Cinco Discos Para Conhecer: O Hammond no Rock

Cinco Discos Para Conhecer: O Hammond no Rock

Por Ronaldo Rodrigues

Hoje esse nome pode ser até desconhecido, mas tempos atrás ele era um dos teclados mais cobiçados e utilizados pelos tecladistas do universo do rock. Até a entrada dos anos 80, das bandas que utilizavam teclados (e até de várias que não contavam com tecladistas fixos) é possível contar nos dedos quantas bandas não tenham utilizado ao menos uma vez os lendários órgãos Hammond e sua sonoridade característica e icônica. Seja no rock pesado, progressivo, experimental, jazz, blues, pop, soul, funk, folk, os órgãos Hammond marcaram época. Ainda mais com a dobradinha que fizeram com os amplificadores Leslie, um tipo bastante distinto de caixa de som, que ajudou o Hammond a ter uma sonoridade fantástica e muito cativante. 
Criado com intuito litúrgico, para substituir as pesadas estruturas dos órgãos de tubos das igrejas, o órgão Hammond acabou caindo no gosto popular devido ao uso maciço por alguns músicos do jazz apaixonados por sua sonoridade leve, como Jimmy Smith, que difundiu seu timbre no jazz e em outros estilos, e desde então é rapidamente associado ao instrumento. 
Nesta seção apresentaremos alguns discos de rock onde o Hammond aparece com destaque e alguns músicos que ficaram marcados pela forma com a qual o utilizaram. 
Atomic Rooster – Death Walks Behind You (1970) 

O Atomic Rooster tinha como cabeça o tecladista Vincent Crane. Do primeiro disco, lançado em fevereiro de 1970, a banda passou por uma reformulação total em sua formação, com a baixa principal do baterista Carl Palmer, que foi ganhar o mundo com o supergrupo Emerson Lake & Palmer. O som do Atomic Rooster ficou mais pesado e agressivo na nova formação, com o baterista Rick Parnell, o guitarrista e vocalista John Duccan e Vicent Crane cuidando dos teclados (com os quais também fazia as linhas de baixo). A primeira faixa, que dá nome ao álbum , tem uma presença bem discreta do Hammond, privilegiando o piano; dali em diante, segure-se na cadeira, porque vem um bombardeio da sonoridade do instrumento, seja duelando com a guitarra ou fazendo solos enérgicos. Apenas pro final do disco que a coisa dá uma aliviada com a climática “Nobody Else”, conduzida ao piano; porém o fechamento é triunfante com o Hammond poderoso em “Gershatzer”, alternando momentos de pretensão sinfônica a outros mais experimentais, onde Vincent faz o instrumento roncar e gemer. 
Vincent Crane (órgão Hammond, piano, vocais), John Du Cann (guitarra, vocais), Paul Hammond (bateria, percussão)

1.Death Walks Behind You
2. VUG
3. Tomorrow Night
4. Seven Lonely Streets
6. I Can’t Take No More
7. Nobody Else
8. Gershatzer

Deep Purple – Burn (1974) 
Jon Lord é um dos tecladistas mais famosos e lendários do rock, indiscutivelmente. Sua trajetória com o órgão Hammond é plenamente reconhecida, inclusive por ter se mantido fiel ao instrumento mesmo nos anos 80, quando a popularidade do instrumento decresceu muito. No início da carreira do Deep Purple, Jon se valia das características mais clássicas do instrumento, mas quando o Deep Purple resolveu dar uma guinada e tornar-se uma banda de rock pesado, ele passou a experimentar a liga do Hammond com amplificadores Marshall, de forma a poder preencher o som em pés de igualdade com a guitarra de Ritchie Blackmore. Mas a partir de Burn, Jon Lord voltou a usar a clássica combinação do Hammond com a caixa Leslie. Sobre o disco é desnecessário falar, já que trata-se de uma pedra fundamental do rock dos anos 70. A abertura do disco já traz um dos momentos mais belos do Hammond no rock e da carreira de Jon Lord, um solo simplesmente espetacular. A introdução de “Might Just Take Your Life” mostra o poder do som desse teclado, uma sonoridade quente e valvulada, que casa maravilhosamente com o groove da canção. Não são em todas as faixas de Burn que temos a presença do Hammond, mas onde ele apareceu, o fez para entrar para a história sobre as mãos do maestro Jon Lord. Em “You Fool no One” o Hammond tem uma participação quase percussiva, com uma técnica muito utilizada também por outro grande tecladista, Greggie Rolie, que tocava com Santana (cujos primeiros discos, juntos com estes, são excelentes exemplares de órgão Hammond tocado com feeling). E em “Mistreated”, o onipresente órgão Hammond cria a atmosfera perfeita pra todas as emoções da canção.

Ritchie Blackmore (guitarra, violões), Glenn Hughes (baixo, vocais), David Coverdale (vocais), Jon Lord (órgão Hammond, sintetizador, piano), Ian Paice (bateria, percussão)

1. Burn
2. Might Just Take Your Life
3. Lay Down, Stay Down
4. Sail Away
5. You Fool No One
6. What’s Goin’ On Here
7. Mistreated
8. A-200

Emerson Lake & Palmer – Tarkus (1971) 

