Cinco Discos Para Conhecer: O Movimento Punk No Brasil

Cinco Discos Para Conhecer: O Movimento Punk No Brasil

Por Gabriel Ferreira (Publicado originalmente no site Van do Halen)

O movimento punk demorou a acontecer no Brasil, vindo a explodir apenas no começo da década de 80. Foi quando os primeiros nomes de nossa safra apareceram e promoveram uma pequena revolução cultural concentrada na capital São Paulo e em seus arredores. Mas, apesar da grande efervescência, o mesmo não durou muito e acabou sendo sufocado pela grande confusão que os shows passaram a ser, muitas vezes contando com invasões da polícia e tumultos causados pelo próprio público. Felizmente, isso não impediu que parte das bandas integrantes prosseguisse carreira e ganhasse projeção até mesmo internacional. Apresentarei aqui cinco discos essenciais desse curto período da música brasileira.

Obs.: a lista não inclui coletâneas por causa do número limitado de discos.


a4099387730_10Olho Seco – Botas, Fuzis, Capacetes [1983]

A fundação do Olho Seco aconteceu ainda em 1980, a princípio como uma reunião de amigos querendo fazer barulho. O vocalista desse descompromissado projeto era Fábio, proprietário da lendária Punk Rock Discos, acompanhado por Val e Redson, membros do Cólera. Ninguém poderia imaginar que essa simples reunião se transformaria em uma das primeiras bandas de hardcore do Brasil. Botas, Fuzis, Capacetes é o primeiro registro dos caras, um EP de sete polegadas lançado pelo selo de Fábio (propriamente batizado de Punk Rock Discos) que ao longo de apenas oito minutos apresenta todas as características de um bom hardcore, ainda que um pouco desajeitado: vocal berrado, guitarras distorcidas, bateria frenética e letras críticas e agressivas. Destaques ficam com a ácida “Nada”, a faixa-título e a caótica “Muito Obrigado”.

Fábio (vocais), Val (baixo), Redson (guitarra), Sartana (bateria)

1. Nada
2. Botas, Fuzis, Capacetes
3. Isto É Olho Seco
4. Muito Obrigado
5. Castidade


Ratos_De_Porao-Crucificados_Pelo_Sistema-FrontalRatos de Porão – Crucificados Pelo Sistema [1984]

Em atividade até hoje, o Ratos de Porão sempre se diferenciou do restante dos grupos paulistas por praticar o chamado hardcore (mesmo sem os mesmos saberem disso no início), na linha do Discharge e de bandas finlandesas como Anti-Cimex e Riistetyt. E desde sua estreia individual isso ficou muito claro. Eles já haviam participado da essencial coletânea SUB em 1983, ainda com Jão nos vocais, mas foi com a entrada de João Gordo que se efetivaram como um dos grupos mais agressivos da safra, destilando sua raiva de forma curta e grossa. Crucificados Pelo Sistema é exatamente isso, e ao decorrer de suas dezesseis faixas mostra uma banda em evolução, mas já compondo clássicos para vida inteira como “Morrer”, “Caos”, “Agressão/Repressão” e “Não Me Importo”. Só não ganha nota 10 pela produção precaríssima!

João Gordo (vocais), Mingau (guitarras), Jabá (baixo), Jão (bateria)

1. Morrer
2. Caos
3. Guerra Desumana
4. Agressão/Repressão
5. Obrigado a Obedecer
6. Asas da Vingança
7. Que Vergonha (Olho Seco cover)
8. Poluição Atômica
9. Pobreza
10. FMI
11. Só Pensa Em Matar
12. Sistema de Protesto
13. Não Me Importo
14. Periferia
15. Crucificados Pelo Sistema
16. Corrupção


inocentes_panico_em_spInocentes – Pânico em SP [1986]

O Inocentes foi possivelmente a banda desse cenário paulista que mais fez sucesso. Fundada por ex-membros do Condutores de Cadáver e do Restos de Nada, em 1986 eles já possuíam contrato com a Warner. Pânico em SP foi o primeiro lançamento pela nova gravadora e surpreende pela boa produção (incomum para uma banda punk) e pelo instrumental bem trabalhado. Clemente, já conhecido por ter feito parte do Restos de Nada como baixista, assume aqui as guitarras e os microfones, além de ser autor das seis faixas, todas falando sobre problemas sociais e pessoais (como é o caso da abertura “Rotina”). É impossível dar algum destaque, visto que todo o conteúdo do EP é muito bom, mas não posso deixar de citar “(Salvem) El Salvador” e “Expresso Oriente”, ambas com letras excepcionais, e a clássica faixa-título. Eles mais tarde seriam integrados à cena do rock nacional junto a nomes como Ultraje a Rigor e Titãs. Continuam na estrada e completaram 30 anos de existência em 2002, se firmando como um dos mais antigos grupos do extinto movimento punk.

