Bohemian Rhapsody (2018)

Bohemian Rhapsody (2018)

Por Davi Pascale

Bohemian Rhapsody está, nesse momento, sendo exibido nas salas de cinema Brasil afora. A mega-produção, que contou com o auxílio luxuoso de Brian May e Roger Taylor, supera as expectativas no sentido cinematográfico, mas deixa a desejar na elaboração de roteiro. Como assim?

O filme retrata a história de Farrokhl Bulsara, um jovem que trabalha carregando malas no aeroporto de Heathrow (Londres) e que vê sua vida mudar ao se transformar em um astro do rock. Tratado com desdém por conta de seu visual excêntrico, Bulsara começa a se destacar ao assumir os vocais da banda Smile. A banda muda o nome de Smile para Queen. E Farrokhl Bulsara se transforma em Freddie Mercury.

A banda não aceita seguir velhas fórmulas e logo começa a bater de frente com a indústria. Bastante bajulado, Freddie deixa o ego tomar conta de si, causando tensão entre seus colegas. Paralelo à isso, o jovem cantor começa a questionar sua sexualidade. Seu casamento com Mary Austin termina. O grupo, embora com grande sucesso, se encontra estremecido. Logo após se descobrir soropositivo, o cantor resolve dar um basta e recolocar sua vida nos eixos. Engata um novo romance, se reaproxima da família, reúne novamente a banda e decide aceitar a participação no evento Live Aid, marcando o retorno do grupo aos palcos e iniciando assim uma nova era de sucesso. Bem, é isso que está retratado no filme.

Se você curte o som da banda, mas não conhece muito a história do grupo ou se você está tendo seus primeiros contatos com o grupo de Freddie Mercury agora, provavelmente você irá considerar a produção espetacular. E, em determinado sentido, é. Agora, para quem conhece a trajetória dos rapazes, muitos pontos do script irão incomodar.

A ideia de homenagear Freddie e reviver a história da banda, é simplesmente fantástica! O Queen foi uma das bandas mais inventivas da história do rock e a qualidade do trabalho dos rapazes chega ao ponto de ser inquestionável. Quando escutamos velhas canções como “Killer Queen”, “Keep Yourself Alive” ou  “Another One Bites The Dust”, nos bate aquela sensação de “puta que o pariu, como esses caras fazem falta”. Não tenho receio nenhum de escrever que não temos nenhum artista, atualmente, fazendo um trabalho no nível desses caras. E isso não é chororô de um velho ranzinza. Até porque, não sou tão velho assim… Sem dúvidas, a homenagem é mais do que merecida.

Muitos nomes do rock já foram retratados no cinema. Ritchie Valens, Jerry Lee Lewis, The Beatles, Ray Charles, The Doors… Alguns filmes são excelentes, outros nem tanto. Algumas produções usam atores fracos ou contam com uma produção mais amadoresca… Se tem um ponto que não dá para questionar Bohemian Rhapsody é esse. A produção é impecável, os atores são excelentes, o filme é muito bacana de assistir, mas um filme sobre uma personalidade deveria explicar a história dessa personalidade e aí temos muitos pontos fora da curva.

Para os fãs brasileiros, algo que os deixarão intrigados é a passagem do grupo pelo Rio de Janeiro. Quem conhece minimamente a história da banda, sabe que os músicos estiveram por aqui 2 vezes nos tempos de Freddie Mercury: no estádio do Morumbi (São Paulo) em 1981 e na primeira edição do Rock in Rio, em 1985. No filme, é citada a passagem pelo Rio de Janeiro como tendo ocorrido na década de 70. Tinha visto algumas pessoas dizendo que a caracterização dos trajes do show estava errada. Não foram as roupas que estavam erradas e, sim, o momento em que eles retrataram. Na década de 70, aquele era o visual dos músicos e o show surge no longa como se tivesse ocorrido naquela época, o que não foi o caso.

Há outros momentos que retratam acontecimentos reais de forma errônea. Vou citar alguns deles…

  • No filme, Freddie se descobre soropositivo em 1985, poucos dias antes do show do Live Aid, dando a impressão de que o cantor estava com pressa de acertar tudo enquanto era tempo e que conseguiu viver bastante após descobrir a doença. Não há duvidas em relação à vontade de produzir o maior volume de coisas possíveis. Entretanto, ele não durou tanto tempo assim. O cantor descobriu a doença em 1987, tendo vivido pouco mais de 3 anos.
  • A briga com a gravadora para a utilização de “Bohemian Rhapsody” como single do disco A Night At The Opera é outro ponto. A briga realmente existiu, mas não da maneira retratada. A briga não foi com um único cara, e sim com a gravadora toda que julgava a música como difícil de ser trabalhada.
  • A relação de Freddie com Jim Hutton também não ocorreu da maneira retratada aqui. Jim não atuava de garçom em uma festa produzida pelo músico. Freddie o conheceu em uma boate e o rapaz era cabelereiro. Outro erro em relação aos 2 é que o filme aponta que o namoro surgiu logo após Freddie se descobridor portador do vírus HIV. Na verdade, ele não sabia da doença ainda quando resolveram manter uma relação.
  • A separação da banda também não existiu. A banda decidiu dar um tempo em comum acordo e quando rolou o evento do Live Aid, eles já estavam na estrada há algum tempo. A banda não voltou por conta do evento.

Mas, afinal de contas, o filme é ruim? Não! Como já mencionei, o filme é incrivelmente bem produzido e os atores são excelentes. Gwilym Lee impressiona como Brian May. O garoto não apenas se parece fisicamente com o músico, como conseguiu reproduzir com perfeição todos os trejeitos do guitarrista. Dentro e fora do palco. Especialmente, no jeito de falar. Ben Hardy como Roger Taylor também está perfeito. E, sejamos francos, a atuação de Rami Malek também é de aplaudir. Não é nada fácil interpretar Freddie Mercury e o garoto conseguiu reproduzir os trejeitos do músico certinho. Especialmente, em cima do palco.

