Melhores de 2021 – Por Ronaldo Rodrigues

Melhores de 2021 – Por Ronaldo Rodrigues

Precisei, por razões pessoais, ouvir os lançamentos de 2021 de forma condensada nesses dois últimos meses do ano. E tive a impressão de que foi um ano com poucos lançamentos dentro dos estilos que pesquiso, talvez ainda na esteira da pandemia e de todos os desmandos governamentais (em nível mundial) que tem atrasado o lado de todos. É compreensível – lançar um disco e não ter nenhuma previsibilidade quanto a realização de shows, turnês e festivais é deveras frustrante. Mas ainda sim, se não houve fartura de lançamentos, qualidade não faltou entre o que ouvi. Novos discos foram acrescentados ao meu acervo de audições frequentes. Para quem não acompanhou minhas listas em anos anteriores, uma premissa dessa lista é que ela não contém discos novos de medalhões e artistas já muito consagrados, focando mais em nomes mais contemporâneos. Vamos a eles.


Diagonal – 4

Acompanho o trabalho dessa banda inglesa desde seu primeiro disco, de 2008. Arrisco dizer que é seu melhor álbum até agora; não há deslizes – a sonoridade é perfeita, envolvente e densa, as composições são acertadas do início ao fim, há excelentes ideias e é cada vez mais difícil ficar associando o som da banda a ícones do jazz-rock/progressivo dos anos 60/70. O Diagonal já tem uma linguagem própria e uma identidade sonora muito bem consolidada. Os vocais até guardam algo do pop mais cinzento dos anos 80, mas colocado em linhas vocais muito inteligentes e uma base que é, ao mesmo tempo, cheia de groove e psicodelia. A parte instrumental é um capricho a parte, teclados muito bem encaixados e os sopros esculpidos com precisão nas músicas, com guitarras ardidas (“Stellate” é o grande momento delas no disco) e uma cozinha da pesada. Viagem pura e muita musicalidade.


Agusa – En Annan Värld

O Agusa vem chamando atenção da comunidade progressiva nos últimos anos, ainda que tenha transitado um pouco pela praia do stoner-rock. Nesse novo trabalho, que contém apenas duas longas faixas, o DNA da banda está totalmente voltado para os anos 70, seja na estruturação das composições, seja na sonoridade. A primeira suíte, “Sagobrus”, começa tímida e demora a engrenar, mas depois de uns poucos minutos adquire um dinamismo que a torna impossível parar de ouvir, no qual a banda transita tanto pelo jazz-rock, quanto pela abordagem mais sinfônica, em uma grande viagem sonora. A segunda faixa “Uppenbarelser” é mais climática, quase cinematográfica, e lá pelos 12 minutos explode em um violento solo de guitarra, com um final mais sinfônico e épico. Excelente trabalho.


Needlepoint – Walking up the Valley

Não havia tido contato com o Needlepoint nem por nome antes de me deparar com a citação a Walking up the Valley em um fórum de fãs de prog. Disco surpreendente dessa banda, ainda que possa ser taxado como essencialmente “retro-rock”. Mas ainda sim um surpreendente “retro-rock” porque a banda (noruguesa) emula com perfeição a onda do Caravan no início de carreira (o que não se vê por aí em toda esquina), com pitadas generosas de sátira à la Gong, mas mantendo os pés no chão no aspecto musical. A sonoridade é uma reprodução fiel da forma com os discos eram gravados na Inglaterra entre 1969 e 1971. A instrumentação é riquíssima, com guitarras, violões, órgão, flauta e os vocais são bastante agradáveis. Como todo bom rock progressivo do período, o disco é um passeio por diferentes estilos e pega elementos emprestados do jazz, do pop orquestral, da música erudita e do folk e embala isso tudo em lisergia.


Motorpsycho – Kingdom of Oblivion

Presença constante, e diria até cansativa, em minhas listas de melhores de cada ano. Dois motivos para tal – os caras lançam um disco a cada ano (desde 2016) e o tal disco é muito bom. Sei que sou um defensor solitário da banda aqui no site e em quase todas as rodas de amigos de que participo, mas não desisto. Nesse novo disco a banda pesa mais a mão e nos oferece um trabalho de hard/heavy rock em essência, com boas doses de rock progressivo e arranjos inteligentes. Difícil imaginar alguma banda de rock que tenha lançado balada folk tão bonita quanto “Lady May” (parece algo sombrio feito por Crosby, Stills & Nash).


Stew – Taste

O disco de hard/blues rock do ano. Banda da Suécia que lançou sua estreia em 2018 e agora no finzinho lançou um novo trabalho. Um disco que bota os conterrâneos do Blues Pills no bolso, na minha humilde opinião. Os riffs mais quentes do ano estão aqui nesse disco, que obviamente tem a verve dos anos 70, mas também tem algo dos anos 90 como influência pelo peso das guitarras, o estilo vocal e a pegada geral da coisa toda. “All that I Need” e “Stranger in the City” tem grooves irresistíveis para sacodir a pança; estas faixas e “Heavy Wings” figuraram entre as mais tocadas da redação nesse 2021.


Heavy Feather – Mountain of Sugar

Mais Suécia na lista! Depois de uma ótima estreia em 2019, o Heavy Feather nos brinda com um novo disco de boa qualidade (ainda que um pouco menos cativante que o anterior). O disco já abre com a faixa mais viciante do ano – “3o Days”, dona de um riff espetacular, vocais incríveis e sonoridade flamejante. O Heavy Feather manteve a aposta em um hard rock calcado no blues e muito swing. A dupla de frente, o casal Lysa Lystam e Matte Gustavson (membros também do Siena Root), está em ótima forma, seja pelos agudos da primeira e pelos solos perfeitos da Gibson do segundo. O disco tem ótimas ideias no miolo das músicas, mas algumas músicas, como a faixa título, não inspiram tanto pois se parecem bastante com faixas do álbum anterior. Esse é apenas um pequeno porém em um disco de ótimo nível e plenamente apreciável.


