I Wanna Go Back: Bryan Adams – Cuts Like a Knife [1983]

I Wanna Go Back: Bryan Adams – Cuts Like a Knife [1983]

Por Diogo Bizotto
Embora hoje em dia Bryan Adams seja visto predominantemente como um cantor pop que, no decorrer dos anos 90, compôs e gravou diversas músicas que fizeram parte de trilhas sonoras de filmes hollywoodianos, como “(Everything I Do) I Do It For You” (de “Robin Hood: O Príncipe dos Ladrões”), “Have You Ever Really Loved a Woman” (de “Don Juan DeMarco”) e “All For Love” (de “Os Três Mosqueteiros”), é bom deixar claro que seus pés sempre estiveram fincados sobre solo roqueiro.

A carreira musical profissional do canadense teve início em meados dos anos 70, quando, com apenas 15 anos, registrou os vocais para o álbum If Wishes Were Horses…, do grupo Sweeney Todd, lançado em 1977. Tendo deixado a banda logo em seguida, juntou-se àquele que seria seu grande parceiro de composição por quase duas décadas, Jim Vallance, e começou a escrever diversas canções que lhe renderiam um contrato com a gravadora A&M, pelo qual recebeu a quantia simbólica de um dólar. Seu primeiro álbum solo, Bryan Adams, que contava majoritariamente com seu trabalho na guitarra e nos vocais, além de Jim no baixo e na bateria, emergiu em 1980, constituindo um registro sem tantos atrativos, mas possuidor de vários pop rocks agradáveis, caso de “Wastin’ Time” e “Try to See It My Way”.


You Want It, You Got It (1981), seu segundo disco, representou um salto significativo de qualidade e a busca de um estilo próprio, começando a destacar seu trabalho como compositor, fato que renderia convites para escrever para outros grupos no decorrer dos anos, sendo uma de suas primeiras parcerias a estabelecida com o Kiss, que resultaria nas músicas “Rock and Roll Hell” e “War Machine”, escritas com Gene Simmons, que se fizeram presentes no álbum Creatures of the Night (1982), e em “Down on Your Knees”, faixa composta com Paul Stanley, que deu as caras na coletânea Killers (1982). Voltando a You Want It, You Got It, fica óbvia não apenas a melhor produção, mas o fato de que as guitarras roncam mais alto, as linhas de bateria são mais criativas (cortesia de Mickey Curry, iniciando uma parceria que dura até hoje), enfim, tudo está mais coeso. Não à toa, algumas das faixas do álbum seriam coverizadas por artistas estabelecidos havia muitos anos, caso de minha preferida, “Lonely Nights”, que recebeu uma versão do Uriah Heep no álbum Head First (1983) e de “Tonight”, coverizada por Randy Meisner (ex-baixista do Eagles). “Fits Ya Good” e “Jealousy” são outros destaques óbvios do disco, que, apesar do êxito apenas moderado fora do Canadá, lançou as fundações do sucesso que seria alcançado pelo álbum seguinte.

Bryan compondo com Jim Vallance

Lançado em janeiro de 1983, Cuts Like a Knife representou o ponto onde as crescentes qualidades de Bryan como compositor encontraram-se com uma sensibilidade pop que se manifestou através de músicas mais encorpadas, ganchudas e ao mesmo tempo melódicas, resultando em um perfeito pano de fundo para que sua voz rouca oferecesse interpretações honestas, sem exageros, e com alma roqueira mesmo nos momentos mais calmos do disco. Se o mercado norte-americano ainda estava resistindo às qualidades do canadense, dessa vez a aceitação foi imediata, colocando o álbum na oitava posição da Billboard e destacando cinco singles extraídos do disco, cuja repercussão maior se deu através da faixa-título e da power ballad “Straight From the Heart”.

Enquanto em You Want It, You Got It teve início a parceria com o baterista Mickey Curry, em Cuts Like a Knife quem estreou ao lado de Bryan foi o guitarrista Keith Scott, outro que até hoje mantém-se ao lado do músico, tanto em estúdio quanto ao vivo, dividindo bases e solos, adicionando novas possibilidades com sua Fender Stratocaster. Outra participação digna de nota é a do vocalista do Foreigner, Lou Gramm, que executa backing vocals em sete das dez faixas do álbum.

Bryan Adams ao vivo

De maneira bem solta, mas destacando a dinâmica entre as guitarras de Bryan e Keith, timbradas distintamente, tem início “The Only One”, cujo tema principal já é memorizado de cara. Cantando confortavelmente sobre uma base simples mas bem engendrada, incluindo o órgão hammond, Bryan faz a canção evoluir através de seus vocais, que vão ficando levemente mais agressivos conforme chegam pontes e refrões. Ao mesmo tempo mais hardeira e suingada, “Take Me Back” traz, além de Bryan, Keith e Lou, os backing vocals de Alfa Anderson, famosa por ter integrado o Chic, um dos melhores grupos a emergir da disco music. Também contando com a presença pronunciada do hammond, “Take Me Back” é menos linear que a antecessora, incluindo um segmento de vocais sussurrados, quebrado pelo refrão executado com fôlego total.

