O Caçador de Bruxas da NWOBHM

O Caçador de Bruxas da NWOBHM

Por Fernando Bueno

As bandas da New Wave of British Heavy Metal ficaram conhecidas por retomar e reformular a sonoridade de bandas clássicas dos anos 70 que haviam sidos ofuscadas pelo surgimento do punk, pós-punk, new wave e outros estilos no fim daquela década. Thin Lizzy, Judas Priest, UFO, Budgie e, claro, a santíssima trindade do rock, Led Zeppelin, Deep Purple e Black Sabbath são invariavelmente lembradas como influência desses grupos. E para o Witchfinder General, tema do texto de hoje, a maior influência foi, sem dúvida, o Black Sabbath. Eles também são constantemente citadas como pioneiros do então embrionário doom metal.

Formado em Stourbridge no ano de 1979 pelo vocalista Zeeb Parkes, nome artístico, e pelo guitarrista Phil Cope, ambos com cerca de 16 anos, o grupo, assim como o Black Sabbath, pegou o nome de um filme de terror britânico que havia sido lançado em 1968. O filme não emprestou apenas o nome ao grupo, mas também a temática de suas letras. A história da película se passa no século XVII e tem como tema a caçada contra magia e bruxaria. Para quem se interessar, o filme foi renomeado para The Conqueror Worm quando relançado nos Estados Unidos da América.

No iníco acompanhavam Zeeb e Phil o baterista Steve Kinsell, que não gravou o debut, e o baixista Johnny Fisher, que ficou pouco mais de um ano no cargo e deu lugar à Kevin McCready, que também saiu logo antes da gravação do primeiro full lenght. Nesse meio tempo um EP chamado Soviet Invasion foi lançado em 1982. Porém, a formação de Death Penalty contou com Zeeb Parkes no vocal, Phil Cope na guitarra e baixo e Graham Ditchfield na bateria. No encarte do álbum o crédito para o baixo foi para Woolfy Trope, nome fictício usado apenas para completar o line up.

Em Death Penalty a inexperiência da banda se mostra claramente, basta prestar atenção nas letras simples e até óbvias, além do resultado sonoro ser apenas razoável. Claro que isso não era privilégio apenas do Witchfinder General, a maioria dos grupos sofria com produções fracas. O produtor desse álbum foi Peter Hinton que já tinha trabalhado com o Saxon e o tempo de gravação total foi de, ridículos, três dias. O baixo foi o maior afetado e muito disso se deve ao fato de que o posto não tinha uma definição certa até o lançamento do disco.

O tema lírico vai na linha do Venom com a trinca sexos, drogas e demônio. Apesar de não se tratar de um álbum conceitual temos aqui uma sequencia de julgamento, “Death Penalty”, caçada, “Witchfinder General”, execução, “Burning a Sinner” e funeral, “R.I.P.”. Em “Invisible Hate”, a faixa de abertura, a mudança de andamento é o que mais chama atenção e também o que nos remete bastante ao velho Sabbath por conta dos riffs.

“Free Country” é a mais veloz do álbum, indo um pouco contra a filosofia do doom metal, mas o Witchfinder General, como dito acima, foi apenas uma influencia – ouça a faixa título – , e não exatamente uma banda do estilo. A falta de uma boa gravação para o baixo aparece em “No Stayer” já que há vazios que poderiam ser preenchidos durante o solo de guitarra no início da música sobre a levada de bateria. Dá para notar isso porque no restante das músicas a banda utiliza um expediente largamente utilizado por todos os grupos com apenas um guitarrista usam, uma segunda guitarra para engordar o seu som.

Dos seus dois álbuns clássicos lançados no início da década de 80 o meu preferido ainda é Friends of Hell, além da gravação ter ficado bem superior ao anterior, as faixas contém mais elementos que nos faz guardar as melodias. Outro fator que se destaca é o crescimento de Phil Cope como músico e compositor. Zeeb Parkes também evoluiu bastante adquirindo um leque maior de melodias e técnicas de interpretação. Como o Ozzy ele seguia bastante os riffs de guitarra para colocar a voz, mas em Friends of Hell ele não se resume apenas isso. A mudança de formação, com Rod Hawkes assumindo o baixo, utilizando um jargão do futebol, só veio a somar ao grupo.