As músicas utilizadas na trilha foram bem escolhidas. Todas realmente bem emblemáticas. A questão da personalidade explosiva de Freddie também está bem retratada, assim como o lado perfeccionista do músico. As roupas, os cabelos, os palcos, o modo de se posicionarem no palco, tudo perfeitinho. Um ponto positivo é que eles não retrataram a homossexualidade do cantor de maneira sensacionalista. Pelo contrário, foi bem sutil. Contudo, o fato de terem decidido encerrar o longa em 1985, impediu que retratassem o impacto que causou sua morte na época. A notícia da morte do cantor foi uma verdadeira bomba e causou uma comoção poucas vezes vista antes. Acredito que o filme ganharia uma dose extra de emoção, caso o assunto tivesse sido retratado.

Resumindo… Se encararmos Bohemian Rhapsody como um longa de rock, temos um filme bem interessante e muito acima da média. O tempo passa rapidinho e o filme diverte. E é com esses olhos que você deve assistir quando for ao cinema. Como se estivesse assistindo um filme estilo The Commitments ou Rockstar. Agora… Quem está pretendendo ir ao cinema para conhecer a história de Freddie e do Queen, já aviso que não é por aqui que irão conseguir.

18 comentários sobre “Bohemian Rhapsody (2018)

  1. “Um ponto positivo é que eles não retrataram a homossexualidade do cantor de maneira sensacionalista.”

    ??????

    🤔🤔🤔🤔🤔🤔

      1. O que seria “sensacionalismo” pra retratar o óbvio ululante, tendo em conta que o Freddie nem deixava dúvidas da sua sexualidade? 🤔🤔🤔🤔🤔🤔🤔🤔🤔🤔

      2. Segundo Brian May, Freddie nunca revelou sua sexualidade e sempre foi muito discreto quanto a sua privacidade.

      3. Eu gostei do tratamento que deram a sexualidade dele a maior parte do tempo, exceto a cena familiar com Jim Hutton – aquilo, pra mim, foi um momento de lacração desnecessária. Mas, de resto, acho que foi bom.

    1. Gostei do filme. Só achei que a história poderia ter sido um pouco mais fiel. Ainda mais sabendo que Brian e Roger estavam por trás. A trilha ainda não encontrei, mas sem dúvidas irei comprar…

  2. Fui ver o filme na estreia e saí de lá feliz e puto, se é que entendem. Feliz porque, visualmente e tecnicamente, é um filme muito bonito. Mas a banda retratada ali não é o Queen. Não mesmo. E desde que soube que Roger e Brian estariam à frente disso, já imaginei que seria problemático.

    O que eu achei engraçado, e que não li em nenhum lugar das notícias e reviews na web, é que ninguém notou que a trilha-sonora não inclui nenhuma música de The Miracle. Tem até de Innuendo, inclusive. Já que o filme não tem respeito algum pela cronologia, não é absurdo dizer que “I Want It All” não deveria faltar.

    Eu escrevi também um texto sobre o filme, a quem se interessar: https://medium.com/@tiagofabreu/a-%C3%BAnica-verdade-de-bohemian-rhapsody-%C3%A9-a-arrog%C3%A2ncia-a73233775650

    1. Mesma sensação. É um belo filme, mas ainda acho que poderia ter sido mais fiel à trajetória. Irei conferir seu texto.

  3. E mais uma coisa que eu esqueci de falar: A coisa mais legal que esse filme proporcional foi o encontro da Smile na trilha-sonora. Aquela regravação ficou sensacional.

  4. sou fã do queen de longa data e gostei mto do filme, mesmo conhecendo toda a historia da banda, fui ao cinema pra me divertir e sem querer fazer comparaçoes com os fatos, entao saí satisfeito .

    1. Sim, o filme é muito bom. Também não fui para fazer comparações, fui sem saber o que esperar, mas aquele sentimento de ‘hei, isso não aconteceu assim’, acabou surgindo em alguns momentos para mim, mas é um trabalho bonito mesmo.

  5. Eu curti muito o filme, mas também já entrei no cinema disposto a “perdoar” as falhas do roteiro, tem algumas que acabam incomodando mesmo, mas mesmo assim, achei o filme sensacional, e só pelo Hype que deu ao Queen já valeu muito a pena! E só o fato de Brian May, Roger Taylor e Tim Staffell terem voltado a gravar juntos já valeu demais!!

  6. Honestamente, olhei o filme sem expectativa, e sai decepcionado do cinema, ao mesmo tempo que uma sensação de frustração crescia cada vez mais na medida que fui para casa. Os incríveis erros de cronologia são tão gritantes que é impossível entender pq Brian May e Roger Taylor aceitaram os mesmos. Quase todo o Live Aid refilmado foi desnecessário, como se tivesse sido o último show da banda. Nada da luta de Mercury nos estúdios para gravar áudios e vídeos na fase Miracle e Innuendo foi muito triste de não ver, pois poderia ser um grande estímulo para quem sofre de AIDS e acha que a vida acaba depois da doença. Foi divertido em alguns momentos, mas olha, a galera aqui da Consultoria com uma câmera de celular poderia ter feito um filme bem melhor. Em tempo, a caricatura do ator que fez o Mercury mais parece Mick Jagger na fase “nova” do Mercury (com o bigodão até engana). Os demais estão muito similares, e é o principal ponto positivo do filme. Valeu Davi

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