ao Deep Purple.

Hughes continua com seu vozeirão praticamente intacto, apesar de já não se aventurar com frequência em tons mais altos. Porém, seus falsetes e agudos estão impecáveis. E no baixo, o cara é um monstro. Acredito que atualmente é o melhor baixista vivo de sua geração, e por que não, de todas as gerações. Como é bonito e agradável de ver ele palheteando as cordas sem piedade, fazendo solos como se o instrumento fosse uma guitarra, e sempre com um sorriso no rosto.

Andersen durante seu solo em “You Fool No One”

O show seguiu com Andersen indo para a frente do palco, e depois de um breve e virtuoso solo, puxar o riff de “Mistreated” (Burn). Hughes e sua banda fizeram brotar lágrimas de vários ao meu lado, com uma interpretação raiz, regada de muito feeling e esbanjado emoção. Lindo! Para encerrar a primeira parte do track list, envolvendo as faixas de Burn, Hughes convidou à todos para fazer uma viagem no tempo, e ir ao California Jam de 1974. Então, Jay Boe ficou sozinho no palco, e realmente, levou à todos para os Estados Unidos, já que arrancou os mesmos uivos e barulhos de seu Hammond, aqueles que Lord fez na apresentação daquele evento, durante a clássica “You Fool No One”, e também resgatou a clássica hebraica “Hava Nagila”, que o mesmo Lord emulou na versão de Made in Europe. De chorar (parte 1)!

Ficou a expectativa da entrada do cowbell de Fer, e quando o mesmo surgiu, a todo o pique, trazendo o riffzão de baixo e guitarra explodindo as caixas de som, o coração pulou de alegria. As viradas, a letra vigorosa, a pegada do riff, tudo sensacional, botando o Opinião a baixo. O solo de Andersen começou com a pegada veloz em uma única nota que Blackmore criou para a canção, e depois seguiu com as palhetadas arrastadas nas cordas que encaminharam para o blues delicioso e chapante que o Deep Purple apresentou ao vivo nos anos 70. Lindo, arrepiante e de chorar (parte 2).

O menino Escobedo, detonando na bateria

Segue “You Fool No One”, e quem duvidou que o menino Escobar pudesse fazer um solo de bateria próximo ao que Ian Paice fazia nos shows da turnê de Burn, deve ter segurado o queixo. O guri destruiu. Com uma força nos braços, uma habilidade no bumbo e muita técnica, Fer reproduziu diversos trechos do solo de Paice no Made in Europe, e ainda fez muito mais. Tanto que quando terminou seu solo, foi aplaudido e reverenciado pelo próprio Hughes. De chorar (parte 3).

Encerrada a mais de meia hora de apresentação só com “You Fool No One”, Hughes acalmou os ânimos (mas não às lágrimas) dos presentes. Em uma linda homenagem, disse que a próxima música tinha sido composta em parceria com Jon Lord, para quem ele dedicava a mesma. Antes de começar a cantar, ainda disse: “Acho que vou chorar!”, e então, Jay Boe puxou o riff de “This Time Around”. De arrepiar. Hughes puxou emoção do fundo da alma, e naqueles minutos, até o copo promocional da turnê cedeu-se à uma lágrima.

Hughes, faceiro com a apresentação em Porto Alegre

Tomando o fôlego, era hora de sacudir o esqueleto, e continuando na pegada de Come Taste The Band, veio “Gettin’ Tigher”, agora em homenagem à Tommy Bolin. Nessa, Hughes aproveitou para mostrar ainda mais seus dotes como baixista. O cara é um monstro, e fim de papo! Uma empolgante e surpreendente “Smoke On The Water”, nas linhas do California Jam, conduziu-nos para o final da apresentação, com uma embasbacante versão para “You Keep on Moving”. Cara, essa faixa me colocou de pernas pro ar. Uma das melhores canções do Purple MK IV, se não a melhor, ali, com O cara cantando ela. Muita emoção, e a certeza de que ter ido no show naquela noite tinha sido uma escolha certa.

Após alguns minutos de mais um, Hughes voltou, dessa vez não empunhando o baixo, que ficou a cargo de um roadie, mas sim apenas segurando o microfone para surpreender novamente, cantando “Highway Star”. Essa eu não esperava no repertório, confesso, e honestamente, teria tirado ela para colocar uma “You Can’t Do It Right (With The Only You Love)”, “Holy Man” ou até a versão completa de “This Time Around” com “Owed To G”. Mas paciência, o artista tem o direito a escolher o que vai tocar, e como o encerramento foi com chave de ouro, não tenho do que reclamar.

