Datas Especiais: 20 Anos do Rush Em Porto Alegre

Datas Especiais: 20 Anos do Rush Em Porto Alegre

 

Jornal local comentando sobre o show de 20 anos atrás

Por Micael Machado

Exatamente vinte anos atrás, em uma chuvosa noite de 20 de novembro de 2002, o trio canadense Rush se apresentava pela primeira vez no Brasil. E não, não foi no hoje famoso concerto do Rio De Janeiro que rendeu o DVD Rush In Rio pouco tempo depois, mas sim no hoje dilapidado Estádio Olímpico, na cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Mesmo passado tanto tempo, tenho certeza de que aquela tarde/noite de quarta feira permanece marcada na memória da maioria das 35 mil pessoas que estavam lá, fazendo história junto com a banda em terras gaúchas.

Lembro que, para mim, foi o mesmo que a realização de um sonho. Eu uma época pré-internet, onde a maioria das informações sobre música chegava até mim através, basicamente, das revistas Bizz (depois ShowBizz) e Rock Brigade, em 2002 eu já curtia o Rush há pelo menos 12 ou 13 anos, desde que um amigo conseguiu a discografia inteira da banda (na época, até o álbum Presto) com alguém, com a promessa de devolver os discos no dia seguinte àquele em que os havia pego, o que me fez passar boa parte de uma madrugada e uma manhã e tarde inteiras de 1989 ou 1990 gravando os discos em fitas K7 sem nem mesmo ouvi-los antes, indo “curtir” e “entender” os mesmos a partir das fitinhas, nos dias subsequentes (experiência que, até hoje, me faz ter um pouco de medo da introdução de “Witch Hunt”, faixa do disco Moving Pictures, depois de ouvi-la pela primeira vez às quatro da madrugada, nos fones de ouvido, num quarto escuro, com meu irmão dormindo ao lado e minha família em seus respectivos quartos, enquanto tentava manter o meu silêncio para não acordá-los, mesmo tendo experiências sonoras fascinantes à medida que a agulha percorria os sulcos de cada LP que ia para o toca discos… bons tempos…).

Na verdade, eu já conhecia algo do grupo desde meados da década de 1980, quando “Spirit Of Radio” era tema do noticiário da TV estadual que passava na hora do almoço (e que, ainda hoje, se chama “Jornal do Almoço”), e, por isso, tocava bastante na rádio FM (e eu, que ouvia a música sem saber nada da banda, achava muito estranho o timbre de voz da “cantora” da banda… outros tempos)… e, claro, havia “Tom Sawyer”, que era tema do seriado do MacGyver, que eu assistia religiosamente na TV nas sessões vespertinas da Rede Globo… Quando, anos depois disso tudo, os shows dos canadenses no Brasil foram anunciados, eu já tinha, não lembro como, o CD do Vapor Trails, álbum que a banda estava divulgando à época, e sabia que Peart havia passado por todos os problemas pessoais que hoje conhecemos bem, e que forçaram a banda a uma parada de quase seis anos, a qual quase acabou com a mesma. Sendo assim, a possibilidade de assistir ao vivo a uma banda tão importante para mim, já naquela época, era algo inimaginável, mas estava perto de acontecer.

Um pouco mais do show na visão de um jornal local à época

Não lembro muito das horas que antecederam o show, mas lembro de ir ao estádio (que é muito perto de onde moro ainda hoje) e encontrar alguns amigos que haviam vindo do interior junto com meu irmão, e outras pessoas que estavam junto com eles. Juro que foi a primeira vez que vi alguém pronunciar “uái uái zí” para se referir a “YYZ” (que, para mim, sempre havia sido “ípsilon ípsilon zê”), e “twenty-one twelve” para se referir a “2112” (que, obviamente, eu sempre havia chamado de “dois mil cento e doze”), mesmo que meus conhecimentos de inglês não fossem tão limitados assim à época. Outra dúvida pertinente entre o pessoal era a pronúncia do sobrenome do baterista: seria “Pírt” ou “Pãrt”? Lembro também que a expectativa de todos era enorme (“Quais músicas será que vão tocar? Será que rola “Hemispheres”?), especialmente pelo solo de Peart, que, todos sabíamos de antemão, seria sensacional. Curiosamente, não lembro de ter encontrado o Mairon (que foi com sua esposa à época ao show, e ficou afastado de mim durante o mesmo, junto dela), mas sei que nos falamos antes do show, e, rapidamente, por telefone, após o mesmo…

As lembranças de momentos específicos do espetáculo também não são claras para mim… lembro mais das sensações da data… a “pista VIP”, na frente do palco, era separada da “pista comum” por uma grade muito baixa, e tinha cadeiras em sua extensão. O pessoal da VIP começou a subir nas mesmas, o que dificultou a visão para quem, como eu, estava na “pista comum”. Fora que o pessoal da “comum”, não entendendo por qual motivo estava tão “para trás”, tentava forçar a passagem à frente, talvez por não ver a grade, e espremia cada vez mais contra a mesma aqueles que estavam próximos à grade de separação, como eu. A primeira parte do show eu fiquei tão desconfortável que, no intervalo (foram quase três horas de apresentação, separadas por um intervalo de vinte minutos, como seria tradição dali para a frente nos concertos da banda, mas era algo quase inovador à época), eu me forcei a sair da minha posição e tentei ir mais para trás no gramado, mas o pessoal, aglomerado em suas posições, acabava dificultando minha passagem, mesmo que, teoricamente, eles fossem ficar mais perto do palco do que onde estavam… foi algo que achei bastante estranho na época, e me fez perder parte do vídeo de introdução da segunda parte, mas não escapar do calor do fogo “lançado” pelo dragão da animação por sobre o público das pistas no início de “One Little Victory” (quem estava lá deve saber do que estou falando)…

