A Young Person’s Guide To: Pink Floyd

Por Marcelo Freire
Como pode conferir na primeira postagem dessa coluna, esse nosso A Young Person’s Guide representa uma curadoria idiossincrática para uma coletânea imaginária do artista escolhido, tal qual Fripp fez com a sua banda e como fazíamos, no século passado, quando tínhamos apenas uma fita cassete e vários discos para escolhermos as que mais gostávamos e que coubessem ali naqueles 60 minutos, 30 de cada lado. Considerando que o Pink Floyd tem músicas mais extensas do que o Robin Trower (homenageado na estreia dessa coluna), a fita cassete que usarei será de 90 minutos, e não a costumeira de 60 minutos. Como no álbum do King Crimson há 15 músicas, aqui escolhemos 14 músicas, 7 de cada lado, e uma faixa escondida (que, na capinha da fita K7, não vem escrita, às vezes rolava isso).
LADO A
1. “Echoes” – Meddle (1971)
Eu não sei definir o Pink Floyd, já vou logo avisando. Rock espacial? Progressivo? Hard rock? Psicodélico? Eu costumo chama-los de rock and roll, embora veja todas essas definições como adequadas a eles, sobretudo a de uma banda de rock progressivo. E qualquer guia, lista ou mesmo coletânea da banda jamais poderia vir sem alguma de suas famosas suítes viajantes e, em nossa K7, esse mérito fica com a melhor de todas: os 23 minutos e 34 segundos de “Echoes”. Embora ela seja creditada à banda, a música é de Richard Wright e David Gilmour e a letra de Roger Waters. E que letra! A canção transcende a simples composição musical, mergulhando em uma profunda exploração da condição humana, utilizando a vastidão do mar e a imagem de uma ave solitária para ilustrar a alienação e, ao mesmo tempo, o anseio por comunhão entre as pessoas (temas caros ao baixista). Waters constrói uma narrativa que se move entre a escuridão abissal do isolamento e a possibilidade de um encontro genuíno. O verso “E eu sou você e o que vejo sou eu” funciona como o epicentro dessa ideia, sugerindo que o reconhecimento do outro como um espelho de si mesmo é o caminho para superar as barreiras do individualismo. A sonoridade da faixa, com seus efeitos de sonar e cânticos de baleia, cria uma atmosfera de introspecção e mistério. A letra reflete esse movimento interno, evoluindo de uma inércia para uma ascensão em busca de propósito nos versos “Mas alguma coisa agita-se e / Algo tenta / E começa a escalar para a luz”. O clímax da mensagem é alcançado com os versos “Então eu escancaro as janelas / e chamo você através do céu“, que simbolizam a decisão de se abrir para o mundo e romper com o confinamento pessoal. Meditação sobre a solidão e a esperança de encontrar um ponto de união com os outros, “Echoes” tem nas peças interligadas (a faixa foi criada a partir de uma variedade de temas e ideias musicais diferentes, incluindo passagens instrumentais, efeitos de estúdio e sobras de gravações anteriores) um passeio sonoro que estabeleceu o Pink Floyd como a banda a ser batida pelos roqueiros progressivos, já que os ingleses fugiam do óbvio. Obrigatória.

2. “High Hopes” – The Division Bell (1994)
Você já viu o videoclipe dessa música? Faça-o agora. É lindíssimo e faz jus ao último clássico gravado pela banda. Se esta lista fosse a de minhas músicas favoritas, certamente “High Hopes” poderia ser pódio fácil, fácil. A beleza dessa faixa está no sujeito que é a alma sonora do Pink Floyd: David Gilmour. Dave Mustaine disse certa vez que, com uma única nota, Gilmour faz muito mais do que outros guitarristas com o braço inteiro da guitarra. Eu concordo. Versos como “A Grama era mais verde / As luzes mais brilhantes / Com os amigos ao redor / As noites eram maravilhosa”, ao som de seu solo, nos conduzem a um passado idílico em que éramos mais felizes, sem dúvida. Onde fica esse passado? Difícil saber… Ele começa cantando que “Além do horizonte do lugar em que vivemos / quando éramos jovens”. Saudosismo em forma de escapismo no tempo? Ao que parece, sim, e essa faixa te faz viajar lindamente para esse lugar por um instrumental que é David Gilmour/Pink Floyd puríssimo. Eu poderia colocar quase todas as faixas de The Division Bell neste guia, pois trata-se de um belíssimo álbum, não desperdice seu tempo sem ouvi-lo mais do que o ouve, pois tenho certeza de que até os mais ferrenhos fãs de Pink Floyd o deixam de lado.
