Cinco Discos Para Conhecer: Templos do Rock – Rockpalast


Por Marcello Zapelini
OK, aqui estou trapaceando um pouco, admito. O Rockpalast não é um auditório, arena ou teatro, e sim um programa de TV alemão (da rede WDR de Colônia) que apresenta shows gravados por bandas locais ou estrangeiras registrados em diferentes teatros e auditórios em várias cidades da Alemanha. A lista de músicos que se apresentou lá é impressionante, e extremamente variada: não só os grandes nomes do krautrock, mas bluesmen como Muddy Waters, jazzistas como o Weather Report, bandas de punk, new wave, heavy metal, progressivo, chegando aos dias de hoje.

Criado em 1974 Criado em 1974 pelo jornalista musical alemão Peter Rüchel (1937-2019), o Rockpalast apresenta semanalmente um concerto diferente, e durante anos virou Rocknacht, com shows de várias bandas durando a noite inteira. Retransmitido para toda a Europa por meio da Eurovision, o Rockpalast tem uma audiência estimada em 25 milhões de pessoas por apresentação. No site oficial (infelizmente em alemão, sem opção de outro idioma – se você não fala a língua de Michael Schenker, precisa recorrer à tradução do Google para entender alguma coisa), há uma lista de grupos e músicos que se apresentaram no Rockpalast, e navegando por ela me surpreendi ao ver que nem Deep Purple nem Uriah Heep tiveram qualquer show transmitido no programa (Black Sabbath comparece com uma
apresentação da sua turnê “The End”).
Ao longo dos anos, centenas de álbuns foram lançados contendo shows registrados no Rockpalast, a maioria pelo selo alemão MIG_Music GmbH, embora alguns tenham saído por outro selo alemão, o famoso Repertoire Records, especializado em reedições. Embora não seja regra geral, a maior parte dos lançamentos é formada por combos CD+DVD, muitas vezes CDs duplos. Curiosamente, o do UFO mencionado nesta seção teve o DVD e o CD lançados em separado. Eu, como sempre, adotei o critério de destacar meus artistas favoritos para escolher os cinco discos gravados no Rockpalast; como não podia deixar de fazer, incluí alguns bônus. Após quebrar a cabeça para decidir qual seria o critério para definir quem entraria nos bônus, optei por incluir apenas artistas alemães como uma forma de homenagear a terra natal do programa.
ALVIN LEE & TEN YEARS LATER – Live at Rockpalast (1978, lançado em 2013)
Após o fim do Ten Years After no início de 1975, Alvin Lee, que já tinha gravado On The Road to Freedom com o cantor gospel americano Mylon Lefevre e In Flight com o Alvin Lee & Co., saiu em carreira solo, e depois experimentar com diferentes músicos, formou, em 1977, o Ten Years Later com o baixista Mick Hawksworth e o baterista Tom Compton. O trio não perdeu tempo: lançou Rocket Fuel em 1978, saiu em turnê, e em abril, Alvin gravaria pela primeira e única vez no Rockpalast. Pouco depois de sua morte em 2013, este combo CD+DVD foi lançado. Gravado em Essen, o show possui um repertório que mistura músicas do Ten Years After como “Help Me” (o blues de Sonny Boy Williamson não é tão extenso aqui quanto nos shows do TYA, mas dá oportunidade para Lee voar alto), “I’m Going Home” (não podia faltar!) e “Choo Choo Mama”, com covers e o material recente do Ten Years Later como “Gonna Turn You On”, que abre bem animada os trabalhos, e “Ain’t Nothin’ Shakin’”, composição original de Alvin que inclui um interlúdio instrumental em que ele brinca com alguns riffs famosos e dá a chance a Compton (futuro baterista de Johnny Winter) de brilhar com um bom solo. “Just Another Boogie” é basicamente o que o nome diz, com o excelente Hawksworth (ex-Andromeda e ex-Fuzzy Duck) mostrando toda a sua habilidade no baixo de 6 cordas, com direito ao tema da Pantera Cor-de-Rosa. Alvin presta homenagem ao amigo – e ídolo – Jimi Hendrix com uma bela versão para “Hey Joe” (uma versão ao vivo gravada em show diferente seria lançada por Alvin em seu Ride On, de 1979), e após desviar o show para o TYA com “I’m Going Home” e “Choo Choo Mama” (em versão incompleta), ele envereda pelo seu amado rock dos anos 50 com versões para “Rip it Up”, “Sweet Little Sixteen” e “Roll Over Beethoven”, que encerra a apresentação incendiando o público alemão. Nos anos seguintes, Alvin Lee lançaria mais discos solo, inclusive um ótimo ao vivo em Viena, mas infelizmente nunca recuperaria o prestígio que alcançara em seus tempos do Ten Years After. Este álbum ajuda a manter vivo sua guitarra incendiária.
