Resenha de Show: U2 (São Paulo, 22 de outubro de 2017)

Resenha de Show: U2 (São Paulo, 22 de outubro de 2017)

Por Mairon Machado

O U2 é definitivamente uma das maiores bandas da história, independente se você goste ou não. Afinal, os caras estão na estrada há mais de 40 anos, já ultrapassaram a marca de 100 milhões de discos vendidos (atualmente são quase 180 milhões de discos vendidos), e ainda são capazes de lotar estádios pelo mundo inteiro, como vem acontecendo na atual turnê de comemoração aos trinta anos de seu principal álbum, The Joshua Tree, através de The Joshua Tree Tour 2017. Dentre os shows dessa tour, quatro foram agendados para o Brasil, exclusivamente na cidade de São Paulo, estádio Morumbi. As datas foram 19, 21, 22 e 25 de outubro, e tive a felicidade de comprar e assistir ao terceiro show dos quatro, depois de algumas madrugadas tentando comprar ingresso para os dois primeiros shows.

Para os que não viveram os anos 80, ou desconhecem a carreira do U2, The Joshua Tree foi o quinto álbum dos irlandeses, e o mais bem sucedido até hoje, tendo ultrapassado a marca de 25 milhões em vendas no mundo inteiro. Bono (vocais), The Edge (guitarra, teclados, voz), Adam Clayton (baixo) e Larry Mullen Jr. (bateria) deixaram nesse álbum um legado de clássicos eternos para o mundo da música, que os elevou ao patamar que hoje conhecemos, e nada mais justo do que fazer uma turnê de comemoração ao seu lançamento, interpretando-o na íntegra. Como convidado especial, o guitarrista Noel Gallagher, e sua High Flying Birds foram chamados para abrir as apresentações em São Paulo.

Apresentação de Noel Gallagher

Cabaço de uma apresentação ao vivo do U2, sedento por ver os mesmos em um palco, larguei-me para São Paulo com a expectativa de ver um show memorável, e assim o foi. O ambiente, apesar de uma temeridade por chuva forte e tormentas, foi perfeito. Mais de 75 mil pessoas tornaram o Morumbi um templo de “orações” para que Bono e cia. desfilassem em alto estilo, eternizando para os presentes talvez o melhor show da banda nessa turnê, segundo o que conversei com diversas pessoas que haviam ido nas duas apresentações anteriores.

Antes, teve a apresentação de Noel Gallagher. O ex-Oasis fez uma apresentação burocrática, um tanto quanto fria, mas que teve seus momentos. Logo na terceira canção, “In the Heat of the Moment”, a plateia surpreendeu a Noel, ligando os celulares e fazendo um bonito espetáculo de luzes. Os grandes momentos da apresentação de uma hora, obviamente, ficaram nos clássicos do Oasis. Abaixo de uma forte neblina, “Wonderwall”, “Don’t Look Back in Anger” e “Champagne Supernova” foram cantadas aos brados pelos presentes, assim como as canções da carreira solo de Noel foram bem recebidas pelo público. Foi um pouco constrangedor ver um dos grandes nomes do rock nos anos 90 abrindo para o U2. Noel parecia um pouco “insatisfeito” com a sua posição, mas é algo que o tempo deve corrigir. Afinal, o que representa o Oasis para uma geração inteira de roqueiros é muito relevante, ainda nos dias de hoje.

Adam Clayton

Depois de um intervalo breve para retirada dos instrumentos e material da banda de Noel, eis que surge Larry Mullen Jr., caminhando sobre o palco e indo em direção a plateia. O palco da turnê desta turnê possui um formato de árvore, lembrando a famosa árvore que surge na capa do disco de 1987. Os “galhos” da árvore estão no meio da plateia, enquanto o “tronco” conduz a banda para a “raiz”, que é o gigantesco palco central. Esses são os primeiros detalhes de algo fantástico criado pelos produtores do show, já que no palco central, estão apenas a bateria e alguns retornos, nada mais. Todo o aparato sonoro que leva o som para a plateia, assim como as luzes, estão localizadas acima do telão, flutuando através de gigantescos guindastes, e com uma potência arrebatadora. Já o telão, igualmente grande, dadas as proporções, é um espelho do palco, com a árvore na vertical, “subindo” aos céus, enquanto em direção a plateia, temos o que seria a “sombra” da árvore. Muito bem bolado, e que faz parte de todo o conceito da turnê.