3. “Sorrow” – A Momentary Lapse of Reason (1987)
Ok, “High Hopes” é uma baita canção, mas ela é muito mais David Gilmour do que Pink Floyd, daria para encontrá-la tranquilamente em algum dos álbuns solos do guitarrista; “Sorrow”, não. Ela aponta para frente, para a lenha que o trio restante ainda tinha para queimar e, caso Waters ainda fizesse parte da banda, certamente tocaria e cantaria nele, diferentemente de “High Hopes”. Lembro-me de que todas as vezes em que colocava o LP para tocar (The Division Bell eu já não encontrei em LP, à venda só vieram os CD’s) ansiava pelo que eles ainda viriam a gravar. E o que dizer da guitarra afiada de Gilmour nessa canção? E a letra?! “O doce cheiro de uma grande tristeza escorre pelo ar / Colunas de fumaças sobem e unem-se no céu cinzento / Um homem deita e sonha com campos verdejantes e rios / Mas desperta desmotivado para uma manhã inútil / Ele é assombrado pela lembrança de um paraíso perdido / Não sabe se está na sua juventude ou nos seus sonhos / Ele está preso para sempre a um mundo que já se foi / Não é o bastante, não é o bastante”. Convido a quem quiser a pensar nesse homem que desperta desmotivado… Vejam que é um passeio por várias outras músicas do Floyd. Bateria marcial impecável de Nick Mason e discretos teclados de Rick Wright mantém a pancada dessa música que poderia, tranquilamente, ser uma sobra de estúdio de Animals, The Wall ou mesmo do razoável The Final Cut.
4. “When You’re In” – Obscured by Clouds (1972)
Só o Pink Floyd poderia lançar este álbum de forma tão casual e depois deixa-lo de lado! Metade das bandas dos anos 70 dariam qualquer coisa por esse punhado de pérolas! Quem deixa de lado coisas maravilhosas como “Burning Bridges”? A faixa de abertura já seria um grande feito para bandas típicas de rock progressivo, mas seleciono “When You’re In”, pesada, sem vocais, teclado magistral, um rockão dos bons, como exemplo de banda que tem tanta, mas tanta coisa boa, que você se espanta quando vai tirar a poeira daqueles discos que raramente ouve (daí este Guia)… Experimente tocá-la para aquele seu amigo fã de um bom hardão, que não a conheça, e dê 3 tentativas para que ele adivinhe quem compôs essa pedrada – Pink Floyd, certamente, não será uma opção.

5. “One of These Days” – Meddle (1971)
Se um dia precisar apresentar o que o Pink Floyd tem de original, único e inimitável, coloque “One of These Days” para tocar. Pesada, esquisita, misteriosa, psicodélica, progressiva (percebem como é difícil definir o som da banda?). A força criativa instrumental desses caras era de outro mundo – em que outro disco de qualquer outra banda ouviríamos essa abertura de LP? Sim, porque se você não sabe o que era conceitualmente o LP na cabeça desses caras (e de quem viveu essa época), desista: estará apenas criando listas de Spotify… 1971 era outro mundo e quem voltava da loja de discos com esse álbum de capa estranha e o colocava para tocar na agulha já se arrepiava todo com “One of These Days”.