Alexandre Maraslis –Maraslis

Representante brasileiro na lista, o trabalho novo do compositor, produtor e tecladista Alexandre Maraslis é, sem sombra de dúvidas, a melhor coisa que o progressivo brasileiro nos legou em 2021. A musicalidade é surpreendente, com um vasto vocabulário de ideias, virtuosismo em sua execução, mudanças de clima e andamento, e tudo mais que agrada os fãs de rock progressivo sinfônico. Há profusões de teclados voando por sobre ritmos quebrados e belamente adornados por vocais femininos (cortesia de Beth Dau, que já cantou com Hermeto Paschoal). As duas suítes do disco se destacam – “Vedas” e “The Krebs Cycle”, na qual os ouvidos do ouvinte são devidamente entortados. O disco tem participações ilustres de músicos como Pedro Baldanza (in memoriam), Alex Frias, Braulio Drumond e Marcos de Pinho. Os únicos senões do trabalho são recorrentes em discos brasileiros – a parte técnica da gravação (timbres, captação, mixagem) ainda parece um tanto incompatível com a qualidade musical do material e fica abaixo de congêneres lançados em outros países; e há uma confusão entre músicas em inglês e português (algo que não parece fazer sentido por nenhuma ótica que se olhe).


BADBADNOTGOOD – Talk Memory

O BBNG é um grupo canadense bastante celebrado pela turma do modern-jazz. Ao longo de sua trajetória, fizeram muitas fusões do hip-hop com linguagens mais sofisticadas e musicadas de fato, mas no presente momento muitos afirmam que o BBNG lançou seu melhor disco – um trabalho realmente orgânico, sem vestígios de batidas eletrônicas e outras fanfarronices. Talk Memory é um trabalho inspirado, riquíssimo em instrumentação e com um frescor fantástico. É ao mesmo tempo, melódico e experimental – você pode ouvir um tema belamente composto executado por um som bem diferenciado de um sintetizador, ou um solo de baixo distorcido acompanhado por um arranjo orquestral, etc. E quando a coisa se assenta no básico esquema de bateria, baixo e piano, também é um arraso. Um ponto para lá de positivo desse trabalho é a parceria dos caras com o maestro brasileiro Arthur Verocai, um de nossos mais celebrados músicos no exterior atualmente, ainda que em um reconhecimento muito tardio. Os arranjos de Verocai dão um toque de MPB setentista fantástico para os temas do grupo.


Malady – Ainavihantaa

O Malady é um competente grupo finlandês de rock progressivo que canta em sua língua nativa. Esse novo trabalho dos caras mostra uma evolução na maturidade do grupo, sucedendo e superando o bom disco que gravaram em 2018. Ainavihantaa deixa mais evidente uma influência de King Crimson (fase Greg Lake), com grande qualidade nos arranjos e um instrumental muito balanceado entre guitarras, teclados e instrumentos de sopro. Há algo também de post-rock nesse novo rock, com guitarras reflexivas abusando de delays e outros efeitos sonoros. As composições tem passagens belíssimas, com boas variações e bons ganchos que não deixam o ouvinte perdido.


Caligonaut – Magnified as Giants

A última posição da lista ficou bastante acirrada, e depois de pensar um tanto, acabei dedicando o posto a este projeto trabalho solo do guitarrista Ole Michael Bjørndal, membro da banda Oak e também parceiro do grupo Airbag. O disco tem um inspirado trabalho de guitarra e bons vocais, contando com o próprio Ole Michael e o ótimo Andreas Prestmo (Wobbler). O disco contém apenas 4 músicas, com 3 longas faixas, na qual há uma profusão de boas ideias e guitarras envolvidas em fantásticas linhas de baixo, mellotron, piano, órgão, violino, violão, etc. Há uma inspiração mais moderna para o trabalho, particularmente no que diz respeito ao posicionamento da guitarra, trazendo um bom contraste entre as abordagens mais clássicas e mais modernas do rock progressivo.

14 comentários sobre “Melhores de 2021 – Por Ronaldo Rodrigues

  1. Outros discos interessantes que ouvi esse ano:
    Jordso – Pastoralia
    Ciccada – Harvest
    The Watch – The Art of Bleeding
    Sufjan Stevens & Angelo de Augustine – A Beginner’s Mind
    Meer – Playing House
    Mastodon – Hushed and Grim
    Black Midi – Cavalcade

    1. Também ouvi apenas esse. Não chegou a entrar na minha lista mas achei um trabalho bem legal.

  2. PUTS TO GOSTANDO DE TODOS DA LISTA ATÉ AGORA. JA OUVI OS 5 PRIMEIROS CITADOS ATÉ AGORA.

  3. Ronaldo sempre trazendo novidades. Bastante material para ouvir. BADBADNOTGOOD é uma banda que preciso ouvir com mais atenção

  4. cara sobre motorpsycho comecei a ouvir justamente pelas tuas recomendações desde o here be monsters , sigo com o mesmo papel de espalhar a palavra da banda

    1. que maravilha! a banda é muito boa; composições super bem construídas, sonoridade boa…acho que a banda acerta com uma frequência maior que a média. Abraço!

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