Maravilhas do Mundo Prog: Yes – Mind Drive [1997]
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Por Mairon Machado
E chegamos na última Maravilha Prog do Yes, ao menos por enquanto. Depois de passarem por um longo período governados pelo guitarrista e vocalista Trevor Rabin (1983 – 1995), divergências musicais fizeram com que o sul-africano abandonasse a banda, seguido pelo tecladista Tony Kaye. Cada um foi fazer sua vida musicalmente, deixando Jon Anderson (vocais, flautas, violões, percussão), Chris Squire (baixo, vocais, violões) e Alan White (bateria, percussão) com um futuro incerto.
Dois anos antes, o guitarrista Steve Howe havia encontrado o vocalista Jon Anderson para as gravações de Symphonic Music of Yes, deixando a sensação de que uma união dos dois maiores compositores do Yes, que haviam feito a fama do grupo na década de 70 com Maravilhas como “Close to the Edge“, “The Revealing Science of God (Dance of the Dawn)“, “The Gates of Dellirium” e “Awaken“, era novamente possível. Com a saída de Rabin, e Howe tendo sua carreira solo em baixa, o convite foi feito, e em outubro de 1995, era anunciado o retorno de Howe ao Yes. Quinze anos após Anderson ter saído do Yes pela primeira vez, os dois voltavam a dividir o mesmo espaço, apesar de deixarem claros que divergências pessoais ainda existiam, mas jamais iriam influenciar na relação profissional.

Faltava ainda o novo tecladista, que recaiu nas costas de Rick Wakeman. Pela terceira vez, o tecladista ingressava como membro do Yes, e a formação de Tales from Topographic Oceans, Going for the One e Tormato estava novamente reunida.
O alarde da imprensa ouriçou os fãs, e todos ficaram pensando o que o quinteto estava preparando. Duas canções surgiram logo nos primeiros ensaios, “Be the one” e “That, That Is”, representando uma nova direção para o grupo, mesclando a sonoridade pop existente no período Rabin com pinceladas do progressivo característico do período áureo do grupo. As duas faixas foram registradas em novembro de 1995, e aguardaram a companhia de novas irmãs para serem lançadas mundialmente.

Três noites então foram agendadas para o Fremont Theater, em San Luis Obispo (Califórnia), em 04, 05 e 06 de março de 1995, e foram registradas no DVD Keys to Ascension, um dos primeiros lançamentos mundiais nesse formato. Desses shows, sete canções acabaram sendo lançadas no CD Keys to Ascension (1996), que são: “Siberian Khatru”, “The Revealing Science of God (Dance of the Dawn)”, “America”, “Onward”, “Awaken”, “Roundabout” e “Starship Trooper”. Junto destas, as duas canções citadas acima. O álbum duplo vendeu bem no Reino Unido, alcançando a quadragésima oitava posição, e entrou nos 100 mais da Billboard americana, fortalecendo o quinteto a preparar um novo material.
Durante 1996, passam a compor, ensaiar e gravar novas canções, preparando-se para o primeiro lançamento de estúdio do quinteto em quase vinte anos. Assim, mais cinco faixas foram registradas, algumas aproveitando-se de um projeto que envolveu Chris Squire, Alan White e Jimmy Page, chamado XYZ. Mas, quando o novo álbum estava prestes a ser lançado, a gravadora Essential preferiu lançar as mesmas acompanhadas do material ao vivo que ficou de fora da primeira versão de Keys to Ascension. O novo álbum duplo, batizado Keys to Ascension 2, chegou às lojas em 1997, e no primeiro CD, apresenta “I’ve Seen All Good People”, “Going for the One”, “Time and a Word”, “Close to the Edge”, “Turn of the Century” e “And You And I”, todas registradas em San Luis Obispo. No segundo CD, as canções inéditas e que deveriam ter saído em um único CD simples, começando com a Maravilhosa “Mind Drive”.