Essa chave de ouro contou com a presença do Lindo Rickenbacker vermelho que Hughes usou na turnê de Burn. Cara, vá se catar. O som daquele velhote é apavorante. Diante das caixas de som do baixo, quando Hughes apenas ligou ele já dava para sentir que a casa ia estremecer. Foi só ele puxar o riff de “Burn” e pronto, não havia como ficar isolado da potência sonora que exalava do palco. Meus olhos tremiam no ritmo do baixo de Hughes, e aquela pesada versão de “Burn” só atestou que é muito raro achar, hoje em dia, um grupo tão forte individualmente e coletivamente como foram as MKs III e IV, assim como a maioria das bandas dos anos 60 e 70.

Fim de espetáculo

O show encerrou com a promessa de mais um retorno, declarações de amor e aquele sentimento de “bebedeira” após pouco mais de duas horas de apresentação, a qual irá ser lembrada pelos presentes não só por sua importância histórica, mas também por terem visto ao vivo e a cores como se faz rock ‘n’ roll de verdade.

Track list

1. Stormbringer

2. Might Just Take Your Life

3. Sail Away

4. Mistreated

5. You Fool No One

6. This Time Around

7. Gettin’ Tigher

8. Smoke On The Water

9. You Keep On Moving

Bis

10. Highway Star

11. Burn

7 comentários sobre “Glenn Hughes (Porto Alegre, 28 de abril de 2018)

  1. Tava lá também, QUE BAITA SHOW. O velho ainda canta demais, e fiquei com zumbido no ouvido esquerdo uns 2 dias, fiquei meio de frente pra amplificação do lado esquerdo.

    Só achei que ele tocou pouco do Stormbringer. A faixa título é pouco pra aquele BAITA disco. Se não me engano, ele vinha tocando Holy Man, mas em alguns shows ele deu uma encurtada e não tocou ela (e em outros, também não tocou This Time Around e Highway Star). Isso eu acho que dá sim pra colocar na conta da organização maluca. Talvez, se tivesse um pouco menos cansado ele conseguisse caprichar mais ainda no set.

    Ahh, e sei que essa é uma daquelas músicas mais Coverdale, mas senti muita falta de The Gypsy. É uma das melhores músicas da MK III e do Purple como um todo.

    1. Arthur, curiosamente tb senti falta de “Holy Man” e “The Gypsy”. Mais músicas do Stormbringer com certeza seriam bem vindas. A que eu gostaria mesmo de ouvir, que ao vivo ficaria uma paulada, seria o embalo de “You Can’t Do It Right”. Mas só “Holy Man” já teria dado um belo ganho para esse showzaço

  2. Optei com total consciência de minha atitude por não ir nesse show. Não duvido nem um pouco que tenha sido uma ótima apresentação, pelo contrário. Já vi Hughes duas vezes e sei de sua capacidade ao vivo, tanto no vocal e no baixo quanto como ótimo frontman. Adoraria ver mais um show de Hughes, mas um verdadeiro show solo, com liberdade para passear mais por sua longa e prolífica carreira, não como um cover de luxo do Deep Purple, para uma plateia cuja grande parte talvez tenha parado no tempo e prefira viver de exaltar glórias passadas sem olhar para o presente (ou mesmo para um passado menos óbvio e popular). Hughes tem uma carreira muito ampla para fazer uma turnê focando nos três discos que gravou com o Deep Purple (tocar material gravado com Gillan e Glover é totalmente desnecessário). Sua carreira solo sozinha sustenta uma apresentação fenomenal, isso sem falar de Trapeze, Black Country Communion e suas múltiplas colaborações, como aquelas com Tony Iommi (sonho!) e Pat Thrall. Reitero: deve ter sido mesmo uma apresentação magnífica, mas é o tipo de coisa que eu prefiro não incentivar.

    1. Muita gente comentando, lá no show, do sonho de ver uma turnê do Hughes com o Iommi. Como o Seventh Star, e principalmente, os discos da dupla Iommi/Hughes cresceram de conceito ultimamente.

      1. Infelizmente, creio que uma turnê assim não seja mais possível em razão da saúde debilitada de Iommi. É compreensível. Dos três discos da dupla, o que mais gostaria de ver suas faixas sendo executadas ao vivo é “Fused”, um dos meus álbuns preferidos dos últimos 30 anos.

  3. É algo inenarrável. Lamento-me por não poder ir muito a esses shows por conta de estar longe do eixo das grandes capitais. Só São Paulo ou Curitiba, grandes centros de grandes shows, ficam a quase 600 kM onde eu moro.

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