Notorious Prophet – Passando a Ficha de Tears for Fears

Notorious Prophet – Passando a Ficha de Tears for Fears

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Por Mairon Machado

Na década de 80, a música mundial sofreu uma grande mudança. A chegada dos emblemáticos sintetizadores Prophet e Jupiter-8, fizeram com que uma nova geração de pessoas ao redor do mundo descobrisse um talento para tocar e criar música através de um único instrumento, e adicionando letras, fazer hits dançantes que contagiassem os jovens que surgiam cercados por novidades eletrônicas e também sociais. Nascia assim o synthpop, deixando um legado de muitos discos e sucessos nas rádios, mas para alguns, o marco do fim da era mais criativa da música, onde o rock originou inúmeras bandas que passaram a ser classificadas como jurássicas, com a maioria delas acabando (Led Zeppelin, Deep Purple, Yes, Emerson Lake & Palmer, Pink Floyd, The Beatles, entre outros), ou tendo que se adaptar aos novos tempos (Jethro Tull, Black Sabbath, Genesis, …).

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Os famosos sintetizadores Prophet (acima) e Jupiter 8 (abaixo), que marcaram o pop nos anos 80

Essa vertente musical assolou os anos 80 em paralelo ao novo heavy metal, subdividido em tantas categorias (doom, thrash, melodic, gothic, white, black, speed, hair, …) que fica impossível citar todas aqui, mas que também foi marcante para os anos 80. Quem gostava de um estilo, dificilmente gostava do outro, e vice-versa, além de gerar muitas rivalidades.

De qualquer forma, o Brasil pós-ditadura recebia com afeto e alegria tudo o que vinha importado da Europa e dos Estados Unidos, e com isso, nasceram muitas revistas para divulgar bandas, discos e estilos. Uma das revistas mais marcantes dos anos 80 foi a saudosa Bizz, da Editora Abril. Nas suas páginas, os brasileiros tinham acesso a resenhas de shows ocorridos em nosso país (e também lá fora), críticas sobre lançamentos de discos, entrevistas com nomes fortes da época, discografia básica, e como principal atrativo para os colecionadores, fichas descartáveis que eram colocadas no meio da revista, trazendo um pequeno resumo da biografia de determinado artista. Para quem acompanhava música nos anos 80, as fichas da Bizz foram tão marcantes quanto o som dos sintetizadores Prophet, que pode ser conferido em vários clássicos do synthpop, como a sensacional “Notorious”, do grupo inglês Duran Duran.

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Algumas das inúmeras fichas que a revista Bizz lançou

Como forma de homenagear os anos 80, mais precisamente o synthpop, eu e nosso novo consultor, Christiano Almeida, estamos criando a seção Notorious Prophet – Passando a ficha de … , onde de maneira similar às fichas da Bizz, iremos trazer mensalmente (contando com a colaboração de outros consultores) a biografia de bandas/artistas que marcaram o pop e o synthpop, e que mesmo desprezados por muitos roqueiros, merecem seus espaços nas páginas da consultoria.

Para quem acompanhou a seção A Little Respect, essa funcionará diferente. Naquela, destrinchamos a carreira de uma banda ou um determinado disco. Aqui, vamos nos concentrar em uma breve biografia, apresentando a discografia selecionada e um comentário sobre o disco para se iniciar na obra da banda/artista que estiver sendo tratada.

Com esse pequeno resumo então, convido-os para colocar seu walkman nos bolsos, pegar seus óculos Ray-Ban, abrir uma garrafa de Pepsi, colocar os Playmobil em posição, separar sua caneta de 12 cores para anotar as indicações que irão fazer você voltar aos anos 80.


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Roland Orzabal e Curt Smith

Tears for Fears

Roland Orzabal (Bath, Inglaterra, 22 de agosto de 1961, voz, teclados, guitarras) e Curt Smith (Bath, Inglaterra, 24 de junho de 1961, voz, baixo) conhecem-se no início da adolescência, aos 13 anos, sendo colegas de turma. Em seguida, montam o Graduate, ao lado de John Baker (guitarras) e Steve Buck (teclados). O grupo lança apenas um único álbum Acting My Age (1980), com um inspirado no Mod. Com o fim do Graduate, a dupla passa a assinar como Tears for Fears, lançando de forma independente o single “Suffer the Children”, ainda em 1980 e tendo a parceria de Ian Stanley (teclados, sintetizadores, programações) e Manny Elias (bateria).

