Minhas 10 Favoritas Do Rush

Minhas 10 Favoritas Do Rush

Por Mairon Machado

O recente anúncio do retorno do Rush, trazendo a baterista Anika Nilles no lugar de Neil Peart, abalou as estruturas do mundo da música. Ok que muita gente cogitou esse retorno, e até fez apostas do nível “quem matou Odete Roitman” de quem seria o baterista em um suposto retorno – com ampla predileção pela maioria dos fãs por Mike Portnoy – e, muita gente torceu o nariz pela escolha da garota. Particularmente, eu me considero um fã de carteirinha do Rush, tive a oportunidade de ver o grupo duas vezes, em 2002 e 2010, e na turnê de 2010, já via uma fraqueza tanto na performance de Neil Peart (falecido em 7 de janeiro de 2020), e principalmente, nos vocais de Geddy Lee, o que a turnê R40 (e o DVD/CD da mesma) atestaram que, para mim, era o fim do Rush. Isso há 15 anos!

Esse retorno não me empolgou em nada, mas, me inspirou a fazer minha listinha das 10 favoritas dos caras. Sendo assim, vamos a ela começando do décimo colocado, e acreditando que muita gente aqui vai me jogar pedras por não ver clássicos consagrados do trio canadense. Mas não fiquem tristes, eu deixei no mínimo mais 10 de fora, e nenhuma delas é um clássico.

Alex Lifeson, Neil Peart e Geddy Lee. Rush ao vivo em 1976

10. “Countdown” – Signals (1982)

Essa faixa que homenageia o primeiro lançamento do ônibus espacial Columbia (ocorrido em 12 de abril de 1981) é um choque de audição para quem está ouvindo Signals e chega no encerramento justo com ela. Ao longo de um disco onde o progressivo parece ter sumido, e contando até com a presença de violino elétrico em “Losing It” (nunca antes na história do Rush algo parecido tinha acontecido), o trio canadense apresenta uma canção tensa, com um ritmo pesado carregado pelos sintetizadores e o baixão de Geddy Lee, além das marcações precisas de Peart e a guitarra de Lifeson fazendo apenas acordes pesados. As inserções das vozes dos astronautas John Young e Robert Crippen dão mais tensão para a viagem que está prestes à começar, e quando a contagem começa, a nave abre sua ignição, subindo em direção ao espaço, tudo explode pela casa, com aquela sensação que deve ser ao se ver um foguete subindo. As intervenções dos teclados são tímidas, mas brilhantes, e o Rush cria (mais uma vez) uma obra representativa e fiel do que está sendo contado na letra de Peart. Baita música!


9. “Here Again” – Rush (1974)

Ah o Rush do início de carreira, tão ingênuo, mas tão bom! Era um hard inspirado nos anos hippie, em Led, Purple, a geração flower-power, e essa bela balada bluesy é uma das melhores canções da era pré-Peart, arrastada, sofrida, com Lee emulando Janis Joplin em seus melhores dias. O solo de Lifeson nessa faixa é de chorar, mostrando que sim, o Canadá é capaz de parir algo com alma de negro, e também que o alemãozinho era capaz de tocar qualquer estilo musical com perfeição. A interpretação vocal dolorida de Lee é de fazer arrancar o coração sem anestesia, tamanha dramaticidade, ou então colocar o cabeludo debaixo dos braços como um bom amigo deve fazer nesses momentos de dor. Somente baixo, guitarra e bateria, crueza pura para um blues demolidor. Que faixa sensacional, de arrepiar em cada audição, e que pena nunca ter ganho – oficialmente – uma versão ao viva definitiva.


8. “The Necromancer” – Caress of Steel (1975)

Inspirada no personagem Sauron (do Senhor dos Anéis, e que originalmente, vejam só, se chama Mairon 🙂 ), “The Necromancer” encerra o lado A do contestado Caress of Steel. É o Rush corajoso, desafiando a gravadora para ser uma das maiores bandas progressivas de todos os tempos, e tudo começou aqui. A faixa é uma espécie de seguimento à “By-Tor & The Snow Dog” (outra que poderia estar nesta lista), já que é By-Tor o responsável por derrotar o Necromante, libertando os três viajantes de Willow Dale que atravessam o Rio Dawn em busca de desafios e conhecimentos, e encontram esse poderoso e maléfico ser, trazendo esperanças para a humanidade. Repleta de metáforas para as lutas diárias do ser humano, e de como lidar com os medos e opressões (sociais, pessoais ou existenciais, cada uma, um viajante), musicalmente ela começa com a narração que nos introduz à história, com a guitarra ao fundo. Impossível não viajar junto com os personagens sob a escuridão (ouça essa faixa sem nenhuma luz e arrepie-se), com um crescendo onde a guitarra de Lifeson é o principal instrumento na primeira parte da canção, com belos solos e efeitos. A voz aguda de Lee dá mais dramaticidade para a faixa, que arrasta-se pelas caixas de som junto com o andar dos viajantes. Na segunda parte, há o peso descomunal da força do Necromante sobre os viajantes, com mais um espetáculo de solo por Lifeson. E por fim, a batalha entre By-Tor e o Necromante na terceira parte é um orgasmo sonoro, onde Lifeson está endiabrado, e a cozinha Lee/Peart animalesca. Que puta solo, que performance sensacional de Peart, que espetáculo sonoro, fechando a paz trazida pela vitória de By-Tor com o violão e o andamento suave de um solo mais melodioso por Lifeson. Genial! Adoro o Caress of Steel, e poderia também ter inserido aqui “The Fountain of Lamneth”, mas é que “The Necromancer”, para mim, tem todo o charme de ser a primeira música realmente prog do Rush, levando o ouvinte a mergulhar no que está sendo contado. Gostaria de ouvir ela ao vivo em uma edição decente (quem sabe Lee e Lifeson encontrem algo em seus porões da época deste disco e presenteie os fãs em breve?)


