Review Exclusivo: Jon Anderson (Porto Alegre, 9 de dezembro de 2011)

Review Exclusivo: Jon Anderson (Porto Alegre, 9 de dezembro de 2011)

Por Mairon Machado

Não sei determinar em poucas palavras as razões pelas quais me tornei fã do Yes. Na verdade, essas razões são tantas, que eu levaria dias citando-as por aqui. Mas uma delas, posso tranquilamente definir em duas palavras: Jon Anderson.
Principal vocalista do grupo britânico e um dos maiores gênios compositores do rock progressivo (disputando cabeça a cabeça com Peter Hammill, do Van der Graaf Generator), Jon Anderson esteve em Porto Alegre no último dia 9 de dezembro, como parte da turnê que fez pelo Brasil, passando por Santa Catarina (03/12), Goiânia (10/12) e São Paulo (13/12), e deixou aos presentes, que quase lotaram o Teatro do Bourbon Country, uma hora e meia de pura paz, amenidade e, como pregou em todo o show, amor.
Sozinho no palco, Anderson colocou na palmilha muito vocalista líder de grandes bandas do rock, que atualmente vivem tanto do passado quanto o velho Jon dos anos 60/70, mas sem ter o carisma, a voz e a capacidade de emocionar que o ex-líder do Yes tem. 
Desde o início da apresentação sentíamos que a noite seria especial. O palco, decorado com quatorze velas, continha um pequeno teclado, dois violões e alguns instrumentos não muito bem visíveis. Quando Anderson entrou, foram quase cinco minutos de aplausos ensandecidos, que só foram sanados a pedido de Anderson. Como disse meu irmão Micael ao final do show, se Anderson ficasse parado no palco, sem tocar em nada, estaria sendo aplaudido até agora.
Anderson pegou o violão e começou a passear por sua história, primeiramente com “Yours is No Disgrace”, clássico de The Yes Album, lançado em 1971. Depois, vieram vários “Excerpets from Yes Songs”, destacando pérolas como “Long Distance Runaround”, “Starship Trooper“, “Sweet Dreams”, “Time and a Word” e “And You And I“, não necessariamente nessa ordem. 

Entre cada canção, Anderson esbanjou simpatia e carisma, adicionados de um humor britânico carregado de ironias. As histórias que Anderson contou foram impagáveis, e só elas já valeram o show. Mas duas realmente marcaram a todos os presentes. 

A primeira delas foi quando Anderson contou sobre o seu longo processo de recuperação da sua insuficiência respiratória aguda, que demorou seis meses de um tratamento intensivo durante o ano de 2008, levando a imprensa a exagerar, falando que o vocalista nunca mais iria cantar, e também decretando a sua saída do Yes. A história foi contada por um Anderson fortemente emocionado, carregando um estranho instrumento que foi o responsável por acompanhá-lo na linda “Under Heaven’s Door (Never Ever)”.

A segunda foi a hilária história da parceria com o tecladista Vangelis, e de como o grego recusava-se a ganhar dinheiro e se tornar um pop star. Tentar traduzir em palavras esse momento do show é impossível, mas posso dizer sem medo de errar que todo o teatro caiu em gargalhada com a interpretação de Anderson imitando as reações de Vangelis perante o sucesso, seguido pela canção “Find My Way Home”, gravada por Jon & Vangelis na segunda edição do álbum The Friends of Mr. Cairo (1981).

Porém, para este que vos escreve, os principais momentos do show estiveram relacionados àquele que julgo ser o melhor álbum da história do rock progressivo (e por que não da música), Tales From Topographic Oceans, lançado pelo Yes em 1973.

Anderson foi para o piano, onde, mostrando ter muita dificuldade em executar as notas do instrumento (inclusive debochando de si mesmo, dizendo só saber tocar as teclas brancas), começou a soltar acordes e frases sem sentido,  formando a canção “Set Sail”, e que, aos poucos, foram se transformando em “Close to the Edge”. Obviamente, a longa suíte de seu álbum homônimo não foi tocada na íntegra, mas aqueles minutos ouvindo Anderson, com sua voz cristalina, cantando esse clássico do progressivo, eram como verdadeiros tesouros. 