A garoa sumiu do nada. Larry então posiciona-se na sua bateria, colocada em um dos galhos da árvore, pertinho do público, e em alguns segundos solta as batidas iniciais de “Sunday Bloody Sunday”. São raras as canções que possuem um “riff” de bateria, e essa é uma delas. The Edge surge no palco central, caminhando e tocando o riff em D da canção, e Bono vem cantando a mesma, seguido por Adam. Eles passam há poucos metros de mim, que estou na grade do “caule”, e ali percebo que estou vivendo um dia inesquecível. Morumbi inteiro cantando o refrão desse clássico, lágrimas (e celulares) para todo lado, e sem perda de tempo, The Edge assume os teclados para puxar o riff de “New Year’s Day”, mais uma paulada cantada em uníssono. Todos vibravam em êxtase com o que estava acontecendo ali, no pequeno palco central, mas era apenas o começo de uma grande noite.

Algumas imagens do gigantesco telão durante a interpretação de The Joshua Tree

Bono começou sua série de discursos, levando o público, e entre sua fala, The Edge dedilhava o lindo riff de uma das mais lindas canções de todos os tempos, “Bad”. Cara, que coisa emocionante. As luzes que existiram no show de Noel praticamente dobraram. O estádio inteiro estava iluminado pelos celulares. Os aviões que saíam de Congonhas e passavam por cima do Morumbi naquele instante devem ter visto cenas incríveis. E puta que pariu, que força tem essa música, barbaridade. Eu e mais uma galera ao meu lado desabou em lágrimas. Meus amigos que fizeram a indiada de ir cedo para a fila (valeu Claiton e Gustavo), aguentar mais de 12 horas sem ir ao banheiro para grudar na grade e curtir aquele momento, estavam deslumbrados tanto quanto eu. Embasbacante, não há palavras para descrever o que foi “Bad”.

Mas, quando as pessoas achavam que já haviam atingido o ápice de sua emoção e alegria, veio “Pride (In the Name of Love)”, que aí sim, colocou a casa abaixo. Essas quatro primeiras canções, retiradas dos discos War (1983, as duas primeiras) e The Unforgettable Fire (1984, as duas últimas), foram as que lançaram o U2 ao mundo, nos seus terceiro e quarto álbuns, respectivamente. Ainda hoje são presenças constantes em todos os shows da banda. Colocá-las logo na abertura foi uma ótima ideia, pois ganham a plateia de início e ainda, tocar no pequeno palco, representa um pouco da banda em suas origens humildes, antes de ganhar o planeta com o álbum que dá nome a turnê.

The Edge (acima); Larry, The Edge e Bono (abaixo)

Encerrada a primeira parte do show, o quarteto dirige-se para o palco principal, e lá, passa a apresentar na íntegra The Joshua Tree. Certamente um dos grandes Lados A de todos os tempos, é redundante falar que o clímax permaneceu no ar por ainda mais tempo. A sequência de abertura do disco, com “Where The Streets Have No Name“,  “I Still Haven’t Found What I’m Looking For” e “With Or Without You”, arrebentou com as cordas vocais de muita gente. Que espetáculo sonoro, e que espetáculo visual. Toda a “árvore” vertical era um telão, com imagens perfeitas. Era o U2 tornando-se grande ao mundo, e nada mais justo do que um telão enorme para mostrar isso.