6. “A Pillow of Winds” – Meddle (1971)
Essa é a música mais linda do Pink Floyd e ninguém consegue me convencer do contrário. Propositalmente, reproduzi aqui o que ocorre no Meddle: “One of These Days” é a 1ª faixa e esta, a segunda. Não dei pause no REC e deixei rolar aqui no K7 a gravação (se você tem menos de 40 anos, nem sabe o que eu quis dizer…). Da mesma safra de “Grantchester Meadows” (outra obra-prima inclassificável), “A Pillow of Winds” era tudo o que um jovem roqueiro gostaria de ter em sua arcádia pessoal: um tema pastoral psicodélico e viajante de uma delicadeza tão intensa quanto os temas progressivos mais extensos do Floyd. No entanto, diferentemente de “Grantchester Meadows”, nesta canção há uma tensão dessas que precedem a chuva… Ouvimos na expectativa de que haja uma virada rítmica, uma pancada chegando, sobretudo quando Nick Mason aparece – mas aí entendemos que ela não é de antes de uma tempestade, e sim de depois. Ouça-a no escuro de seu quarto e viaje nos vocais duplos de David Gilmour, que são, depois de Lennon e McCartney cantando juntos na década anterior, o que há de mais agradável de se ouvir nesses tempos ali pelo início dos anos 70… Há um mistério nessa faixa, um mistério onírico, que os versos apenas intensificam: “Uma nuvem de edredom / Desenha-se ao meu redor / Suavizando o som. / Momento sonolento, e eu me deito, / Com meu amor ao meu lado, / E ela está respirando baixinho. // E a vela acaba. // Quando cai noite / Você tranca a porta. / O livro cai no chão. / À medida que a escuridão cai / As ondas rolam, / As estações mudam / O vento é torto. // Agora a coruja acorda / Agora o cisne dorme / Contemple o sonho / O sonho se acabou. / Campos verdes, uma fria chuva / cai, próximo ao dourado pôr do sol. // E nas profundezas da terra, / Os sons do início da manhã, / E eu ascendo, como um pássaro, / Na neblina, quando os primeiros raios / Tocam o céu. / E os ventos da noite morrem.” Que viagem, bicho! Ah, a natureza…É difícil ouvir esta canção bucólica em plena cidade: Pink Floyd, aqui, é uma viagem pastoril. E sabe de quem é a música? Sim, David Gilmour (com letra de Waters).
7. “Childhood’s End” – Obscured by Clouds (1972)
A última faixa do lado A é outro tesouro escondido no belíssimo Obscured by Clouds (ainda não o tem na sua coleção?!): “Childhood’s End” entraria em qualquer lançamento do Floyd daí em diante, qualquer um, até mesmo nos discos sem Roger Waters! Se você é um floydmaníaco, sabe que os timbres, os sons, a letra, os vocais, bateria, baixo, teclados, tudo nessa canção está nas músicas do The Dark Side of the Moon (lançado 9 meses depois) em diante. Rock pesado, harmônico, bem gravado e gostosíssimo de se ouvir na estrada, vai por mim.

LADO B
1. “Grantchester Meadows” – Ummagumma (1969)
A pureza acústica dessa música é um oásis não somente no disco, mas na discografia inteira do Pink Floyd. Campestre até o talo, essa caminhada de Grantchester to Cambridge está na lista de coisas que quero fazer depois de aposentar e antes de morrer (aliás, é perto de onde David Gilmour morava na época). Eu não consigo pensar em nenhuma outra canção de algum grupo de rock que seja tão atemporal quanto essa – ela tem 56 anos em 2025, mas poderia ter tranquilamente 100 anos ou mesmo ter sido lançada ontem no Spotfy. A letra é psicodelia, viagem e bucolismo em grau máximo, é uma pena que essa canção dure somente 7 minutos e 27 segundos. “No prado de água preguiçosa, eu me deito. / Ao meu redor, centelhas douradas do sol / Fixam-se no chão. / Relaxando sob o sol de uma tarde antiga, / Trazendo sons de ontem / Para este espaço da cidade.”. Sempre que a ouço, sou transportado para algum campo sem pessoas, tal qual a letra fala e os sons demonstram – tem barulhos de patos, de passarinhos e de água de lagoa na música! Se “Shine on you Crazy Diamond” é a 9ª sinfonia de Beethoven, “Grantchester Meadows” é a 6ª, a pastoral. Para quem, como eu, curte versões, há algumas bem bonitas no YouTube. Dá para imaginar que esses dois gênios que, em dado momento, cantam suavemente juntos nesta música, iriam se afastar e brigar para ficarem o resto da vida sem se falar? Essa belezura é, letra e música, de Waters (se Gilmour tem os méritos por “A Pillow of Winds”, aqui Roger Waters dá show). No Ummagumma, cada um dos 4 ficou com uma metade de lado de LP, então Waters faz tudo sozinho por aqui e convida Gilmour para cantar junto. Vocês conhecem Tír na Nóg? Sempre os ouço depois que coloco essa no toca-discos, vão atrás e me digam o que acham. Muito antes de o Pink Floyd se tornar Pink Floyd, eles realmente já eram Pink Floyd.