No meio de “Close to the Edge”, Anderson começou a delirar no piano, tal qual um Keith Jarret durante uma apresentação, e desta forma, entoou algumas frases de “Heart of the Sunrise”, passando novamente para “Set Sails” e finalmente, cantando as primeiras e complicadas frases de “The Revealing Science of God”, a primeira parte da suíte “Tales from Topographic Oceans”. Confesso que devo ter sido um dos poucos a ter reconhecido a frase “dawn of light lying between a silence and sold sources”, e que meu coração simplesmente parou naquele instante. O mais impressionante foi que Anderson cantou toda a longa introdução de “The Revealing Science of God” em um estado de êxtase quase alucinante, e quando chegou na parte central da canção, que fala “what happened to wonders we once knew so well”, o Teatro inteiro veio abaixo.

Anderson então concluiu aquele momento-delírio ao piano, e todo mundo o aplaudiu em pé. Ali ele ganhou de vez o público presente, e pôde se soltar. Convidando a plateia a participar, cantou “The Light of Love”, na qual a plateia ajudou fazendo os backing vocals ensinados por Anderson (“boom-boom-boom-boom-boom”), voltou ao início de sua carreira solo, no álbum Olias of Sunhillow, para fazer uma magistral performance de “Flight of the Moorglade /  To the Runner”, contou sobre os momentos do Yes nos anos 80 (e brincou novamente com Vangelis, citando a frase “Take the Money”) para apresentar uma pesada versão de “Owner of a Lonely Heart“, somente ao violão, e após mais uma brincadeira com a plateia, emocionou a todos com “America”.

Depois, voltou a contar histórias sobre o Yes, citando o nome de alguns álbuns marcantes, como Fragile, Close to the Edge e claro, Tales from Topographic Ocenas, quando novamente, o nome desse último foi citado, o teatro rugiu como em uma final de futebol (incrível como um disco tão criticado pode ser tão admirado ao mesmo tempo, sendo um verdadeiro caso de amor e ódio). De Tales, ele resgatou “Leaves of Green”, a última parte de “The Ancient” (terceira parte da suíte “Tales from Topographic Oceans”, dedicada ao solo do guitarrista Steve Howe), e, claro, não perdeu a oportunidade de tirar sarro com Howe, errando as notas e dizendo: “mas como eu esqueci isso? Fui eu quem fez essa música!”.

Mais uma história interessante veio relacionada ao irmão de Anderson, Tony, para a qual ele dedicou a canção “Tony and Me”, na qual Jon usou um ukulelê. Durante a história, Anderson contou como foi seu início de carreira, tocando ao lado do irmão, e de como conheceu um garoto branco de apenas dezesseis anos, que cantava como Ray Charles, e que se chamava Joe Cocker.

Piadas, declarações de amor da plateia para Anderson, desejos de “Merry Christmas” feito por Anderson, e o show concluiu-se com “I’ve Seen All Good People”, “Show Me” e “Roundabout”. Mas Anderson não resistiu ao apelo do público, e voltou para o bis atacando de “Wonderous Stories” (Yes) e encerrando magistralmente com “Soon” (última parte de “The Gates of Dellirium”, lançada pelo Yes no álbum Relayer, de 1975).

Anderson saiu do palco visilvemente cansado, principalmente, pelo que ele reclamou, das cinco horas que teve que ficar no aeroporto de São Paulo antes de ir para Porto Alegre, e das seis horas de viagem de Santiago (onde tinha se apresentado duas noites antes) até São Paulo. Mas o sorriso em sua face demonstrou que havia feito um grande show, e que tinha agradado aos presentes, os quais deixaram o Teatro com uma cara de embasbacamento e redenção perante um verdadeiro artista da música, depois de uma hora e meia de pura devoção.

Se para alguns metidos a especialistas, que se acham com prestígio no centro do país, o show de Jon Anderson tinha cheiro de picaretagem, para um modesto colaborador da Consultoria do Rock, que gosta de ir a shows, é um fã de Yes e não fica de mi-mi-mi no Twitter o dia inteiro, foi a melhor maneira de encerrar a temporada de shows de 2011, e, principalmente, de demonstrar que ver um artista que você gosta ao vivo, cantando aquilo que você aprendeu a curtir, não tem preço.