Foram muitos momentos de puro embasbacamento musical assistindo aqueles três gênios naquele estádio. Desde a abertura com a conhecidíssima “Tom Sawyer”, passando pelo êxtase coletivo em “YYZ” (que, ao que lembro, não teve o pessoal cantando as linhas instrumentais, como ficaria eternizado no DVD do show do Rio), minhas surpresas com as execuções de “The Trees”, “Freewill” e, principalmente, “Natural Science” (três de minhas faixas favoritas da carreira da banda, e que a falta de informações que existia à época não me fazia sequer supor que a banda fosse tocar), a minha alegria com “Driven”, que eu sempre gostei muito, mas que o pessoal parecia não conhecer direito, e, claro, o espetacular solo de bateria de Peart, ainda hoje não superado em técnica, emoção e sentimento por nenhum outro baterista que eu já tenha assistido ao vivo (quem presenciou algum show da banda em alguma turnê, sabe do que estou falando). Afinal, como alguém já escreveu, depois de presenciar um solo de Peart ao vivo, deveria ser proibido a qualquer outro baterista de rock de fazer um solo em show, sob o risco de passar vergonha perto do que este saudoso mestre fazia. Quem viu, há de concordar!

Neil Peart relaxando no antigo Estádio Olímpico, momentos antes do show de 20 anos atrás

O final do show trouxe mais momentos marcantes, com “La Villa Strangiato” (outra faixa que adoro) e “Spirit Of Radio”, que todos ali conheciam bem demais, e o bis ainda trouxe “By-Tor e Snow Dog”, a introdução da primeira parte de “Cygnus X-1” e “Working Man”, mas, confesso, não lembro bem da execução destas, ao contrário de boa parte das demais, as quais posso revisitar com frequência, graças a outro fato inusitado para aquela época: poucos dias depois do show, o dono de uma loja de discos da cidade, que eu frequentava com bastante regularidade, me informou que possuía uma gravação pirata do show, feita da plateia não sei como e não sei por quem. Era o hoje “famoso” CD Porto Alegre Trails, que muitos à época compraram, e que eu, claro, também adquiri.

O bootleg Porto Alegre Trails

Ouvindo hoje, acostumados aos recursos digitais que possuímos, a gravação pode ser considerada como “horrível”: há muito barulho de vento nas músicas, falas do público entre as mesmas, e, algo que não soube por anos (a internet foi quem me “contou”, já na década seguinte): o repertório está incompleto (faltam “Closer To The Heart”, que a banda incluiu no repertório da turnê apenas nestes shows brasileiros, ao que eu sei, a própria “Natural Science”, e todo o bis). Mesmo assim, considerando-se que, à época, não se conseguia entrar nos shows sequer com uma câmera fotográfica analógica (com filme de rolo!), o fato de alguém ter gravado, de forma relativamente decente, praticamente toda a apresentação, e ter a possibilidade de ouvir a mesma vinte anos depois com uma qualidade de certa forma aceitável, como consigo hoje, chega perto de ser surreal (não são muitos os registros de shows da época que se encontram por aí, ainda mais os acontecidos em Porto Alegre, que, já na época, não era assim tão “prioritária” em termos de rotas para shows em turnês nacionais,algo que melhorou “um pouco” atualmente).

Dois dias depois, o trio se apresentaria em São Paulo, e, no sábado, 23 de novembro, acontecia o histórico show registrado no DVD (e hoje também disponível em CD e vinil – eu tenho os três formatos). Alguns anos depois, em 10/10/2010, tive a oportunidade de assistir ao grupo mais uma vez, daquela feita no Rio de Janeiro, na turnê Time Machine Tour. Mas as circunstâncias eram completamente diferentes, e aquela primeira vez no Olímpico ficaria marcada para sempre nos presentes àquela data tão especial, mesmo vinte anos depois. E, creio eu, ainda vai ficar por muito tempo ainda!

Contracapa do CD Porto Alegre Trails

Set list:

Lembranças do show

Set 1:

Tom Sawyer

Distant Early Warning

New World Man

Roll the Bones

Earthshine

YYZ

The Pass

Bravado

The Big Money

The Trees

Freewill

Closer to the Heart

Natural Science

Set 2:

One Little Victory

Driven

Ghost Rider

Secret Touch

Dreamline

Red Sector A

Leave That Thing Alone

Drum Solo

Resist (acoustic)

2112 Part I: Overture

2112 Part II: The Temples of Syrinx

Limelight

La Villa Strangiato

The Spirit of Radio

Encore:

By-Tor & The Snow Dog

Cygnus X-1 (Prologue)

Working Man

4 comentários sobre “Datas Especiais: 20 Anos do Rush Em Porto Alegre

  1. 20 anos. O tempo passa. Grande show!! Baita lembrança Micael. Mais tarde tecerei minhas lembranças deste show. Confesso que de imediato eu não lembro mesmo de ter levado um celular para este show (pro Kiss sim) e nem de termos nos encontrado pós-show, mas entramos no show juntos. A questão é que no meio de “The pass” o esmagamento era forte, daí eu e a Sabrina saímos do meio do campo e fomos para uma das laterais do Olímpico, e vimos o show tranquilamente de lá.

  2. Esse foi um daqueles que até hoje lamento ter perdido. Não tive a oportunidade de assistir Rush ao vivo, o que coloca uma das minhas bandas favoritas na triste lista de não vi e nem verei… Na época era bem difícil conseguir uma excursão para assistir, e a data no meio de semana complicava ainda mais porque significava perder um ou dois dias de trabalho. Enfim, fazer o quê? Resta assistir aos DVDs, ouvir os discos e imaginar-se ali no meio da plateia!

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