7. “Natural Science” – Permanent Waves (1980)

Quando ouvi o Permanent Waves pela primeira vez, era fácil para mim identificar “Spirit of Radio”, faixa que abria o jornal local aqui no Rio Grande do Sul (o famoso Jornal do Almoço). Ao longo do disco porém, um dos primeiros do Rush que ouvi na íntegra, conheci duas faixas primorosas: “Jacob’s Ladder” e “Natural Science”, e entre as duas, é muito complexo dizer qual a que gosto mais. “Natural Science” me pega por diversas coisas que há nela. O barulho da água no início, a levada gostosa do violão em acordes com nona, o trecho intrincado, mas extremamente simples, entre baixo, guitarra e bateria, a passagem alegre do solo de Lifeson, a agressividade que Peart espanca seu kit, a melodia vocal, uma letra complexa e fantástica, explorando as interações entre natureza e ciência, porra, a faixa é perfeita. Sétimo lugar talvez não seja a posição apropriada, mas sério, até 1980, quase tudo o que o Rush criou foi nota 10.


6. “Jacob’s Ladder” – Exit … Stage Left (1980)

Faixa que me tira do prumo é esta aqui. Cara, eu e meu irmão Micael Machado adorávamos “viajar” que entrava um robozinho no palco cantando o trecho “All at once the clouds are parted / Light streams down in bright unbroken beams“, ou brincar de Geddy Lee tocando teclados com os pés como se o teclado estivesse sobre a escrivaninha do escritório do nosso pai (jamais imaginaríamos que o teclado de pé na verdade era um Moog Bass Pedal no chão mesmo, só Humberto Gessinger que veio nos ensinar isso anos depois). “Jacob’s Ladder” é a síntese perfeita do que o Rush consegue fazer ao transformar em música uma história como afirmei em “The Necromancer”, e que me faz (ainda mais) fã da banda. Inspirada no fenômeno meteorológico onde a luz do sol passa através das nuvens, e que virou a passagem bíblica que dá nome a canção, na qual a escada surge do céu para trazer a palavra de Deus à Jacó, prometendo-lhe terra e bênçãos, a canção surge como um quadro em branco para o Rush criar sua própria pintura interpretativa do fenômeno. O clima tenso do início da canção, com seu ritmo marcial, é mantido durante um dos melhores solos de Lifeson, onde ele emprega notas rápidas e muitos bends, sobre camadas de teclados. As marcações que levam para a “abertura do céu” são chocantes e arrepiantes, assim como o trecho da frase citada acima. Mas é a formação da escada, musicalmente falando, que me arrepia até quando escrevo. Cada nota da guitarra, cada batida da bateria, cada passagem dos sintetizadores, vão servindo como uma pincelada sonora dos degraus que constituem a escada, até que ela chega ao chão em uma explosão literalmente divina. Que fantástico, que emocionante, que incrível. Puro suco da beleza de se ouvir Rush e entender o que a música é capaz de fazer, e que coloco a versão de Exit … Stage Left aqui primeiro, por ser muito fiel à versão de estúdio, com Lee abusando do uso do Moog Bass Pedal, devendo ser complicadíssimo fazer a marcação do baixo e o moog ao mesmo tempo ao vivo, mas também por trazer aquela introdução engraçadinha com “Ebb Tide”.


5. “The Camera Eye” – Moving Pictures (1981)

A faixa que narra as lembranças de Peart por Nova Iorque e Londres é a última faixa longa da história do Rush. Com mais de dez minutos, “The Camera Eye” entra no Top 5 por conta da sua simplicidade gigantesca. A canção é extremamente simples, não há acordes difíceis ou peças intrincadas, nem uma invencionice que só Peart conseguiria tocar, ou mesmo alguma voz aguda de Lee impossível de ser reproduzida. O Rush foi “franciscano” em termos de técnica, mas entrega uma canção linda, que passeia por ambas as cidades mostrando as similaridades de duas gigantes mundiais. O solo de Lifeson é tímido, sem nenhum exagero, mas contagiante. E cara, como não se empolgar com os caras parecendo brincar no estúdio, mas saindo com uma energia fulminante através das caixas de som. Quinto lugar para ela.