2. “Young Lust” – The Wall (1979)
Eu tenho uma tese: quase sempre, o que achamos ser um “grupo” é, na verdade, uma “equipe”. A ideia romântica de que os caras de uma banda são aqueles melhores amigos da adolescência que se juntaram e vivem felizes fazendo o que gostam é verdadeira, talvez, em 2% das bandas de rock. No dia em que souber que os músicos do Iron Maiden mal se falam e vão para os shows cada um em sua limusine, saindo cada qual de seu quarto de hotel – às vezes, nem no mesmo hotel, ficará frustrado… Metallica é cada um em seu canto. Quem mandava e organizava tudo nos Secos e Molhados era o João Ricardo. Led Zeppelin? Os 3 eram contratados do Jimmy Page! Depois que gravavam o que ele mandava, iam embora para beber, fumar, curtir a vida, e o guitarrista ficava lá no estúdio, dias e noites, montando as músicas. Pois bem: nessa tese, considero que, em muitas bandas, o som que achamos ser orgânico e comunitário é, na verdade, responsabilidade/mérito, principalmente de um dos músicos. Obviamente que não se pode desprezar os demais, por isso que esses caras, então, montavam… Uma banda. Ian Anderson é maravilhoso e o Jethro Tull é dele, mas veja como ele não funciona sem a banda… O caso dos Beatles é emblemático: Ringo Starr é muito bom, um dos grandes bateristas do rock and roll (pergunte a quem entende de bateria, saco você discorde do que digo…), Geroge Harrison é excelente, John Lennon é gênio e Paul McCartney é o Beethoven do rock, mas nenhum deles chegou perto, em suas carreiras solo, das maravilhas que fizeram juntos; sendo assim, é inegável reconhecer o mérito no som da banda de Paul McCartney, basta ver o que fez depois da dissolução do grupo. Em outras palavras: ouvir o que os artistas fazem em suas carreiras solo nos dá um bom parâmetro disso tudo. Alice in Chains? Esqueça o incrível Layne Staley, o som da banda é do Jerry Cantrell. Pink Floyd? O som do quarteto é de um cara chamado David Gilmour. Roger Waters é ótimo, claro, mas não chega aos pés do guitarrista, que orientava tudo em termos de som, mostrando, inclusive, como Waters deveria tocar em alguns casos, chegando ao ponto de afinar, muitas vezes, o baixo do colega! Posto tudo isso, temos a poderosíssima “Young Lust”, um dos pontos altos da obra-prima The Wall. Aqui temos uma canção de hard rock com influências de blues, com aproximadamente 3 minutos e 25 segundos intensos de duração. A canção é uma das três músicas que foram compostas por David Gilmour para o álbum (a letra é de Roger Waters), as outras duas são “Confortably numb” (a melhor do álbum e uma das três melhores músicas do quarteto) e a também ótima “Run like hell”. Em “Young lust”, Gilmour não só canta como, inclusive, toca o baixo, pois Waters não acertava tocar o que ele tinha composto, deixando para Waters apenas os backing vocals durante o refrão. Depois de The Wall, Waters foi para o The Final Cut (Pink Floyd é só no nome) e Gilmour foi para o A Momentary Lapse of Reason (Pink Floyd não é só no nome). Ouça, na sequência de “Young lust” as faixas de A Momentary Lapse of Reason, sem pausas e sem pular nenhuma, e me diga de quem é afinal o som que a banda fazia.