No ano seguinte, assinam com a Phonogram, pela qual lançam três compactos, sendo o de maior sucesso “Mad World”, o terceiro deles, com o qual a dupla alcançou o Top 3 das paradas britânicas em 1982, levando ao lançamento do primeiro LP, The Hurting, já em 1983, trazendo como destaque a voz grave de Orzabal e um pop moderno que fez a Inglaterra dançar ao som das citadas, “Change” e “Pale Shelter”, ambas entrando nas paradas britânicas naquele ano, com The Hurting chegando ao topo de vendas no Reino Unido, e chamando a atenção do resto do mundo. Nesse álbum, a banda conta com o saxofone de Mel Collins, ex-King Crimson. A fama do grupo no Reino Unido os levou para os Estados Unidos para ser uma das atrações do Live Aid em 1985, mas por problemas contratuais, acabaram não participando do evento.

Dois anos depois, veio o sucesso global com o segundo disco. Songs from the Big Chair trouxe pelo menos três grandes sucessos: “Shout”,  “Everybody Wants to Rule the World”  e “I Believe”, essa última uma homenagem a um dos principais nomes da cena de Canterbury, Robert Wyatt, além da também conhecidíssima “Mothers Talk”, fazendo com que a banda atingisse a incrível marca de 9 milhões de cópias vendidas em pouco menos de um ano, levando-os a uma gigantesca turnê mundial.

A dupla decide descansar para compôr seu novo álbum, o qual chega às lojas em 1989. The Seeds of Love, o terceiro LP do grupo, trouxe a participação de Oleta Adams (vocais) e Phil Collins (bateria) em “Woman in Chains”, além de colocar a faixa “Sowing the Seeds of Love” no topo das paradas americanas, assim como o vinil. A turnê deste álbum trouxe o grupo pela primeira vez ao Brasil, durante a terceira edição do festival Hollywood Rock, em 1990, ao lado de nomes como Marillion, Bob Dylan, Terence Trent D’arby e Bon Jovi. Ainda em 1990, é lançado o VHS Going to California, gravado ao vivo em Santa Barbara, Califórnia.

Apesar do sucesso mundial, internamente o grupo passava por graves problemas, principalmente envolvendo as finanças, inclusive havendo processos de dívidas que atingiam a ordem de 1 milhão de libras. Esses problemas levaram a saída de Smith, e Orzabal manteve o nome Tears for Fears lançando a bela coletânea Tears Roll Down (Greatest Hits 82–92), de 1992, trazendo a inédita “Laid So Low (Tears Roll Down)”, e que virou platina dupla no Reino Unido e Platina nos Estados Unidos.

No ano seguinte, veio Elemental, com pelo menos mais um clássico, “Break It Down Again”, e a última grande turnê do grupo pelos Estados Unidos. Raoul and the Kings of Spain foi o quinto álbum, o segundo lançado somente com Orzabal, e que chegou às lojas em 1995, contando novamente com a participação de Oleta Adams, agora na faixa “Me and My Big Ideas”. Em 1996, veio a coletânea de raridades Saturnine Martial & Lunatic, que alegrou muito aos colecionadores da banda.

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Tears for Fears em 2014

As atividades do Tears for Fears ficaram encerradas até 2004, apenas com relançamentos dos álbuns clássicos e com Smith e Orzabal lançando discos em carreira solo. Entre 2000 e 2003, a dupla voltou a se reunir, gravando o álbum Everybody Loves a Happy Ending, que chegou às lojas em 2004 destacando as faixas “Closest Thing to Heaven”e a própria faixa-título. Veio o álbum ao vivo Secret World – Live in Paris (2006), com a inédita “Floating Down the River, e desde então, a dupla segue fazendo shows pelo Japão, América do Sul, Coreia do Sul e Estados Unidos. Em 2014, foi lançado o EP Ready Boy & Girls?, lançado em edição limitada em vinil de 10″, e desde 2014, o grupo está nos estúdios gravando seu sétimo álbum, aguardado ansiosamente pelos fãs de uma das principais bandas do pop oitentista.


Discografia: The Hurting (1983); Songs from the Big Chair (1985); The Seeds of Love (1989); Elemental (1993); Raoul and the Kings of Spain (1995); Saturnine Martial & Lunatic (1996); Everybody Loves a Happy Ending (2004).

Curt Smith – Soul on Board (1993); Mayfield (1997); Halfway, Pleased (2008); Deceptively Heavy (2013).

Roland Orzabal – Tomcats Screaming Outside (2001).

Com o Graduate – Acting My Age (1980).


