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Visão dos CDs presentes no box set e suas capas |
O primeiro CD traz Lou Reed (vocais, guitarra), Sterling Morrison (guitarra, baixo) e John Cale (viola, baixo, vocais) gravando uma sessão de ensaios em 1965. Durante quase 80 minutos, os três interpretam “Venus In Furs”, “Heroin”, “I´m Waiting For The Man” e “All Tomorrow’s Parties”, além das nunca gravadas oficialmente “Prominent Men” e “Wrap Your Troubles In Dreams”. Todas são tocadas diversas vezes, naquele esquema “começa-erra-para-começa de novo” que todos aqueles que já tiveram uma banda sabem como acontece em um ensaio. Para os não iniciados, ouvir a mesma música vinte vezes em sequência, com alguns takes durando apenas segundos, é uma longa sessão de tortura. Para os convertidos, a chance de descobrir as origens de alguns clássicos, muitos em versões bem diferentes daquelas que seriam reveladas ao mundo. Se você não conhece a banda, não comece por este CD, mas não deixe de escutá-lo algum dia…
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O primeiro disco do Velvet, único a contar com a cantora Nico |
Foi neste ano que o grupo gravou seu primeiro álbum, The Velvet Undeground And Nico Produced By Andy Warhol, cujas 11 músicas estão listadas nas faixas 2 a 12 da segunda bolachinha deste box. Tivesse este disco sido lançado quando gravado, e o mundo do rock poderia ter sido diferente, visto que nada registrado anteriormente se parece com ele. Mas, devido a diversos problemas (com a gravadora, a confecção da capa, os direitos da foto da contracapa, entre outros), o álbum seria lançado apenas em 1967, quando o mundo já era outro… Assim, a estreia do Velvet vendeu pouquíssimo, mas, diz a lenda, cada pessoa que a ouviu montou uma banda logo depois.
O “disco da banana” é daqueles essenciais em qualquer coleção, um dos mais influentes da história e que parecia estar à frente do seu tempo. Se as quatro faixas cantadas por Nico (“Sunday Morning”, “Femme Fatale”, “I’ll Be Your Mirror” e “All Tomorrow’s Parties”) poderiam passar por baladinhas inofensivas – caso as letras assim o permitissem – “I’m Waiting For The Man”, “Run Run Run” e “There She Goes Again” são punks antes dos Pistols, dos Ramones, dos Stooges e do MC5. “The Black Angel’s Death Song” e “European Son” são crias da mente doentia de Reed, mas é em “Venus In Furs” e “Heroin” que a banda mostra a que veio. São duas músicas em que a viola de Cale se destaca, na primeira, narrando os “prazeres” do sadomasoquismo, e na segunda uma descida ao fundo do poço das drogas. São pouco mais de 7 minutos onde, com dois acordes, mudanças de ritmo e uma letra enaltecendo o vício em heroína (“é minha esposa, é minha vida”, canta Lou em certo ponto), os Velvets mostram uma nova forma de fazer música, que iria mudar a forma de pensar de muita gente que, anos depois, seria importante no mundo do rock.