“Love on Smack” e a seguinte, “Last Chance”, provavelmente fizeram o grupo receber uma maior atenção do público. Acho as duas superiores à todas as do primeiro álbum e “Love on Smack”, uma faixa sobre suicídio, é a minha preferida da banda. “Music” é cadenciada e bastante pesada, possui um apelo até certo ponto pop e tem uma adição de um tecladinho meio safado durante o refrão. Dá para imaginá-la sendo tocada em um ambiente aberto para uma multidão. A faixa mais épica da banda é “Friends of Hell” que novamente usa o oculto como tema principal. Algumas faixas como “Requiem for Youth” e “Shadowed Images” anteciparam o stoner metal.

Falar do Witchfinder General e não comentar suas capas é praticamente impossível. A bela garota seminua na capa chamou bastante atenção, principalmente dos tabloides britânicos já que a moça era uma conhecida modelo da época chamada Joanne Latham. Temos uma cena um pouco confusa em que podemos imaginar algo como um início de sexo grupal medieval – meio bizarro, é verdade já que eles estão em um cemitério – com a presença da bruxa, de seu caçador, um soldado e dois sacerdotes, mas a contra capa sugere que na verdade isso era um sacrifício já que a moça aparece toda ensanguentada e com olhar sem vida.

A atenção conseguida pela capa de Death Penalty levou-os a repetir a dose com Friends of Hell. Porém além da evolução musical deste último tivemos uma evolução também na sua capa, com uma imagem mais nítida e, principalmente pelo aumento do número de “itens de interesse”. Sua contracapa já é mais bem humorada, com os integrantes do grupo se rendendo aos encantos das bruxas e eliminando o clima medieval da capa aparecendo em frente a um carro e uma van. O fato dessas cenas terem sido fotografadas em frente à uma igreja não deve ter agradado aos religiosos da época. Vale lembrar que em alguns relançamentos desses discos não tinham essas capas.

Como foi comum para aquelas bandas da época as coletâneas de várias bandas ajudavam bastante na divulgação. O Witchifinder General teve faixas no dois volumes da Heavy Metal Heroes Compilation, de 1983, que continha ainda bandas como Jaguar, Lionheart, Grim Reaper, Bitches Sin e outras. Como eles também tinham um lado obscuro participaram de outra coletânea junto das bandas do mal como Venom, Demon e Cloven Hoof, chamada Metal Inferno de 1984. Em 1990 saiu uma conhecida coletânea de bandas da NWOBHM chamada New Wave of British Heavy Metal ’79 Revisited. Essa compilação foi feita por Lars Ulrich. Alguns outros lançamentos já no começo dos anos 2000 mantiveram o nome da banda sendo pelo menos lembrado. Foram relançados alguns singles, o EP Soviet Invasion, e um disco ao vivo, Live ’83 Die Hard LP. A capa desse último ilustra como imagem principal desse texto.

O fim precoce da banda em 1984 não está muito bem documentado. Não existe muitas informações sobre o real motivo. Muito provavelmente a dificuldade de se manter uma banda sem muito reconhecimento, principalmente financeiro, deve ter sido o motivo. Em 2006, atendendo à vários pedidos de fãs e produtores de shows, Phil Cope reuniu o grupo todo, menos o vocalista Zeeb que aparentemente não quis participar, para fazer algumas datas e essa reunião resultou em Ressurected, lançado em 2008. Para o posto de vocalista Gary Martin, com uma voz até certo ponto bastante similar à de Zeeb. O baterista dessa reunião foi Dermot Redmond, que já tinha participado da banda de 1983 até seu fim. O álbum é inferior aos dois primeiros, sem dúvida, mas a linha das músicas segue a mesma, parecendo até que o material já estava pronto desde 1984. Aqui eles adotaram de vez o doom metal e a sonoridade é praticamente a mesma. Parece que depois desse álbum a banda encerrou de vez suas atividades. Vale a pena adquirir esse lançamento, mesmo quem não for um colecionador ou um comprador compulsivo. Vale também ir atrás de Buried Amongst the Ruins, que contém o single para “Burning a Sinner” e o EP Soviet Invasion, apesar de não serem tão fáceis e baratos de se encontrar. Esse é um daqueles vários exemplos de grupos que não foram tão importantes na sua época de atuação, mas que se tornou referência depois de alguns anos e ganhou uma aura cult que pelo menos garantiu que seu nome não caia no esquecimento.

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