Discografias Comentadas: Kiss – Parte II

Discografias Comentadas: Kiss – Parte II

Por Leonardo Castro

Com o fracasso de Creatures Of The Night em levar a banda de novo ao topo das paradas nos Estados Unidos, uma mudança se fazia necessária. E essa mudança seria radical: depois de nove anos de mistério sobre os rostos dos membros da banda, o grupo decidiu abandonar as maquiagens que os fizeram famosos, e em setembro de 1983 uma entrevista foi ao ar na MTV onde a banda aparecia pela primeira vez de cara limpa. E assim, um novo capítulo na KISSTORY tinha início.


Lick It Up [1983]

Se visualmente a mudança da banda tinha sido radical, musicalmente as diferenças entre Lick It Up e seu antecessor, Creatures Of The Night, eram poucas. Apostando em um hard rock pesado, beirando o heavy metal em diversos momentos, o grupo começou a fase sem máscaras com um disco sólido e vigoroso, repleto de boas músicas. A abertura com “Exciter” e seu riff cavalgado não deixa pedra sobre pedra. O lado demoníaco de Gene se mostrava presente em “Not For The Innocent”, que tem uma aura maligna e sacana.

Já Paul deixa a sua marca no grande hit do disco, a faixa-tít, e em uma das melhoras baladas do grupo, “A Million To One”. Entretanto, apesar da boa performance de todos os músicos, quem rouba a cena no álbum é mesmo o “novo” integrante, Vinnie Vincent. Efetivado na banda na turnê de Creatures Of The Night, ele foi co-autor de oito das dez músicas do disco, e brilha com riffs e solos fenomenais, como na sensacional “Fits Like A Glove”, que se tornaria uma constante nos shows do grupo nos anos 80. Apesar de seguir o mesmo estilo que o disco anterior, Lick It Up foi capaz de recolocar o KISS nas paradas de sucesso dos Estados Unidos, mostrando que a estratégia de retirar as maquiagens havia dado certo.


Animalize [1984]

Com a saída de Vinnie Vincent, o KISS foi buscar mais um guitarrista para dar continuidade a carreira, e o escolhido foi Mark St. John, um guitarrista mais técnico e refinado que Vincent, que tinha uma pegada mais agressiva e caótica. Contudo, ao contrário de seu antecessor, Mark não teve muito envolvimento na composição das faixas do novo álbum, Animalize. Produzido por Paul Stanley, o disco marcou o começo de uma fase na qual Gene Simmons se afastou um pouco do grupo, investindo mais em sua carreira em Hollywood. Como resultado, as músicas de sua autoria são bem mais fracas que as presentes em discos anteriores, e a única que se destaca é a maravilhosa “While The City Sleeps”.

Entretanto, as faixas compostas por Paul são todas muito boas, como as pesadas “I’ve Had Enough (Into The Fire)” e “Under The Gun”, que seguiam a linha mais heavy metal dos dois discos anteriores; a Led Zeppeliana “Get All You Can Take”; a emotiva e adorada pelos fãs mais die-hard “Thrills In The Night”; e o grande sucesso do disco, “Heaven’s On Fire”. Devido principalmente a boa repercussão da última, Animalize acabou se tornando o disco com maior vendagem da banda nos anos 80, ainda que, para muitos fãs, seja inferior aos dois anteriores.


Asylum [1985]

Aproveitando o bom momento iniciado com Lick It Up e continuado com Animalize, o KISS mudou pouca coisa em sua sonoridade para o lançamento seguinte, Asylum. Efetivando Bruce Kulick como guitarrista solo, a banda manteve a mistura entre músicas mais pesadas e heavy metal e outras mais hard rock e com maior apelo comercial, seguindo a onda hair metal californiana, no novo álbum. A abertura com “King Of The Mountain” mostra todo o talento de Eric Carr, além de também ter um belo refrão. “Anyway You Slice It” e “Secretly Cruel” são as melhores composições de Gene Simmons no disco, e apesar de bem diferentes entre si, ambas têm aquela pegada rock n roll safada da qual Gene sempre foi mestre.

O lado mais pesado e rápido do grupo aparece em “I’m Alive” e “Love Is A Deadly Weapon”, repletas de bumbos duplos de Eric Carr. Asylum teve ainda três singles / videoclipes, para as músicas “Who Wants To Be Lonely”, “Uh! All Night” e “Tears Are Falling”, todos mostrando o visual supercolorido que a banda utilizava na época. Enquanto as duas primeiras não tiveram muita repercussão, “Tears Are Falling” se tornou uma das favoritas dos fãs, sendo incluída em todas as turnês da banda até a reunião da formação original, e ressuscitada em 2004 na Rock The Nation Tour.