3. “Arnold Layne” – Relics (1967)
Eu ia colocar “Lucifer Sam” neste lado B, já tinha até escrito o texto, mas decidi trocar sei lá por quê – e acho que posso me arrepender, mas enfim, o solo de Richard Wrigth nessa música é de outro planeta! Aliás, o trabalho de teclado dele aqui é a alma da coisa. Certeza de que Eric Burdon era audição diária do Syd Barrett, essa música comprova isso. Quer coisa mais Barrett do que essa letra? Esse vocal dele e essa levada psicodélica? Nunca usei drogas, mas tenho certeza de que as pesadas são necessárias para essas viagens do fundador da banda… Eu sei exatamente o caminho de cada LP do Pink Floyd na minha estante: comecei com The Wall, pedido a um tio de presente depois de meu professor de história no colégio ter nos colocado para ver o filme numa TV com videocassete na sala de aula no longínquo 1989. Depois, obviamente, entendei que já conhecia a banda porque minha mãe tinha o The Dark Side of the Moon em casa. Daí, comprei anos depois o The Final Cut e o Animals de uma lapada só – e me arrependi de ter jogado dinheiro fora no disco do Waters com o nome da banda. Hoje, até gosto de 2 músicas dele. Na sequência, vieram Meddle, Obscured by Clouds, Atom Heart Mother e só então descobri o Syd Barrett… Comprei primeiro o Relics e, meses depois, o The Piper at the Gates of Down. Curto demais a fase dele, mas ouço-os em temporadas: mais do Obscured até The Wall e, quando mudo, os discos sem o Waters… O Pink Floyd com Syd Barrett era, das bandas da época, uma das melhores, mas tinha tanta coisa boa rolando… Eram geniais, mas as ideias desenvolvidas já a partir do A saucerful of Secrets e More não são mais dele – podem até ser a partir dele, mas ali já tem o estilo inconfundível do Gilmour e a angústia criativa do Waters, que, com Barrett, não tinha e muito menos teria espaço nem vez. Enfim, “Arnold Layne” é a pepita dessa época, explica o Pink Floyd safra 1967 com perfeição e é uma canção excelente!
4. “Comfortably Numb” – The Wall (1979)
Eu sei a letra dessa música inteira, de trás para frente, traduzindo simultaneamente, canto igualzinho tanto as partes do Roger Waters quanto as do David Gilmour. Essa foi a última música que compuseram juntos nos tempos de Floyd (e creio que para sempre). Embora Gilmour diga que a letra é de Waters e a música dele, já li tantas entrevistas acerca disso que não sei o que pensar. Quando estou bêbado, canto essa música; na pandemia, comprei uma caixa de som, um microfone e todo santo dia, na quarentena, colocava essa música para tocar na varanda – primeiro deixava eles cantarem, depois colocava uma versão ao vivo e eu mesmo cantava. Sou de uma geração em que os professores de História colocavam esse filme nas aulas (meu primeiro contato com Pink Floyd foi assistindo The Wall na escola, minha porta de entrada para o quarteto foi audiovisual). Essa é a música mais linda do Pink Floyd (sim, eu sei que falei isso de “A Pillow of Winds”, mas o que posso fazer se eles têm as duas?). “Comfortably Numb” tem a melhor letra de Waters e o melhor solo de Gilmour – é a mais bela parceria de ambos, o momento Lennon/McCartney deles.
5. “Speak to Me” / “Breathe” – The Dark Side of the Moon (1973)
Deixa-me contar uma coisa aos que estão há menos tempo no planeta: de 1973 até o início dos anos 90, todo mundo tinha esse disco em casa. Todo mundo. Os sons desse álbum estão na memória afetiva de (por enquanto) alguns bons milhares de pessoas no planeta. Posto isso, depois de ouvir umas batidas do coração, uns sons esquisitos de máquina-registradora, vozes de pessoas conversando, umas risadas e um barulho que parece dessas máquinas colheitadeiras – e me assustar com um grito de mulher –, ao ouvir uma levada suave e etérea de uma bateria macia, baixo, teclados e guitarra em harmonia cósmica e os versos “Breathe, breathe in the air / Don’t be afraid to care / Leave, but don’t leave me / Look around Choose your own ground” eu tenho a certeza de que, se o céu existe, essa é trilha sonora do paraíso. Roger Waters é excepcional, mas David Gilmour é Deus. Quem canta e toca como ele?! No meu LP, as duas faixas são unidas por um acorde de piano sustentado, então eu nunca as entendi como coisas distintas, portanto ambas estão aqui.