Quase ninguém entendeu toda aquela esquisitice na época e, como disse, o álbum não vendeu quase nada quando lançado. Sentindo-se “escanteada” pelos outros, Nico deixou a banda para seguir carreira solo. Com sua partida, Warhol também perdeu o interesse, e foi cada vez mais se afastando dos seus “protegidos”. Livres das influências externas, os quatro Velvets se trancaram no estúdio para gravar aquilo que realmente queriam: rock and roll alto, pesado e visceral. Daí nasceria o segundo álbum do grupo, White Light/White Heat, que compõe o terceiro CD da caixa…
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Segundo lançamento do grupo |
Antes de chegarmos à luz e ao calor branco, o CD nos mostra algumas demos feitas ainda em 1967, e versões ao vivo de “Guess I’m Falling In Love” e da instrumental “Booker T.”. A partir da faixa 8, ouvimos o segundo disco da banda, lançado em 1968, e que já inicia com a clássica faixa título, anos depois coverizada com maestria por David Bowie. “The Gift” tem uma proposta inusitada até mesmo para a época: enquanto o grupo executa “Booket T” em um dos canais, Cale lê um poema no outro, dando ao ouvinte a opção de ouvir cada faixa separadamente (ao alternar os canais) ou à junção das duas. Nas demais faixas, o que se ouve é um Velvet muito mais barulhento do que aquele de um ano antes, chegando ao seu ápice na faixa de encerramento, “Sister Ray”. Novamente segundo a lenda, o engenheiro de som abandonou o estúdio no meio da performance (ao vivo) da banda, gritando “me avisem quando esta loucura acabar que eu venho desligar os botões”. Criada a partir de um improviso ainda na época do E.P.I., a música foi gravada em um único take, e a intenção era que cada um dos instrumentos (duas guitarras, órgão e bateria) soasse mais alto que os outros. Passar incólume por sua audição é assinar atestado de “falta de emocionalidade”, e se você não sentir ao menos raiva durante os 17 minutos e meio de “loucura organizada” promovida pelo grupo, pode largar o rock and roll e ir ouvir pagode…
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A estreia de Doug Yule |
O quarto disco desta caixa abre com uma versão ao vivo de “What Goes On”, para logo em seguida mergulhar no terceiro e mais intimista álbum da banda. Se White Light era o ápice do volume e da distorção, The Velvet Underground seguia o caminho contrário, com músicas calmas e “limpas”. “Candy Says”, “Pale Blue Eyes”, “Jesus”, “I’m Set Free” e “After Hours” (cantada por Mo) mostram um lado do Velvet até então desconhecido: calmo, leve, e muito belo. Traços do que a banda havia sido aparecem aqui e ali em “What Goes On”, “Some Kinda Love” e “Beginning To See The Light”, mas, no geral, este é um disco contido. Uma banda mais calma e sóbria que a anterior, mas nem por isso menos qualificada.
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O último disco com Lou Reed |
Seja pela presença de Billy (um baterista muito mais “convencional” em relação ao estilo totalmente pessoal adotado por Mo), seja por influência da gravadora, o certo é que Loaded é um álbum muito diferente dos anteriores. Lou afirma que “apesar de ter o nome da banda nele, Loaded não é um disco do Velvet Underground” e Maureen diz que “só tem dois Velvets ali – Lou e Sterling -, então não é um disco do Velvet”. O disco é imperdível, no mesmo nível do primeiro, apesar de soar totalmente diferente.
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O ao vivo Live At Max’s Kansas City |
Com a saída de Reed, Yule decidiu seguir com a banda, tendo a participação dos músicos Walter Powers no baixo e Willie Alexander nas guitarras e vocais. Mas, com as partidas de Sterling Morrison e Maureen Tucker, acabou ficando sozinho para gravar o derradeiro Squeeze (1973) (com participação de Ian Paice, do Deep Purple, na bateria), o qual não faz parte deste box set.
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As duas versões de Live MCMXCIII |
Também não estão na caixa várias faixas e takes que depois apareceriam em Fully Loaded Edition (1997), edição dupla com o quarto álbum mais diversos outtakes, bem como as faixas ao vivo de Live 1969 (1974) e do citado Live At Max’s Kansas City. Algumas faixas das coletâneas VU e Another View, compostas de sobras de estúdio e versões demo, também não estão presentes, acabando um pouco com aquela versão de “tudo já lançado” da resenha da Bizz. Mas isso não importa muito, afinal, ouvir esta caixa não é como “seu time ganhar o campeonato com um gol no último minuto”. É como “seu time ganhar o campeonato com um gol no último minuto da prorrogação, de mão e em impedimento”. Insuperável!
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As coletâneas VU e Another View e o segundo volume do ao vivo Live 1969 |
Para terminar, “descasque lentamente e veja” a banana da capa. Surgirá uma banana rosa por trás, parecida com aquela revelada ao descascarmos a capa do primeiro disco da banda, conforme a concepção original de Andy Warhol.
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O que há sob a banana? |
Track List:
Ouvi muito o "disco da banana" na época em que eu tava conhecendo Lou Reed, Iggy Pop e coisas parecidas. Hoje não tenho muita vontade de retomar essa fase…rs Sei lá…perdi um pouco o interesse. É um tipo de som que vc tem que estar meio calejado para apreciar….
Excelente texto! Tenho essa caixa e é realmente muito boa!