Crazy Nights [1987]

Apesar do sucesso de “Tears Are Falling”, Asylum não levou a banda de volta ao status de supergrupo que a mesma tinha em meados dos anos 70 como Paul e Gene planejavam. Para atingir tal objetivo, o produtor Ron Nevison, responsável por ressuscitar a carreira do Heart e levá-los ao topo com o single “What About Love” alguns anos antes, foi recrutado. O resultado desta parceria foi Crazy Nights, que trazia uma sonoridade bem mais leve, polida, recheada de teclados, e que praticamente abandonava a pegada heavy metal presente nos discos anteriores.

O disco tem inicio com o single “Crazy Crazy Nights”, uma música animada e para cima, que teve grande repercussão no Reino Unido. Outro grande momento é “Ill Fight Hell To Hold You”, com uma bela performance de Bruce Kulick e Paul Stanley no auge como cantor. Gene brilha em “Hell Or High Water” e “Thief In The Night”, que, apesar da produção exagerada, têm a sua cara. Há ainda as execelentes “When Your Walls Come Down” e “Turn On The Night”, que seguem uma linha hard rock mais melódica e são donas de belos refrões. Como nem tudo são flores, “Bang Bang You” e “No No No” estão entre as piores músicas já gravadas pela banda, e têm todos os clichês e excessos típicos dos anos 80. “Reason To Live” é a balada do disco, e apesar de adorada por parte dos fãs, está longe de ser uma das minhas favoritas, com suas camas de teclado a la “What About Love”, do Heart. Apesar de todo esforço e investimento em sua produção, Crazy Nights não teve a repercussão esperada por Paul e Gene, vendendo praticamente a mesma quantidade de cópias que os três discos anteriores.


Hot In The Shade [1989]

Em 1989, Gene Simmons e Paul Stanley começaram a, separadamente, reunir material para um novo disco do Kiss. Com a colaboração de muitos parceiros externos, as músicas escolhidas para o novo álbum resgatavam a sonoridade mais rock and roll da banda, abandonando boa parte dos excessos pop do disco anterior, Crazy Nights. A abertura com “Rise To It” deixa essa opção bem clara, com guitarras bem à frente na mixagem, e um refrão marcante. Gene até tenta recuperar sua imagem malvada com músicas pesadas como “Betrayed” e “Boomerang”, mas se dá melhor nas músicas mais sacanas, como “Love Is A Slap In The Face” e “The Street Giveth And Street Taketh Away”.

Eric Carr canta pela primeira vez em um disco da banda em “Little Ceasar”, com um belo desempenho vocal. Mas são as composições de Paul que são as responsáveis pelos melhores momentos do disco. “Silver Spoon” consegue ser rock e grudenta ao mesmo tempo, com um refrão contagiante e a participação de um coral gospel. “King Of Hearts” tem um levada inesquecível, uma letra típica do vocalista e uma performance vocal sensacional. Contudo, os grandes destaques do disco são “Hide Your Heart”, que apesar de não ter conseguido altas posições nas paradas se tornou uma das favoritas dos fãs; e “Forever”, que estorou em todo o mundo, sendo inclusive incluída na trilha sonora da novela Rainha da Sucata, e apresentou a banda a uma geração que nem era nascida quando Alive! foi lançado, em 1975. Infelizmente, Hot In The Shade seria o ultimo disco gravado por Eric Carr, que faleceu devido a um câncer em 1991.


Revenge [1992]

Se Hot In The Shade apontava uma “volta às raízes” para o KISS, em Revenge essa tendência foi solidificada. Apostando em uma sonoridade mais pesada, baseada em riffs de guitarra, e em um visual mais agressivo, com couro e rebites, o disco soava como uma mistura do material dos anos 70 com o peso de Creatures Of The Night. Tudo isso ficava evidente no primeiro videoclipe do álbum, “Unholy”, que tinha um riff magistral e mostrava um Gene Simmons tão assustador quanto o Demon dos anos 70.