R-124187-1349004315-5948.jpegDisco Recomendado: Songs from the Big Chair – Um dos melhores discos da década de 80 surge com a força do hit “Shout”, clássico que rapidamente tornou-se representante do som do Tears for Fears, com seu refrão grudento e sua levada dançante. Os saxofones de Mel Collins e Will Gregory preenchem a linda introdução de “The Working Hour”, pop intimista com a percussão destacada de Jerry Marotta. Os sintetizadores surgem com força em “Everybody Wants to Rule the World”, superclássico que faz você viajar para os anos 80 com seu ritmo datado, mas ainda hoje, muito bom. Eletrônicos e vocalizações tomam conta do terceiro clássico do LP “Mothers Talk”, a faixa mais synthpop de Songs from the Big Chair, responsável por encerrar o lado A. O lado B traz a baladaça jazzy “I Believe”, pequeno clássico destacando novamente o saxofone de Will Gregory e uma bela interpretação de Orzabal ao piano. A alucinada “Broken” conta com uma magistral introdução, onde a guitarra de Neil Taylor mostra como unir o rock pesado ao synthpop, seguida por mais um clássico, “Head Over Heels”, com suas vocalizações e seu riff marcante, além de um mix com uma versão ao vivo de “Broken”, encerrando esse fantástico disco com “Listen”, viajante faixa semi-instrumental, próxima ao clima New Age, regada com muitos sintetizadores e efeitos na guitarra. Um álbum para estar em local de fácil acesso na coleção, e que conquistou platina tripla no Reino Unido e quíntupla nos Estados Unidos, vendendo até hoje mais de dez milhões de cópias ao redor do mundo.


Vale a pena conferir: Das várias coletâneas que o grupo lançou, Tears Roll Down (Greatest Hits 82-92), é a principal, contendo os principais sucessos da banda no seu início de carreira, e também sendo responsável por apresentar os ingleses para a geração dos anos 90.

43 comentários sobre “Notorious Prophet – Passando a Ficha de Tears for Fears

  1. Alisson Caetano, Diogo Bizzotto e demais consultores que queiram colaborar com a série, serão bem-vindos. Valeu pela ideia Christiano

  2. Putz! Tias Fofinhas é uma das poucas bandas que consigo ouvir ainda hoje em dia. “Songs from the big chair” é realmente um grande álbum, daqueles em que não há música ruim. “I believe”, “Head over heels” e “Listen” estão entre as minhas favoritas de todos os tempos. É uma pena que, posteriormente, a banda se afundou na pretensão… Para essa série, sugiro uma análise da obra do Simple Minds, outra boa banda oitentista.

    1. Corrigindo: Tias Fofinhas é uma das poucas bandas DOS ANOS 80 que consigo ouvir ainda hoje em dia.

    2. Valeu Francisco, e Simple Minds é uma das várias bandas que vamos trazer aqui. A lista é grande, prepare-se

  3. Bem legal a ideia de falar mais sobre o synthpop, há muitas bandas legais surgidas na época e outras de segundo ou terceiro escalão que as vezes acertaram lá um hit nas rádios mas que possuem grande qualidade.

  4. Boa ideia de série. Uma essencial a ser mencionada e uma das poucas que envelheceram bem foi o Depeche Mode.

    1. Era minha primeira opção Alisson, mas como estava há alguns dias com “Shout” na cabeça, foi o TFF. Já passou outra banda na frente do Depeche, mas com certeza, vai pintar por aqui (se quiser colaborar, será bem-vindo)

      1. Não sou o maior especialista em synthpop, mas no que puder contribuir,o farei (talvez algo sobre o Technique do New Order, mas não to prometendo nada kkkkk)

        1. Nossa! “Technique” é uma baita álbum do New Order. Nunca fui fã da Joy Division, mas gosto do New Order. Stephen Morris é um baterista muito interessante. “Fine time” é uma obra-prima!

          1. Não são apenas os sons dos anos 80, Mairon? Se não for, falo livremente das coisas mais atuais.

          2. Christiano Almeida, você é o idealizador do projeto. Qual sua opinião?

  5. Rapaz, tinha esquecido dessas fichinhas! Lembrei que tinha essa ficha do Black Sabbath, entre outras. Pena que acho que se perderam por aí. A Bizz realmente foi uma revista muito clássica, ponto de entrada pra música pra muita gente!

    1. Durante bastante tempo, fui colecionador da Bizz. Depois que ela se tornou Showbizz, perdeu o vigor. O que eu mais gostava era a discografia básica, que aparecia sempre no final da revista…

      1. Da época da ShowBizz, quando aumentaram o tamanho da revista, passaram a tratar não só de música, e isso para mim não serviu. Mais ou menos como a atual Rolling Stone vem fazendo. Mas na época da Bizz, eu achava interessante a mescla de estilos. Diferente da Rock Brigade (focada praticamente no metal) ou na Top Rock (que era Rock Clássico em sua maioria), a Bizz trazia soul, jazz, funk, pop, synthpop, música nacional, metal, rock clássico, enfim, o que tivesse em voga. Foi talvez a melhor revista da sua época.