Quem acompanha a banda há algum tempo certamente ficou surpreso, empolgado e com cara de “Meu Deus, é sério que to vendo isso?” quando em “Bullet the Blue Sky” Bono empunhou a câmera de vídeo e ficou filmando The Edge, relembrando o efeito feito pela dupla no consagrado vídeo de Rattle and Hum (1988). A sequência de The Joshua Tree deu uma esfriada na plateia, até por que essas oito primeira canções são para tirar o fôlego mesmo, mas houveram grandes momentos. Em especial, quero destacar “Trip Through Your Wires”, “Exit” e “Mothers Of The Disappeared”. A primeira conta com um breve solo de harmônica por Bono. Porém, em um determinado momento da canção, Bono dirigiu-se a um fã, atirou a harmônica e o microfone para o mesmo e pediu para ele solar. Obviamente, o solo não foi um dos melhores, mas com certeza, a alegria da pessoa que recebeu o instrumento foi impagável.

Bono, ajoelhado a menos de 2m de mim (fotos do meu amigo Claiton Correa)

Já as duas últimas são responsáveis por encerrar The Joshua Tree, e são tão sublimes quanto as canções que inauguram o mesmo. “Exit” teve as imagens do telão em preto e branco, novamente uma citação ao vídeo de Rattle and Hum, lançado nesse formato. Já durante a passagem de uma para outra, Bono veio caminhando dos “galhos”, e acabou parando exatamente onde eu estava. De olhos fechados, deu alguns passos para trás e se ajoelhou, há pouco mais de dois metros de mim. Cara, o homem estava ali, com toda sua respeitada carreira, mostrando suas rugas ao público, ali, pertinho, ajoelhado, messiânico cantando “Mothers Of The Disappeared”. QUE MOMENTO!! QUE MOMENTO!! Não tinha dor nas pernas, não tinha fome, não tinha sede, cara, foi O MOMENTO, que feliz consegui registrar aqui!

Bono interagindo com fã durante “Trip Through Your Wires” (acima); Larry Mullen Jr. (abaixo)

Recuperar o fôlego depois de pouco mais de uma hora de apresentação arrebatadora era tarefa hercúlea, e portanto, a banda deixou o palco por alguns minutos para podermos juntar os cacos e nos preparar para a terceira parte do show, a qual já começou lá em cima, com um clássico da nova fase do grupo, “Beautiful Day”, reativando a chama do espetáculo. Vieram “Elevation” e “Vertigo“, clássicos incontestáveis dos anos 2000, e o Morumbi novamente estava cantando aos brados.

Para surpresa dos presentes, o grupo incluiu “Mysterious Ways“, a sensualíssima faixa de Achtung Baby na qual uma garota é chamada ao palco para dançar. Não foi diferente dessa vez, mas curiosamente, Bono chamou ao palco uma pessoa que já havia dançado com ele em Paris nessa mesma canção, Juliana Sarda. Foi um momento hilário, bem honestamente.

The Edge (acima); Encerramento da apresentação de The Joshua Tree na íntegra (abaixo)

Juliana estava lá dançando, nos “galhos da árvore”, vivendo seu momento de fama, e Bono cedeu a câmera que estava filmando ela dançar. O vocalista indicou que ela fosse ao palco central filmar o que estava lá, e lá foi a Juliana. Ao chegar no palco central, Bono dirigiu-se para ela, ao microfone, dizendo: “Beautiful Lady, this is The Edge”. Era o momento do solo de The Edge na canção, e certamente, Bono queria que Juliana filmasse o solo. Porém, a garota estava tão excitada com o acontecido que filmou qualquer coisa, menos o guitarrista. Foi hilário! Bono deu um tapa na cabeça, dizendo “Noooooooooo!!” enquanto Juliana voltava toda faceira para lhe entregar a câmera. Não adiantou Bono insistir, Juliana não estava no mundo dele, mas também, e compreensível a alegria da pernambucana.