Produzido mais uma vez por Bob Ezrin, responsável por Destroyer e The Elder, Revenge tinha ainda mais um convidado ilustre, Vinnie Vincent, co-autor de três faixas, incluindo a supracitada “Unholy”. Gene trouxe ainda a safada “Domino”, uma cópia quase nota por nota de “Nasty Nasty”, do Black N Blue; “Spit” e “Thou Shall Not”, todas excelentes. Paul colaborou com “Take It Off”, “Heart Of Chrome” e “I Just Wanna”, além da bela balada “Everytime I Look At You”. Havia ainda o cover de Russ Ballard “God Gave Rock And Roll To You II”, que conta com backing vocals de Eric Carr, e uma homenagem ao mesmo com “Carr Jam 1981”, com um solo do saudoso baterista. Apesar de extremamente bem recebido pela crítica e pelos fãs, Revenge não teve uma boa vendagem nos EUA, e nenhum hit do porte de “Forever”. Após a turnê do disco e do lançamento do álbum tributo Kiss My Ass, boatos sobre uma reunião da formação original do grupo passaram a ganhar muita força…


Carnival Of Souls: The Final Sessions [1997]

Entre 94 e 95, antes da confirmação da turnê de reunião com a formação original, Paul Stanley, Gene Simmons, Bruce Kulick e Eric Singer estavam trabalhando em um novo disco de estúdio, com previsão de lançamento para o início de 1996. Com a confirmação da reunião, tal disco foi engavetado, entretanto, não demorou muito e cópias piratas do mesmo começaram a aparecer. Então, mesmo com a reunião a todo vapor, em 1997 o disco foi lançado, com o nome de Carnival Of Souls: The Final Sessions. O álbum mostrava um Kiss mais soturno e menos festivo, influenciado pela sonoridade da onda grunge, diriam alguns. Contudo, ainda assim há diversos bons momentos no disco, como as pesadas “Jungle” e “Master & Slave”, ambas de Paul Stanley, e “Hate” e “Seduction Of The Innocent”. Entretanto, não espere escutar a sonoridade clássica da banda aqui, uma vez que o disco soa muito mais como o Soundgarden  ou até mesmo como o Black Sabbath dos anos 70. Outros destaques são a linda balada “I Will Be There”, escrita por Paul para seu filho, e “I Walk Alone”, cantada por Bruce Kulick.


Pyscho Circus [1998]

Com o sucesso da turnê de reunião, os fãs ficaram ansiosos pelo lançamento de um novo disco de inéditas com a formação clássica da banda. E este sonho foi realizado com o lançamento de Psycho Circus, em 1998. Contudo, anos depois se descobriria que a participação de Ace Frehley e Peter Criss no disco teria sido muito limitada, e que a maior parte dos solos de guitarra e linhas de bateria teriam sido gravadas por Tommy Thayer e Kevin Valentine, respectivamente.

Musicalmente, Psycho Circus se mostrava bastante irregular, com os melhores momentos do disco sendo de responsabilidade de Paul Stanley e Ace Frehley. A faixa-título se tornaria um novo clássico para a banda, e as outras músicas de Stanley, como “Raise Your Glasses” e “I Pledge Allegiance To The State Of Rock & Roll” também são excelentes. Ace brilha na única música de sua autoria incluída no álbum, a sensacional “Into The Void”. Contudo, as composições de Gene Simmons, como “Within” e a balada “We Are One”, não empolgam, exceto pela boa “You Wanted The Best”, de autoria do baixista, mas cantada pelos quatro membros. Peter Criss canta ainda a balada “I Finally Found My Way”, que também deixa a desejar. Como curiosidade, vale registrar que Alice Cooper chegou a cogitar processar Paul Stanley por plágio na faixa “Dreamin”, que realmente é muito parecida com “I’m 18”, de Alice. O caso foi resolvido com um acordo entre as partes.


Sonic Boom [2009]

Onze anos após Psycho Circus e depois de inúmeros discos ao vivo, DVDs e turnês, o Kiss finalmente voltava aos estúdios, e pela primeira vez com a formação Paul Stanley, Gene Simmons, Tommy Thayer e Eric Singer. Prometido por Gene Simmons como um disco simples de rock ‘n’ roll, como a banda fazia nos 70, “carne com batatas”, sem experimentações ou invenções, o disco revisita todas as fases da carreira da banda, obtendo ótimos resultados. “Modern Day Delilah” tem um riff que lembra a fase Revenge, enquanto “Russian Roulette” remete aos bons momentos de Gene em Creatures Of The Night. Já “Danger Us” e “Never Enough” fazem a alegria dos fãs da fase oitentista da banda, e a última chega a lembrar “Nothing But A Good Time”, do Poison. O lado sacana de Gene aparece em “Yes I Know (Nobody’s Perfect)” e “Hot And Cold”, que lembram o material composto pelo baixista nos anos 70, como “Calling Dr. Love” e “Ladies Room”. Há ainda uma faixa de Stanley cantada por Eric Singer, a ótima “All For The Glory”, e uma composta e cantada por Tommy Thayer, “When Lightning Strikes”.