Que venha 2012, prometendo já para o dia 27 de janeiro mais emoção, através da presença de Mark Farner (Grand Funk Railroad) na capital gaúcha.

Set list:

1. Yours Is No Disgrace (Yes)
2. Sweet Dreams (Yes)
3. Long Distance Runaround (Yes)
4. Time and a Word (Yes) 

5. Everyday Love
6. Under Heaven’s Door (Never Ever)
7. Find My Way Home (Jon & Vangelis)
8. Starship Trooper (Yes)
9. America (Yes / original de Simon & Garfunkel)
10. Owner of a Lonely Heart (Yes)
11. Piano Medley (Set Sail, Close to the Edge, Heart of the Sunrise, Set Sail Reprise, The Revealing Science of God) 
12. Marry With Me Again
13. Flight of the Moorglade / To the Runner
14. The Light Of Love
15. And You and I (Yes)
16. Tony And Me (Yes)
17. I’ve Seen All Good People (Yes)
18. Show Me
19. Roundabout (Yes)

Bis:

20. Wonderous Stories (Yes)
21. Soon (Yes)

5 comentários sobre “Review Exclusivo: Jon Anderson (Porto Alegre, 9 de dezembro de 2011)

  1. Um show verdadeiramente emocionante, e um artista com um talento soberbo, uma dádiva que realmente só pode ser coisa divina.

    Falam muito sobre Anderson ser arrogante e cheio de manias. Mas ali, sozinho no palco do teatro, ele demonstrou foi muito carisma, simpatia e humildade, cativando a todos que se permitiram o prazer quase espiritual de assistir à sua apresentação.

    Já havia visto Anderson com o Yes anos atrás, mas não foi nada comparado a esta noite somente com o som de sua voz e de seus instrumentos. Magistral é pouco.

    E ainda dizem que ele não tem mais voz para cantar no Yes. Parafraseando um famoso bordão da internet, se cantar assim é estar mal, pohan, o que é cantar bem então?

  2. Em função de toda a locura que passei nas últimas semanas e também por estar pouco capitalizado (hehe), não pude ir ao show. Mas gostaria muito, afinal, não julgo um show desses como picaretagem, de maneira alguma. Jon Anderson tocou músicas que compôs ao longo de toda sua carreira tanto com o Yes, banda da qual sempre foi "a voz", quanto em outros projetos. Se ele não está no momento integrando o Yes, nada mais normal que tocar sua carreira sozinho, fazendo shows no formato que melhor lhe convir. Os fãs certamente agradecem. Picaretagem pra mim é, por exemplo, artistas que focam a continuidade de sua carreira em certos momentos de glória passada, muitas vezes efêmera, e insistem nisso, como nosso velho conhecido Paul Di'Anno. Outro é Joe Lynn Turner, quando insiste em investir em excesso em um repertório formado por músicas antigas do Deep Purple, sendo que sua única passagem pelo grupo foi no duvidoso "Slaves and Masters".

  3. Quer um real exemplo de picaretagem???
    o YES simplesmente abandonar o cara,contratar um qualquer(que ate que nao canta mal,mas nao passa de um cover mal sucedido),gravar um disco fraquissimo cujo as musicas,em sua maioria,nem sao de propria autoria e ainda se intitularem YES..envergonhando o grandioso nome da banda….
    Na minha opiniao , o Anderson nao precisa voltar pro Yes,é o Yes quem precisa(e,urgentemente) voltar pro Anderson….

  4. Apesar de tah devendo ouvir um monte dos últimos discos do Yes – e vou ficar devendo um bom tempo ainda -, acho que ouvi o suficiente pra saber que a banda perdeu o toque mágico nas composições e que a voz do Anderson não me desce mais. Apesar disso, eu pagaria caro pra ver um show desses! Vocês são felizes e não sabem, bibas gaúchas! keke

    (Os irmãos Machado até que devem saber.)

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