Ainda houve tempo para apresentar uma nova canção, “You’re The Best Thing About Me”, que estará presente no próximo disco da banda, Songs of Experience, a sensacional “Ultra Violet (Light My Way)” e, fechando o espetáculo, “One”, a qual mais uma vez banhou de lágrimas esse que vos escreve, por que puta que pariu, é outra canção fortíssima e tocante, assim como “Bad”. Arrepios passam em meu corpo só de lembrar a frase “carry each other …

Bono no palco central durante “One” (acima); Bono de pertinho (abaixo)

Terminado o espetáculo de duas horas e quinze minutos, saímos do Morumbi com o sorriso lá na testa. Foi complicado conseguir um táxi ou Uber para retornar ao hotel, principalmente por que as ruas de saída do estádio são muito estreitas. Nesse sentido, acredito que faltou um pouco de organização da produtora do evento, por que mesmo tendo ônibus especiais, a quantidade de veículos para a quantidade de pessoas foi muito baixa. Mas esse é o único defeito que posso dizer de uma noite memorável, e que espero poder repetir outras vezes. O U2 ganhou mais um admirador de suas apresentações, e pretendo certamente, voltar a vê-los em suas próximas passagens por aqui, pois é inesquecível o que esses irlandeses fazem com o coração e o cérebro de quem vivencia seus shows.

Despedida, com a bandeira brasileira ao fundo

Set list

  1. Sunday Bloody Sunday
  2. New Year’s Day
  3. Bad
  4. Pride (In The Name Of Love)
  5. Where The Streets Have No Name
  6. I Still Haven’t Found What I’m Looking For
  7. With Or Without You
  8. Bullet The Blue Sky
  9. Running To Stand Still
  10. Red Hill Mining Town
  11. In God’s Country
  12. Trip Through Your Wires
  13. One Tree Hill
  14. Exit
  15. Mothers Of The Disappeared
  16. Beautiful Day
  17. Elevation
  18. Vertigo
  19. Mysterious Ways
  20. You’re The Best Thing About Me
  21. Ultra Violet (Light My Way)
  22. One

5 comentários sobre “Resenha de Show: U2 (São Paulo, 22 de outubro de 2017)

  1. Se havia uma turnê do U2 a ser assistida, para o meu gosto, era esta! Joshua Tree é o meu disco favorito do grupo (ao lado de “Rattle And Hum”, que se originou da turnê do primeiro), e, como não sou lá muito fã do período de “Achtung Baby” para frente, um show “normal” recheado com músicas da fase mais “nova” certamente não seria tão atraente para mim. Mas uma apresentação com a íntegra do LP que mais gosto, e ainda quatro clássicaços no início, era imperdível!

    Fui na apresentação de sábado, que, infelizmente, não teve nem “Misterious Way” nem aquela gata gostosíssima dançando entre nós, mas também não teve nem chuva nem neblina! Achei uma apresentação fantástica, duas horas que pareceram durar 20 minutos, mas para um público que, infelizmente, não parecia conhecer muito do disco (pelo menos aqueles próximos a mim), e que só vibraram mesmo no começo do show (até “With or Without You”), nas três músicas do primeiro bis, e, claro, no super emocionante encerramento com “One”. Mas, se o pessoal estava lá pelas músicas das fases mais “Pop” e dançantes do grupo, e se decepcionou ao não ouvi-las, isso não é problema do grupo, muito menos meu, que trocaria sem pensar a música nova e “Ultraviolet” por alguma mais “moderna” (ou mesmo por “Misterious Way”), mas não retiraria nenhuma das outras que foram tocadas!

    Excelente show, e espero que voltem logo ao Brasil, e que toquem em outras capitais, facilitando quem é fã do grupo mas não mora em SP a ter a chance de vivenciar esta maravilhosa experiência musical e visual!

  2. Pelo que vi no instagram do Noel foi em “Holy Mountain” que o povo ligou os celulares não?

    Abraço!

    1. Pode ter sido meu caro Felipe. Não sou um conhecedor fiel da obra de Noel, então, posso ter me confundido.

  3. Nunca fui fã do “Iutú”(como fala o Faustão). E o Bono Vox sempre foi um maleta sem alça. Até o Men At Work é melhor. rsrsrs

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