Clemente (vocais, guitarras), Ronaldo (baixo em 3, 5 e 6), André (baixo em 1, 2 e 4), Tonhão (bateria)

1. Rotina
2. Ele Disse Não
3. Não Acordem a Cidade
4. (Salvem) El Salvador
5. Expresso Oriente
6. Pânico em SP


ColeraCólera – Pela Paz Em Todo Mundo [1986]

Uma das bandas mais importantes que o Brasil já teve, o Cólera era conhecido pela postura totalmente independente e engajada, seja em questão políticas, sociais ou ambientais. Com uma notável influência do The Clash, o grupo fundado pelos dois irmãos Redson e Pierre compensava o instrumental por vezes mal trabalhado com letras excelentes abordando a realidade de quem vivia em São Paulo naqueles tempos. Pela Paz Em Todo Mundo, o segundo registro do trio, foi lançado em 1986 e permanece até hoje como um dos trabalhos essenciais não só do punk brasileiro, como também do mundial. Todas as quatorze músicas trazem consigo a já citada influência do Clash, contando com as famosas letras “sing along”, e apresentam um punk rock básico, ainda que com alguns elementos do hardcore. Clássico gigantesco! Infelizmente, a morte do principal líder criativo, Redson, ocorreu em 2011. Fica a memória de um dos maiores ícones da música brasileira, que sempre lutou por seus ideais. Descanse em paz, Redson!

Redson (vocais, guitarras), Val (baixo), Pierre (bateria)

1. Medo
2. Funcionários
3. Somos Vivos
4. Alternar
5. Multidões
6. Direitos Humanos
7. Guerrear
8. Vivo na Cidade
9. Humanidade
10. Alucinado
11. Continência
12. Não, Fome!
13. Adolescente
14. Pela Paz


Restos de Nada – Restos de Nada [1987]

A primeira banda punk brasileira de que se tem notícia, a Restos de Nada teve uma vida curta, tendo sido formada em 1978 e prosseguido carreira até o ano de 1980. Sua influência, porém, foi primordial para o desenvolvimento de toda cena punk, mesmo que esse desenvolvimento tenha durado pouco. O fundador deste grande ícone foi o guitarrista Douglas, que convida Clemente para compor um grupo ainda sem nome definido. A partir daí, foi só uma questão de tempo para que o projeto tomasse forma. A banda se reuniu em 1987 para deixar registrado alguns dos clássicos tocados naqueles tempos, e foi então que surgiu o disco autointitulado. Pauladas como “Ninguém É Meu Igual”, “Escravos”, “Desequilíbrio”, “Classe Dominante” e “Rebeldia Incontida” foram um verdadeiro chute na cara dos costumes e da ditadura, e continuam causando o mesmo impacto de antes. Histórico e obrigatório!

Ariel (vocais), Douglas (guitarras), Clemente (baixo), Charles (bateria)

1. Restos de Nada
2. Ninguém É Meu Igual
3. Ódio
4. Deixem-me Viver
5. Escravos
6. Desequilíbrio
7. Classe Dominante
8. Direito à Preguiça
9. Esperança de Liberdade
10. Rebeldia Incontida
11. R.D.N 1

Punk

2 comentários sobre “Cinco Discos Para Conhecer: O Movimento Punk No Brasil

  1. O cara elogia uma música abertamente fascista do Olho Seco, diz que Redson e Val depois formariam o Cólera, quando o Cólera existia antes do Olho Seco, fala que o movimento começou no começo dos 80, mas em 78 já tinha punks na Zona Norte… e ainda finaliza com chave de ouro dizendo que o Cólera terminou em 2011 com a morte do Redson. Que mundo esse cara vive?

    1. Muito obrigado pela sua participação. Ainda que o texto seja uma contribuição do site Van do Halen, me senti no direito de corrigir as informações. Foram retiradas do texto as informações equivocadas sobre o Olho Seco vir antes do Cólera e também sobre o fim do Cólera após a morte do Redson. Em relação aos outros 2 equívocos, na realidade, eles não existem. Em nenhum momento, ele disse que o movimento começou nos anos 80. Pelo contrário, no texto sobre o Restos de Nada, ele cita que a banda começou em 1978. O que ele disse foi que o movimento explodiu no início dos anos 80. Ou seja, ganhou força, cresceu de fato. E sobre a música “fascista” (“Nada”) é um direito dele, enquanto ouvinte, gostar da música, certo? Mas e aí? Você concorda com os álbuns selecionados?

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