
Por Micael Machado
Um dos principais álbuns do hardcore norte-americano (e, para mim, o melhor), Fresh Fruit For Rotting Vegetables, registro de estreia dos Dead Kennedys lançado em 1980, é, sem sombras de dúvidas, um clássico do punk rock mundial. Mas, como já se provou muitas vezes no mundo das artes, clássicos nem sempre nascem prontos, precisando de muito refino e trabalho para chegarem a este elevado patamar. Uma evidência de que isto também ocorreu com este disco está em Iguana Studios Rehearsal Tape – San Francisco 1978, lançamento especial em vinil do Record Store Day de 2018 (no ano seguinte, também disponibilizado em CD, devido à demanda do público) que finalmente disponibiliza oficialmente parte de uma sessão de ensaios da banda feita, como indicado no título, nos estúdios Iguana, de San Francisco (cidade natal do grupo) no ano de 1978, antes ainda do lançamento de seu primeiro single, a também clássica “California Über Alles”, e quando os Kennedys ainda eram um quinteto, com a formação do primeiro disco (Jello Biafra nos vocais, East Bay Ray nas guitarras, Klaus Flouride no baixo e backing vocals e Ted na bateria) complementada pelo guitarrista base 6025, que deixaria a turma logo depois destas gravações (as quais, segundo o excelente livro Fresh Fruit For Rotting Vegetables – Os Primeiros Anos, de Alex Ogg, foram registradas em fita cassete por East Bay Ray no último ensaio de 6025 com a banda, “porque queríamos ter tudo o que sabíamos gravado para a posteridade”, segundo Jello Biafra – o mesmo texto ainda afirma que a sessão teria ocorrido em 1979, e não em 1978, como se acredita). Clandestinamente, estas gravações circulavam entre os fãs do grupo já há algum tempo, mas foram “oficializadas” pela primeira vez para este lançamento especial, e, pelo que se pode ouvir, sem muitos tratamentos digitais ou aperfeiçoamentos técnicos para “mascarar” as limitações tecnológicas da época (o som é, no geral, abafado e por vezes bem embolado, como seria de esperar de uma gravação amadora de um ensaio de uma banda também praticamente amadora, e o som, por vezes, chega a “enrolar”, como se houvesse uma falha na reprodução da fita K7, num “efeito de som” bastante comum àqueles criados ouvindo este tipo de mídia nos anos de 1980).
Das quatorze faixas de Fresh Fruit For Rotting Vegetables, seis aparecem em versões embrionárias aqui. A mais “surpreendente” delas é “Holiday In Cambodia”, onde Jello canta num tom muito mais grave que no disco de estreia, e em um volume muito baixo, como se ainda não tivesse a letra finalizada ou decorada, e estivesse ainda “experimentando” com a mesma e sua melodia (a não ser no refrão, onde sua voz soa alta e potente). A citada “California Über Alles” também traz vocais mais graves do cantor, e sua parte final não é tão acelerada quanto as versões posteriores. Outra que tem sua velocidade bastante reduzida é “Kill The Poor”, que também possui um solo de guitarra bem mais simples que o de sua versão posterior. Em “I Kill Children”, alguns trechos da letra foram alterados, e falta a controversa frase inicial “God told me to skin you alive” (“Deus me disse para esfolá-lo vivo”, em tradução livre), assim como alguns trechos de guitarra foram suprimidos (enquanto outros foram acrescidos) em “Forward To Death”, mas as duas soam bem próximas de suas “versões finais” no disco de estreia, assim como “Your Emotions”, que, das seis, é a que mais se aproxima de sua versão mais conhecida e apreciada pelos fãs.

Imagem presente na capa interna da versão em CD de Iguana Studios Rehearsal Tape – San Francisco 1978

Contracapa da Versão em vinil de Iguana Studios Rehearsal Tape – San Francisco 1978
Lado A:
1. Man With The Dogs
2. Kepone Kids
3. Forward To Death
4. Kill The Poor
5. Your Emotions
6. Dreadlocks Of The Suburbs
7. I Kill Children
Lado B:
1. Cold Fish
2. Holiday In Cambodia
3. Kidnap
4. Mutations Of Today
5. Rawhide
6. California Über Alles
“Fresh Fruits…” era um daqueles discos que a gente só “ouvia falar” até que foi lançado no Brasil na metade dos anos 80 – primeira vez que eu tinha visto um LP branco na vida! Não sou fã de punk e hardcore, mas esse disco é audição obrigatória para todo mundo que conhece um pouco de rock. Muito legal a reportagem!
Valeu, Marcello! O mítico vinil branco nacional também foi o primeiro vinil colorido que eu vi, e fiquei em choque, pois só conhecia vinis pretos… quem diria que, 40 anos depois, eu iria ter vinis de diversas cores, splatters, marble sei lá o que, com cores misturadas no mesmo disco…