6. “Shine on you Crazy Diamond (partes I-V)” e “Shine on you Crazy Diamond (partes VI-IX)” – Wish You Were Here (1975)
Os mais jovens não sabem o que é um álbum conceitual. Aliás, não sabem o que é um álbum. Quando coloquei pela primeira vez a agulha no LP que tenho até hoje e me preparei para ouvi-lo (os jovens de hoje não sabem o que é preparar-se, sentar-se e ouvir a um disco), eu não sabia sequer entender as emoções que me tomaram naqueles mágicos oito minutos e trinta segundos que antecedem a letra… Eu não sabia nem como ouvir aquela guitarra, aqueles teclados! Quando ela termina, surge um som de uma porta se abrindo e começa “Welcome to the Machine”, eu levanto-me e volto a agulha para o início de “Shine on you Crazy Diamond”. Eu devo ter feito isso umas 7, 8 vezes, até ler no encarte que tinha a outra parte, e naquela tarde mágica de um sábado, ouvi a segunda parte mais umas 10 vezes e, já de noite, meus amigos todos estavam lá em casa com fitas cassetes para gravarem aquela obra-prima. Ouvimos o disco inteiro umas 3 vezes e, já na madrugada, depois de todos terem ido embora, eu não me recordava de absolutamente mais nada (e olha que estamos falando de “Welcome to the Machine”, “Have a Cigar” e “Wish You Were Here”!!) e, no silêncio da madrugada, fui ouvir mais algumas vezes as duas partes dessa sinfonia… Ouvia, levantava-me, trocava o lado, colocava na faixa final e ouvia… Não sei comentar essa música, sei apenas que triste é a vida de quem não a ouve, ao menos, uma vez por semana, tal qual a 9ª sinfonia de Beethoven. São músicas que definem o que é o humano. O álbum inteiro é primoroso, mas o destaque está aí.

7. “Marooned” – The Division Bell (1994)
Essa é a música mais subestimada do Pink Floyd e, coincidentemente, a única da banda a ganhar um Grammy. Ela é de David Gilmour e Richard Wright e foi composta numa jam session a bordo do famoso Astoria no início de 1993. Coloquei-a como a última faixa porque os sons de guitarra trazem uma reminiscência da música “Echoes”, a primeira que ouvimos nesta seleção. Gilmour declarou que a música gravada é, praticamente, toda improvisada e que ele provavelmente fez três ou quatro tentativas e tirou as melhores partes de cada uma. Wright também disse que essa foi a primeira música a ser mixada para The Division Bell. O clipe dela é igualmente lindo, sugiro que o vejam. Nos comentários dele no YouTube, o usuário identificado como @gremmkiins, há 5 anos, postou que “O Pink Floyd enviou mais pessoas ao espaço que a NASA”. Que desgraçado, como eu queria ter escrito essa frase! Apenas ouça a música e me diga se ele não tem razão. Ela não possui letra, mas com a guitarra de Gilmour, que precisa de vocais? Se você é daqueles roqueiros que acham que os melhores guitarristas são os mais velozes em suas notas e acordes, um minuto de silêncio para você. E se você é daqueles fãs do Pink Floyd que acham que, sem Waters, a banda não presta, dois minutos de silêncio para você. Gilmour é supremo. Se Jimi Hendrix é Zeus, o pai de todos, o que empunha a guitarra e rege o céu – não há como negar seu trono – e Robin Trower é Apolo, um ser divino de pura excelência técnica, David Gilmour é Hefesto, o artífice, o ferreiro divino dos sons celestiais, sejam eles pesados, sejam eles leves… Quando terminar de ouvi-la, ponha para tocar “Louder Than Words”, do álbum desprezado por muitos (porém não deste que vos escreve) The Endless River, e chore comigo toda vez em que Rick diz adeus. Se você nasceu na Terra e não se arrepia com o Pink Floyd, você viveu errado a vida toda, ainda dá tempo de consertar isso, comece a viver outra vida a partir desta faixa escondida no fim do lado B deste guia.
Seria uma ótima coletânea. Mas mostrar isso apra algum amigo e não colocar alguns dos clássicos talvez ele fique bravo depois…rs
A minha música preferida do Pink Floyd é Echoes. Vc falou da voz “dupla” do David Gilmour, mas o que tinha de melhor nos vocais do Pink Floyd eram as dobradinhas com ele e o Richard Wright,