          1. A revista sempre teve altos de baixos, às vezes, na mesma fase e mesmo numa única edição. No começo me incomodava muito o desprezo pelo passado do rock e o “novidadismo” dos articulistas. Nesta época, escapavam deste clima algumas reportagens especiais, grandes entrevistas e as seções Discoteca Básica, sempre muito bem escrita e muitas vezes escrita por convidados, e a Junkebox, do Jedi René Ferri.
            Depois a revista, embora mantivesse um bom nível, foi constantemente atraída pelo ritmo do momento. A fase dance-eletrônica foi uma das mais chatas.
            Também concordo que o complexo de Rolling Stone, tentando virar uma revista de tendências, moda, política, etc. prejudicou muito a Bizz.
            Mas a gente tem de respeitar uma publicação de rock que durou 20 anos…um glorioso recorde.

          2. Eu respeito muito mais a Bizz do que a Rock Brigade, que assim como a primeira, também decaiu horrores nos seus últimos anos de vida.

  6. Bacana a iniciativa. Matéria bem legal. “Songs From The Big Chair” é realmente o álbum que mais gosto do Tears For Fears. Ele e o “The Seeds of Love” ainda são meus preferidos.

  7. Olha aí o Mairão escrevendo um texto menos enorme! E ótimo tópico. Conheço apenas o Songs from the Big Chair e o The Seeds of Love, do Tears for Fears, mas é o suficiente pra eu achar que o termo ‘synthpop’ pode dar uma má impressão sobre a banda, pelo menos se levarmos em conta a imagem que se tem do synthpop como música oitentista pra dançar. O som dos caras não apenas era bastante elaborado (como vários otros grupos de synthpop) como muitas vezes não se prestava exatamente pra dançar. Parabéns pelo texto e pela seção!

    1. A presença do Mel Collins nos primeiros álbuns foi um fator decisivo para começar a série com o TFF. Acho que o grupo é mais pop do que synthpop, mas é inegável que a presença dos sintetizadores é marcante em várias faixas da banda, principalmente nos dois clássicos citados pelo Davi.

  8. Songs From…é um grandíssimo disco.Muito superior inclusive aos demais lançamentos da dupla.

  9. Belíssima iniciativa, e um excelente texto. Fico imaginando como poderia colaborar, mas, mesmo sendo um fã de “música oitentista”, o synthpop nunca foi muito o meu forte… mesmo assim, gostei bastante da ideia da coluna, e fico aqui aguardando as demais bandas que passarão por ela!

  10. Mairon, vivi essa época do Tears for Fears ( tias fofinhas) e era sim uma das poucas bandas mais pops dos anos 80 que eu acompanhei de forma mais apurada, mas especificamente até o terceiro álbum.
    Pra mim também o Songs from the big chair é o melhor, mas há faixas interessantes nos outros dois, além de algumas aqui já citadas de uma fase posterior ( breaking down again, por exemplo).
    Me único senão ao texto é o fato de Head Over não estar listada entre os considerados clássicos do álbum mais vendido. I Believe, no meu entendimento daquela época, era mais obscura que esta. Deste forte álbum, no entanto, sempre gostei mais de Broken, pra mim se destacava das demais. E fica aqui uma menção a Pale Shelter do primeiro álbum, pra mim tão boa quanto qualquer outra do álbum mais platinado.

    Saudações,

    Alexandre

    1. Valeu Alexandre. De qual local você é? Pelo que percebi, as escolhas musicais das rádios nos anos 80 mudavam de região para região. Aqui no sul eram essas que rolavam. Saudações

      1. Rio de Janeiro. Head Over Heels era tão ou mais tocada do que Everybody wants to rule the world. Perdia pra Shout. I believe era para os conhecedores da banda. Gosto bastante da música.Eu conheci por uma indicação de uma menina do ensino médio, e acompanhei, mesmo sem ter os álbuns, até o terceiro deles. Nunca gostei muito do pop, as bandas de hard e metal da época viraram a minha cabeça na época, mas sempre tive uma exceção no Tears for Fears

        Alexandre

          1. Por favor! Essa seção é maravilhosa. Gostaria de se interessarem, postar conteúdo do meu blog no site. O que acha? Qualquer coisa, pode entrar em contato pelo e-mail. Abraço!

          2. Bruno, nos envie e-mail e conversamos (consultoriadorock@gmail.com)

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