Drain – Horror Wrestling [1996]

Drain – Horror Wrestling [1996]
Por Micael Machado
No começo da década de 1990, o mundo da música foi invadido pelo grunge, estilo associado de forma até irresponsável a praticamente qualquer banda que surgisse no estado americano de Washington por aqueles dias, especialmente na capital Seattle a seus arredores. Grupos como Nirvana, Pearl Jam, Alice In Chains e Soundgarden foram alçados ao status de celebridades, e algumas características musicais (tais como andamentos mais lentos, climas melancólicos e riffs pesados, muitos baseados no trabalho do Black Sabbath no começo dos anos 1970) passaram a fazer parte do menu de muitas formações iniciantes. Uma destas seria o Drain, surgido em Estocolmo, na Suécia, no ano de 1993.
O grupo na verdade teve origem na união da guitarrista Flavia Canel e da baterista Martina Axén, que já tocavam juntas desde o começo da década de 1980 em bandas como o Livin’ Sacrifice, uma das primeiras formações exclusivamente femininas do país. As duas ainda passariam pelo Aphrodite, onde juntariam forças com a baixista Anna K, mas, após a partida de sua vocalista à época, se viram livres para formar um novo time, montando primeiro o Ragdoll, e, depois, recrutando a guitarrista Maria Sjöholm (que assumiria os vocais da nova empreitada) e formando assim o Drain, que embarcou de cabeça na onda Grunge, assinando um contrato com a gravadora MVG Records em 1994 e lançando o EP Serve the Shame no ano seguinte. A boa repercussão da bolacha levou as meninas à gravação de seu primeiro full lenght, que veria a luz do dia em seu país natal em 1996, e faria o quarteto adotar a alcunha de Drain STH para os lançamentos nos Estados Unidos, devido a questões legais com o nome original (em algo parecido com o que ocorreu com os também suecos do Ghost).
Totalmente baseado no estilo originário de Seattle, Horror Wrestling começa com a pesada “I Don’t Mind”, que, sem chegar a ser rápida, é até moderna para a época, com riffs repetitivos (e quase ao estilo “pula-pula” que alguns grupos adotariam anos depois), efeitos nos vocais e um excelente refrão. “Crack the Liar’s Smile”, de começo acústico (chegando a lembrar as composições do Days of the New), possui um belo desempenho vocal de Maria, com um bom refrão (embora não tão marcante quanto outras canções do álbum) e um ritmo que parece adequado para tocar nas “rádios rock” da vida, o que a fez realmente a escolha ideal para primeiro single (o qual ainda possuía uma faixa exclusiva chamada “Without Eyes”), embora eu não a considere dentre as melhores faixas do track list.
As meninas do Drain: Flavia Canel, Anna K, Maria Sjöholm e Martina Axén
Estas, para mim, são aquelas que mais trazem à memória o estilo do Alice In Chains, um dos pilares do movimento grunge, e que, ao que parece, foi forte fonte de influências para as suecas. Destas, o maior destaque vai para “Mind Over Body”, faixa lenta, com uso constante de vocais dobrados, e que parece ter sido composta pelo próprio Jerry Cantrell (guitarrista do AIC). Arrastada e pesada, “Smile” também remete ao grupo de Seattle, assim como “Mirror’s Eyes” (não tão lenta quanto outras composições), “Stench” (outra que chama a atenção, e que tem um pouquinho de velocidade em seu refrão, embora não chegue a ser rápida) e “Unreal”, esta de começo sombrio e melodia arrastada.
“Unforgiving Hours”, outra que utiliza o recurso do começo acústico, tem um jeitão de balada que é “atrapalhado” pelo clima depressivo da faixa. Já “Crucified” inicia com um riff técnico e quebrado, caindo depois em um peso e lentidão dignos de uma banda de doom metal (apesar de ganhar um pouquinho de velocidade no refrão, com a volta do riff inicial), além dos vocais utilizarem muitos efeitos, em algo que se diferencia do restante do track list, enquanto oriff inicial de “Serve the Shame” me lembra a faixa “Spoonman” do Soundgarden, sendo que depois a música muda para algo mais sombrio, adjetivo que serve muito bem para caracterizar boa parte do álbum, mostrando que as meninas, apesar de lindas e de excelentes instrumentistas, estavam longe de serem “faceiras”.
O disco teve diversas versões diferentes, sendo que a edição europeia do mesmo ano lhe acresceu duas faixas bônus, a pesada “Someone”, que apresenta um estilo de vocais um pouco diferente das anteriores, e outro refrão que remete ao Alice In Chains (especialmente pelos timbres da guitarra e pela maneira como os backing vocals foram utilizados), e “Klotera”, de riffrepetitivo e marcante, além de mais uma vez possuir o uso de vocais dobrados e velocidade moderada, características que novamente trazem o grupo de Cantrell à memória. Em 1998, foi lançada uma reedição que, além da capa diferente (em tons laranjas), de uma mudança na ordem das faixas, e de renomear erroneamente “Mirror’s Eyes” para “Mirror’s Smile”, ainda trouxe uma versão acústica de “Serve the Shame” (que ficou bastante diferente da original, sendo que me arrisco a dizer que até melhor), a inédita “(So I Will Burn) Alone” (mais agitada que as outras, embora ainda sombria) e um quase irreconhecível cover para “Ace of Spades”, do Motörhead, bem mais lenta que a original, e que, não fosse pela letra, poderia facilmente se passar por uma composição inédita das garotas.
Capa da reedição de 1998
Apesar do estilo não mudar tanto, a sonoridade entre as músicas é bastante diferente, com bastante variações de timbres de guitarra, estilos de vocais e andamentos. Mas, como a versão de 1998 tem quase sessenta e sete minutos, a audiência pode se tornar arrastada mais para o final, o que não me impede de indicar enfaticamente o disco aos fãs do grunge, especialmente os que apreciam os trabalhos do Alice In Chains. Quanto ao Drain, assim como o estilo de Seattle, o quarteto não resistiu ao peso dos holofotes, e, apesar de turnês ao lado de nomes como Type O Negative, Machine Head e Megadeth, e da boa repercussão de seu segundo registro (Freaks of Nature, de 1999, que chegou a ter uma faixa co-escrita por Tony Iommi, lendário riff master do Black Sabbath, com quem as meninas também excursionaram), acabaram por se separar em 2000, com Flavia, Martina e Anna seguindo em frente em diferentes projetos (na maioria das vezes separadamente), porém sem emplacar nenhuma nova tentativa no mundo musical. Já Maria Sjöholm tirou o que muitos acreditariam ser a “sorte grande”, pois se casou com o já citado Tony Iommi em 2005, sendo que ambos já dividiam o mesmo teto desde 1999, e merecendo dele linhas muito elogiosas e apaixonadas nas páginas da biografia do guitarrista, intitulada “Iron Man: My Journey through Heaven and Hell with Black Sabbath”. O casal vive (aparentemente) contente e feliz até hoje, e, sem haver possibilidades claras de reunião do quarteto para um novo capítulo, a música do Drain permanece viva apenas na lembrança dos fãs do conjunto. Dê uma chance às meninas, pois quem sabe você também não se torna um deles?
“I don’t mind I don’t care, I can’t feel my soul down here…”
Track List (versão original):
1. I Don’t Mind
2. Smile
3. Serve the Shame
4. Mirror’s Eyes
5. Crucified
6. Stench
7. Crack the Liar’s Smile
8. Mind Over Body
9. Unforgiving Hours
10. Unreal

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