O disco se encerra com “Say Yeah”, de Stanley, que tem um refrão inesquecível. Apesar de alguns fãs não gostarem de ver Tommy e Eric com as maquiagens de Ace e Peter, Sonic Boom mostrou que esta formação ainda tem lenha para queimar, e um novo álbum, Monster, é prometido para o ano que vem.


Aproveitando a data, todos nós da Consultoria do Rock gostaríamos de desejar um ótimo Natal para os nossos amigos, leitores e colaboradores!

6 comentários sobre “Discografias Comentadas: Kiss – Parte II

  1. Feliz Natal pessoal da Consultoria do Rock. Sou leitor assíduo, visito o blog diariamente e curto muito! Valew

  2. De maneira alguma desmereço a fase inicial do Kiss, que sedimentou sua reputação como uma das mais importantes bandas da face da terra, responsável por fazer muita gente pegar em instrumentos pela primeira vez na vida, mas não escondo que tenho um grande apreço pela fase sem máscaras. Mesmo inspirados por grupos que outrora haviam sido influenciados por eles, o Kiss conseguiu segurar a peteca no ar, e os pontos baixos que alguns insistem em apontar não são tão baixos pra mim, com exceção talvez de "Crazy Nights", o disco que menos gosto dessa fase farofada.

    Talvez o maior motivo para que eu tenha essa queda é a participação mais efetiva de Paul Stanley, meu compositor e vocalista favorito da banda, mas também não se pode desmerecer a particpação de caras como Vinnie Vincent, Eric Carr, Bruce Kulick e Eric Singer, outras peças importantíssimas. O que Vinnie está tocando em "Lick It Up" é algo, com fluidez e muito bom gosto, ajudando a torná-lo um de meus favoritos do grupo. "Exciter", "A Million to One", "Not For the Innocent", "Lick It Up"… sacanagem!

    "Animalize", "Asylum", "Crazy Nights" e "Hot in the Shade"
    podem ser muitas vezes criticados, mas são cheios de meterial que me agrada ("Crazy Nights" menos): "I've Had Enough (Into the Fire)", "Under the Gun", "Thrills in the Night", "Who Wants to Be Lonely", "Tears Are Falling", "King of the Mountain", "Turn on the Night", "Rise to It", "Forever"… sem falar na minha favoritaça do grupo: "Hide Your Heart"!

  3. Da discografia do Kiss aqui apresentada, o único que nunca tinha ouvido com calma foi o Crazy Nights. Consegui o mesmo e não é que gostei dele? Discordo que “No No No” seja uma das piores músicas gravadas pela banda, etambém de que o disco é menos pesado que seus antecessores. Há várias faixas boas, como “My Way”, “I’ll Fight Hell to Hold You”, “Bang Bang You”, “When Your Walls Come Down”, e apesar da tecladeira da xarope “Reason to Live”, é um belo disco. Forte candidato a melhor da fase Kulick (ao lado de Revenge e Carnival of Souls), e muito superior a Lick It Up, Hot in the Shade e Animalize

  4. Li a matéria e achei interessante comentar:

    Excelentes (acima de qualquer suspeita): KISS, HOTTER THAN HELL, DRESSED TO KILL, DESTROYER, ROCK AND ROLL OVER, LOVE GUN, CREATURES OF THE NIGHT, REVENGE.

    Bons (não comprometem a banda em nenhum momento): LICK IT UP, PSYCHO CIRCUS, SONIC BOOM, MONSTER.

    Fracos (por culpa do Gene Simmons e suas músicas bisonhas): ANIMALIZE, ASYLUM, HOT IN THE SHADE.

    Injustiçados, incompreendidos, polêmicos (aqui é 8 ou 80): DYNASTY, UNMASKED, THE ELDER, CARNIVAL OF SOULS.

    1. Cometi uma injustiça esqueci do CRAZY NIGHTS, ele deve estar entre o THE ELDER e CARNIVAL OF SOULS. Pronto!!!

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