Esse espetáculo sonoro começa com os acordes de teclado e uma fantástica passagem de violão feita por Howe. Seu solo é melodioso, simples e belíssimo, nos preparando para os próximos minutos delirantes. Howe ganha a companhia de Squire, fazendo as mesmas notas do violão com o baixo, e então, Howe passa a solar com velocidade no violão, enquanto teclados e baixo o acompanham com breves marcações.
Dois minutos e o baixo faz a marcação aguda, partindo para uma marcação cavalgante grave com a entrada da caixa, que repete as mesmas batidas do baixo. Wakeman faz o tema principal, mudando acordes nos sintetizadores, enquanto Howe delira na guitarra, lembrando muito a introdução de “Close to the Edge”, apesar do ritmo não ser tão avassalador quanto na Maravilha de 1972, mas o crescendo agonizante da canção é perfeito. Somente essa introdução já vale a presença da faixa aqui, mas recém passaram-se quatro minutos.
Uma sequência incrível de notas feitas por baixo, guitarra e teclados, mais a marcação forte, nos apresenta as vozes de Squire, Anderson e Howe, cantando ao mesmo tempo, sempre com o ritmo cavalgante e as constantes mudanças dos teclados. Howe faz um breve solo, trazendo a segunda estrofe da letra, e mais uma série de marcações encerra a agonia repentinamente.

Leves notas de teclados trazem a angelical voz de Anderson, abençoando à todos acompanhado pelo violão de Howe, e chegamos no coração de “Mind Drive”, com o violão e o piano acompanhando os vocais de Anderson, assim como intervenções vocais de Squire, principalmente no refrão da canção, onde a guitarra aparece timidamente. Destaque também para o pesado acompanhamento de White durante o refrão. A última estrofe vocal tem Anderson acompanhado apenas por Squire fazendo vocalizações e uma bela escala no baixo, encerrando com o peso que leva para mais uma repetição do refrão.
O peso acompanha um breve solo de Howe, e agora Anderson é acompanhado pelos teclados de Wakeman, levando ao maravilhoso solo de violão feito por Howe. As escalas flamencas arrepiam, acompanhadas por longos acordes de teclados e as escalas de baixo, complementadas pela voz de Anderson, retirada do fundo de sua alma, em um belíssimo momento da suíte, com Howe e Anderson disputando a atenção do ouvinte, e as camadas de teclados e a escala de baixo fazendo a perfeita sinfonia para esse duelo.
O baixo repentinamente muda seu andamento, deixando o violão sozinho, executando um tema jazzístico, que então explode no sensacional solo de moog, com uma velocidade impecável, comandada pelo ritmo da bateria, baixo e guitarra, mostrando que com o passar dos anos, o tecladista não perdeu nem um pouco de seu talento. Howe então debulha a guitarra com uma furiosa escala jazzística, lembrando os bons tempos de “Yours Is No Disgrace”, e uma série de notas leva-nos para a repetição do refrão, entoando o nome da suíte com o pesado acompanhamento de White.
Passagens de moog fazem Anderson repetir a letra, assim como o refrão, acompanhado pelo piano e pela voz de Squire, e então a agonizante sessão rítmica do início da canção aparece novamente, mostrando um desenvolvimento cíclico dessa joia, com Howe solando como nunca, e sobre o andamento, Squire, Anderson e Howe encerram a letra de “Mind Drive” com agressividade, mas ainda não é o encerramento da mesma. O ritmo marcado faz com que Howe e Wakeman executem o mesmo tema, dando espaço para Howe exibir suas virtudes mais um pouco, com outro grande solo, enquanto a base agonizante não para de crescer em nossos ouvidos, explodindo novamente em outro maravilhoso solo de Wakeman, agora no moog, estraçalhando como nunca e mandando ver nos efeitos. A magistral sequência de acordes feitas por teclados, baixo e guitarra, com as viradas de White, apresentam o último trecho instrumental, uma agitada sessão com solos de Howe e Wakeman, encerrando essa Maravilhosa canção com longas notas de moog, em uma escala decrescente.

As demais canções inéditas pertencentes a Keys to Ascension 2 são “Foot Prints”, com qualidades interessantes, mas longe dos bons tempos da década de 70, “Bring Me to the Power”, e um espetáculo a parte do violão de Howe, apesar do clima oitentista, “Children of Light”, mostrando os caminhos que o Yes iria seguir a partir de então, empregando muita percussão e efeitos de sintetizadores, e a balada instrumental “Sign Language”, somente Wakeman e Howe, ora no piano e violão, ora nos sintetizadores e guitarra.
Todas as canções originais de ambas as versões de Keys to Ascension, foram posteriormente lançadas juntas no CD Keystudio (2001), um item de colecionador. Wakeman saiu novamente do grupo, indignado por seus colegas terem preferido o lançamento de um CD duplo com canções ao vivo, ao invés de um álbum somente com inéditas (e que tinha até um título, Know). Para piorar, uma turnê já estava agendada para os Estados Unidos entre junho e julho de 1997, sem o consentimento do tecladista, que como sempre convém lembrar, pertence a um selo diferente do selo que o Yes gravava.