Keith Emerson foi um dos responsáveis por decretar que o Hammond seria fundamental dentro do rock progressivo, desde sua época no The Nice. Além de tocar com técnica invejável, sua postura frenética no instrumento evoluiu em poucos anos para uma maneira performática e até acrobática de tocar! Emerson, pelo meio do caminho, literalmente destruiu alguns Hammonds, pendurando-se sobre eles, enfiando facas, rodando o instrumento ou o balançando. Em Tarkus, Emerson, junto de seu genial supergrupo, colocou o órgão Hammond a serviço de uma música extremamente complexa e hermética. A suíte “Tarkus”, com sua intensa poliritmia e variações harmônicas, é praticamente um esgotamento do instrumento e só por ela, já valeria mencionar o disco como referência em se tratando de órgão Hammond na música em geral. As demais músicas do disco apresentam Emerson trabalhando mais no piano acústico, a exceção de “A Time and a Place”, onde seu Hammond pretende soar como uma guitarra fazendo riffs. 
Keith Emerson (órgão Hammond, Minimoog, Sintetizador, piano), Greg Lake (baixo, vocais, guitarras), Carl Palmer (bateria, percussão, sinos tubulares)
1. Tarkus

2. Jeremy Bender
4. The Only Way (Hymn)
5. Infinite Space (Conclusion)
7. Are You Ready Eddy?
Focus – Live at the Rainbow (1973) 
Poderia ser incluído nesta lista qualquer disco de estúdio do Focus, já que o tecladista, flautista e vocalista do grupo holandês, Thijs Van Leer, é um músico que não abre mão do Hammond em seus trabalhos. Mas a escolha desse ao vivo deve-se ao fato dele ser “100% Hammond”. Em estúdio, Thijs também utilizava piano, mellotron e sintetizadores. Ao vivo, apenas seu imponente Hammond B3 domina o palco. É difícil destacar algum momento nesta performance do Focus no teatro inglês Rainbow, pois ela é simplesmente soberba, representa a banda no ápice em sua mais clássica formação, e a sonoridade do Hammond perpassa todo o disco, seja em acompanhamento suaves ou em vibratos pra lá de expressivos. Thijs Van Leer tem o grande mérito de utilizar plenamente os recursos do Hammond a favor das composições, como se o instrumento e a diversidade de matrizes que suas regulagens permitem fosse parte integrantes de suas músicas, sendo praticamente impensáveis para outro tipo de teclado. A introdução de “Focus II” é de uma beleza indescritível, ainda mais abrilhantada pelo som aveludado do Hammond.

Thijs Van Leer (vocais, órgão hammond, flauta), Jan Akkerman (guitarra, violão, alaúde), Pierre Van der Linden (bateria, percussão), Bert Ruiter (baixo, vocais)

1. Focus III
2. Answers? Questions! Questions? Answers!
3. Focus II
4. Eruption
5. Hocus Pocus
6. Sylvia
7. Hocus Pocus (Reprise)

Uriah Heep – Live (1973) 

A abertura do disco com “Sunrise”, em poucos segundos, mostra a capacidade do Hammond de passar de um cândido som para um misto de frequências muito expressivo. Ken Hensley, que pilota as teclas do Uriah Heep sabe muito bem com fazer esse tipo de transição; passar o Hammond de um som quase litúrgico, como na introdução de “Circle of Hands”, para um som demoníaco e extravagante, como no pirado solo de “Gypsy” ou nas bases de “Look at Yourself”. Esse disco ao vivo, que registra uma performance do Uriah Heep em Birmingham, mostra o poder de fogo do órgão Hammond a serviço do rock pesado. O Hammond está presente em todas as faixas, exceto em “Tears in My Eyes”, em que Ken Hensley acompanha Mick Box na guitarra.
David Byron (vocais), Mick Box (guitarra, violões, vocais), Gary Thain (baixo, vocais), Ken Hensley (órgão Hammond, guitarras, vocais, violões), Lee Kerslake (bateria, percussão)

1. Sunrise
2. Sweet Lorraine
3. Traveller in Time
4. Easy Livin’
5. July Morning
7. Gypsy
8. Circle of Hands
9. Look at Yourself
10. The Magician’s Birthday
11. Love Machine
12 Rock ‘n’ Roll Medley

 

9 comentários sobre “Cinco Discos Para Conhecer: O Hammond no Rock

  1. Excelentes discos!! Eu recomendaria o álbum do Still Life, mas não tenho certeza de que seja gravado com Hammond.
    E uma perguntinha: com órgão Farfisa, cujo som ("swirl") também é muito legal, você conhece alguém mais que use além do David Bowie e do Mott The Hoople?

  2. Solo mágico mesmo Eudes, apesar de curtinho. Esse instrumento é fantástico. Colocaria aqui o primeiro The Doors no lugar do Tarkus, e tantos outros de possível citação, como algum álbum de Jan Hammer, Herbie Hancock na sua fase eletrônica ou até os Mutanres, mas as escolhas foram excelentes. Parabéns Ronaldo!

  3. Olá pessoal! grato pelos comentários. A escolha dos discos não foi fácil. Não entraram Jan Hammer, Herbie Hancock, por que se fosse entrar mais no território do jazz ou do jazz-rock, com certeza o posto seria do Jimmy Smith ou do Larry Young (esse quase entrou). A respeito do Doors, respondo duas perguntas. O Ray Manzarek usa predominantemente o órgão Farfisa (e tb os órgãos Vox) ao invés do Hammond. Sobre os órgãos Farfisa eles eram muito comuns no estilo hoje chamado "garage rock", o pré-psicodélico nos EUA, bandas como Seeds por exemplo. Do Billy Preston, essa passagem msm que curta é de arrepiar, som maravilhoso. Booker T tb é fodaço, mas privilegiei mais o rock. Abraço a todos! Ronaldo

  4. Um nome que me veio à memória, ao reler essa matéria: Brian Auger, dos grupos Brian Auger & The Trinity e Brian Auger’s Oblivion Express…

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