4. “2112” – 2112 (1976)

O Rush é perito, ao longo de sua trajetória, em criar faixas que dariam bons filmes, e talvez o melhor deles seria um baseado em “2112”. O que muitos interpretam como uma faixa em alusão ao comunismo, na qual o personagem central se revolta pelo controle dos Sacerdotes do Templo de Syrinx, também pode ser interpretado como uma questão de crítica ao comunismo, no qual não se deve ter uma relação de igualdade entre as pessoas. Independente da interpretação a ser dada (Peart nunca confirmou nenhuma das versões), musicalmente a faixa-título do álbum de 1976 é impecável. A abertura, com seu pulsante e longo instrumental, por si só já é uma canção primorosa, junto da feroz “Temple of Syrinx”. Mas todo o trabalho vocal de Lee fazendo as partes ora do personagem central, ora dos sacerdotes, os trechos no qual Lifeson descobre a guitarra escondida na caverna e começa a aprender a tocar, com barulhos d’água ao fundo, ou mesmo seus solos repletos de velocidade, com ótimo controle do wah-wah, e Peart demolindo no trecho final, além de ser uma música que vai acompanhando/criando a história, tornando-a de fácil compreensão, bah, é de arrepiar. Quarto lugar talvez seja pouco, mas é que o pódio será ocupado por duas faixas incríveis (que talvez sejam uma só?).


3. “La Villa Strangiato” – Hemispheres (1978)

Alguém pode dizer que “YYZ” deveria estar aqui, mas para mim, a melhor instrumental do Rush é “La Villa Strangiato”. Se não vejamos. Quem é o principal músico desta canção? Sim, é Alex Lifeson. Ele começa com um arpejo flamenco incrível, demole notas velozes e arranca uivos de sua guitarra durante seus solos, além de fazer maravilhas com o botão de volume. Mas, e sempre há um mas, tente entender (reproduzir é impossível) o que Lee faz no baixo durante a sessão jazzy desta canção (“The Ghost of the Aragon”). Ou ainda, tente tocar um air drum sem errar uma batida inventada por Peart ao longo de toda a faixa, principalmente no trecho central (batizado “A Lerxst in Wonderland”), nesta que talvez seja sua melhor performance. São doze partes em 9 minutos e 37 segundos, ou seja, muitas variações em pouco tempo, e é incrível que esses três conseguiam reproduzir fielmente essa faixa complicadíssima ao vivo. Terceiro lugar fácil, e comentei mais sobre ela aqui.


2. “Cygnus X-1 Book One: The Voyage” – A Farewell To Kings (1977)

É até injusto separar as duas partes de “Cygnus X-1”, mas, já que cada uma está em um disco, então, aqui estão elas (pronto, antecipei o primeiro lugar). Como professor de Física, Mestre em Física de Partículas e Doutor em Ciências na área de Física Teórica, é impossível eu não adorar essa música. A história da viagem no espaço de um astronauta que é capturado por um buraco negro (a primeira parte) é uma das grandes dúvidas da Relatividade Geral (o que há dentro de um buraco negro?), e o Rush cria musicalmente uma obra sensacional, que entrega desde o contato da nave com a torre de controle, a alegria de quem está viajando tranquilo pelo espaço e de repente, vê sua nave entrar em colapso sem saber o que está acontecendo. Uma canção sensacional, com todo o crescendo contando a história, efeitos musicais diversos, uma guitarra pesada, Lee rasgando a voz (atingindo um dos maiores agudos da história da música) e Peart simplesmente sendo Peart. É o aperfeiçoamento do que fôra criado em “The Necromancer”. Fora as “pistas musicais” deixadas para a parte II, que eu adoro demais. Para colocar na agulha e viajar pelo espaço!


1. “Cygnus X-1 Book Two: Hemispheres” – Hemispheres (1978)

O encerramento da história de Book One, na qual o nosso protagonista acaba viajando no tempo, ao entrar no buraco negro, e volta nos dias remotos onde os deuses gregos construíam a Terra, com a razão (Apolo) e o amor (Dionísio) brigando entre si para controlar os humanos, até que chega o nosso herói do futuro, e é batizado com o nome do Deus do Equilíbrio, Cygnus. Novamente, agora como um admirador da cultura grega, porra, como não amar essa música? Cara, que história fantástica, e como que o Rush conseguiu encaixar tudo perfeitamente. Musicalmente, acho que Lifeson novamente é o cara, com solos fantásticos, importantes acordes para construir cada trecho da história, mas claro, Lee e Peart dão seus espetáculos particulares. Como disse acima, adoro quando as “pistas musicais” se revelam aqui, ou seja, trechos da Book One que retornam na Book Two para configurar a conjunção temporal das duas canções (ou épocas distintas). Difícil para mim dizer qual das seis partes deste Book Two gosto mais, pois cada trecho musical é um reflexo fiel ao que está sendo narrado, mas afirmo que a mensagem final, na curta “The Sphere”, deveria ser levada para todos os líderes mundiais. Que faixa!

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