Com um andamento mais veloz, “This Time” é sem dúvida um dos destaques do disco, trazendo uma fórmula que seria seguida em algumas de suas canções posteriormente. Primeiro single a obter sucesso na Europa, pavimentou o caminho para seu êxito no Velho Continente, que, em especial a partir dos anos 90, se tornaria um mercado tão ou mais importante que os Estados Unidos, em especial na Grã-Bretanha, onde Bryan goza de muita admiração. É necessário frisar que, mesmo não sendo do tipo de guitarrista que baseia tanto suas músicas em grandes riffs, Bryan sabe construir temas que, executados no instrumento, são muitas vezes mais memoráveis que bons refrões e melodias vocais agradáveis. O tema inicial de “This Time” é um belo exemplo disso, contando ainda com Keith Scott no slide.

Single para “Cuts Like a Knife”

Se existe uma música responsável por colocar o nome de Bryan definitivamente no mapa, essa é “Straight From the Heart”. Composta originalmente em 1978, a balada, ao contrário de outras posteriores, como “Heaven” e “Please Forgive Me”, não aposta em um formato mais bombástico, pronto para ser entoado pelas multidões; o cantor mantém um certo controle de sua voz rouca, casando bem com a sutileza do piano que conduz a música. Já a faixa-título trata-se não apenas da melhor canção, mas do momento mais roqueiro do disco. “Cuts Like a Knife” remete ao melhor que cantores/compositores como Bruce Springsteen e John Cougar Mellencamp faziam na época, fato que causa indignação face ao pouco reconhecimento recebido por Bryan pela crítica musical. Trata-se não apenas de uma das melhores músicas registradas por Bryan em sua longa carreira, mas um testamento do bom rock ‘n’ roll feito nos anos 80. Incluindo um ótimo solo de Keith Scott e auxiliada por uma boa linha de baixo, essa hardeira canção cimentou de vez a reputação de Bryan como um compositor talentoso.

A empolgante “I’m Ready” dá continuidade ao baile com êxito, através de sua boa união de guitarra com sintetizadores, enquanto “What It’s Gonna Be” abre com um tema de guitarra que remete a “The Only One”, mas incluindo violões e uma intervenção mais presente do teclado e melodias mais “alegres”.

Mencionei mais acima que Bryan compôs, junto com Gene Simmons, duas faixas que vieram a fazer parte do álbum Creatures of the Night. O que poucos sabem é que, na mesma época, Bryan trabalhou também, junto ao então baterista do Kiss, Eric Carr, em uma música que acabou não sendo aproveitada no disco. Trata-se de “Don’t Leave Me Lonely”, que, aberta com um solo, está entre as mais “guitarrísticas” do álbum. Confira aqui uma tomada de bateria originalmente gravada por Eric Carr para essa canção.

Bryan e Keith Scott ao vivo

“Let Him Know”, calcada em backing vocals como nenhuma outra música no álbum, configura-se no ponto mais baixo, enquanto o final com “The Best Was Yet to Come” é sutil, destacando a voz de Bryan sobre um andamento dominado pelos sintetizadores e pelo piano, que sofre intervenções muito bem postadas, sem exageros, de violão, baixo e bateria. Uma balada mais tipicamente AOR, e escolha atípica para o encerramento do disco.

Com seu álbum seguinte, Reckless (1984), Bryan alcançaria não apenas o topo das paradas ao redor do mundo, destacando diversos singles de sucesso, como “Heaven”, “Summer of ’69” e “Run to You”, mas atingiria o ápice de sua parceria com Jim Vallance, produzindo o melhor álbum de sua carreira, recheado de rocks empolgantes com uma sensibilidade pop rara. Entretanto, em Cuts Like a Knife é que foram construídas as fundações de toda essa repercussão, um disco onde o canadense finalmente encontrou seu estilo e o expôs com propriedade. Esqueça as trilhas sonoras e ouça o Bryan oitentista, roqueiro sim senhor!

Track list:

1. The Only One
2. Take Me Back
3. This Time
4. Straight From the Heart
5. Cuts Like a Knife
6. I’m Ready
7. What It’s Gonna Be
8. Don’t Leave Me Lonely
9. Let Him Know
10. The Best Was Yet to Come

3 comentários sobre “I Wanna Go Back: Bryan Adams – Cuts Like a Knife [1983]

  1. Diogo, eu já tentei diversas vezes ouvir o Bryan. Das faixas que disponibilizasse aqui, a melhor sem duvidas é a entrada de bateria do Eric Car (para não dizer que foi a unica coisa que gostei). Acho o Bryan um Bruce Springsteen canadense, e sem os mesmos pontos positivos que poso atribuir ao Bruce (principalmente a capacidade de composição das letras e canções)

    Entendo quem gosta do Bryan hollywoodiano, e que na verdade não é de todo ruim, mas essa fase oitentista além de datada (algo que até não seria problema) eu nao consigo mesmo digerir.

    Enfim, vamos ver na próxima sessão do I Wanna Go Back o q vem pela frente. Do que me foi apresentado em sua maioria eu tenho curtido, com os Blanc Faces sendo o melhor até o momento.

  2. ESSAS FAIXAS DO ALBUM CREATURES OF THE NIGHT DO KISS NA QUAL BRYAN ADAMS COMPÔS SÃO FORMIDAVÉIS.

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