A sua saída tornou-se inevitável, e a Know Tour foi cancelada. Para seu lugar veio o russo Igor Khoroshev, e com a adição de Billy Sherwood, guitarrista que havia produzido os álbuns Keys to Ascension, e também havia dividido o palco em alguns shows da Talk Tour, vieram Open Your Eyes (cuja turnê tive o prazer de assistir em 1998, mesmo ano de lançamento do álbum) e The Ladder (1999).
Sherwood e Khoroshev deixaram a banda em 2000, ano que o Yes começou a montar uma série de shows que ficou conhecida como Masterworks Tour, nos quais o grupo apresentava petardos como “Close to the Edge”, “Ritual” e “The Gates of Dellirium” na íntegra. Essa turnê foi responsável pelo grupo criar o seu melhor álbum desde Going for the One (1977), Magnification, lançado em 2001 e detentor das Maravilhosas “In the Presence Of” e “Magnification”. A turnê desse álbum mostrou o Yes acompanhado por uma orquestra, em cada cidade por onde passou, e teve como registro o essencial DVD Symphonic Live, lançado em 2002.
Em 2007, quando o grupo planejava a turnê para comemorar os 35 anos de aniversário de Close to the Edge, Anderson passou por problemas respiratórios, e foi substituído por Benoît David, que excursionou com o grupo (agora com Oliver Wakeman, filho de Rick, nos teclados) e gravou o álbum Fly from Here (2011), tendo Geoff Downess nos teclados e resgatando canções do período de Drama.

Em 2014, o grupo fez uma turnê mundial apresentando os álbuns Close to the Edge, Going for the One e Yes Album na íntegra (que inclusive passou pelo Brasil), com Jon Davison nos vocais, e começou a realizar o Cruise to the Edge, cruzeiro que atravessava os mares do Caribe com convidados como Marillion, Steve Hackett, Three Friends, PFM entre outros, acompanhada, por exemplo, por nosso colega Marcio Costa em 2017. Ainda em 2014, lançou o fraco Heaven & Earth, assim como vieram na sequência uma série de álbuns ao vivo, e mais dois discos de estúdio, The Quest (2021) e Mirror To The Sky (2023) tendo na formação apenas Steve Howe como membro da era clássica, já que infelizmente, Chris Squire nos deixou em 27 de junho de 2015 (portanto há exatos 10 anos), vítima de leucemia, enquanto Alan White veio a falecer em 26 de maio de 2022.
O Yes segue na ativa tendo Howe a liderança, além de Geoff Downess (teclados), Jon Davison (vocais), Billy Sherwood (baixo) e Jay Schellen (bateria), prometendo lançar mais um álbum de estúdio em breve, e mantendo a chama das eternas Maravilhas Prog que o grupo lançou ao longo de uma carreira de quase 60 anos.
Descrição impecável dessa que é não somente uma das melhores músicas dos dois “Keys…”, mas também do próprio Yes desde sua volta em 1983 – fui ouvir de novo pela primeira vez em algum tempo e a música é bem assim. É pena que nunca mais se verá esses cinco gigantes do prog juntos novamente, afinal, com as mortes de Squire e White e a aposentadoria de Wakeman, somente Anderson e Howe circulam por aí. Tinha esperança de ver os dois se reconciliarem, mas vai ser mais fácil o Boca Juniors e o River Plate formarem um time só.
Voltando a “Mind Drive”, Howe tem um dos melhores desempenhos de toda a sua vida nessa música, o que ele faz nas guitarras e violões é absurdo até mesmo para os padrões elevados do cara. Alan White também me impressionou positivamente, Anderson e Squire dão o seu melhor, como sempre, e só Wakeman soa um tanto discreto, sem grandes voos nos seus 136 teclados. Gostaria de ver essas músicas do “Keys…” serem recuperadas pelo Yes atual do Howe, pois lançar um 83º disco ao vivo com “Roundabout”, “I’ve Seen All Good People” ou “Close to the Edge” – uma possibilidade que nunca pode ser desprezada – será dose para leão…