Alvin Lee (guitarra, vocais), Mick Hawksworth (baixo), Tom Compton (bateria)
Intro
Gonna Turn You On
Help Me
Ain’t Nothin’ Shakin’
Just Another Boogie
Hey Joe
I’m Going Home
Choo Choo Mama
Rip It Up
Sweet Little Sixteen
Roll Over Beethoven
Gonna Turn You On
Help Me
Ain’t Nothin’ Shakin’
Just Another Boogie
Hey Joe
I’m Going Home
Choo Choo Mama
Rip It Up
Sweet Little Sixteen
Roll Over Beethoven
MOLLY HATCHET – Live at Rockpalast 1996 (lançado em 2013)
Este álbum foi gravado ao ar livre em Loreley e traz a banda reformulada após a saída de Danny Joe Brown por causa de problemas de saúde. Nenhum dos integrantes dessa versão do Molly Hatchet pertence à formação original: apenas o tecladista John Galvin (no grupo até hoje), que entrara em 1985, e o guitarrista Bobby Ingram (que passara a integrar o grupo no começo dos anos 90) tinham um passado no grupo, que se completa com Phil McCormack nos vocais, Bryan Bassett na guitarra, Andy McKinney no baixo, Mac Crawford na bateria, e duas backing vocals, Leslie Hawkins (veterana das Honkettes que acompanharam o Lynyrd Skynyrd nos anos 70) e Theresa McCoy. O álbum, infelizmente, não traz o DVD (que foi lançado em separado) para que se possa ter uma ideia de como era o show do grupo na época, mas o fato é que não falta energia. Clássicos como “Bounty Hunter”, o grande hit do grupo (“Flirtin’ with Disaster”), a ótima “Fall of the Peacemakers”, as versões para “Dreams” (da Allman Brothers Band) e “It’s All Over Now” (hit dos Rolling Stones nos anos 60 composto por Bobby Womack) se mesclam com músicas mais recentes como “Devil’s Canyon” e “Down from the Mountain” (que mostram que a banda continuava afiada), indicando que o Molly Hatchet, mesmo muito modificado, conseguia fazer um ótimo show, cheio de energia e furor, com destaque para o vocal de McCormack, que conseguia reproduzir bem o grunhido de Danny Joe Brown, ao passo que as guitarras de Ingram e Bassett se harmonizam e se entrelaçam, cada um empurrando o outro para as alturas. McCormack comanda a plateia e ainda faz uma bela introdução na harmônica para a clássica “Whiskey Man”. O Molly Hatchet sempre foi o mais pesado dos grupos de Southern rock, e este Live at Rockpalast 1996 mantém esse peso, ainda que em alguns momentos a intensidade diminua. Mas na maior parte do tempo, você vai berrando “Hell Yeah!” com Phil McCormack. O Molly Hatchet receberia de volta um dos guitarristas originais, Dave Hlubek, posteriormente (que veio a falecer em 2017). Atualmente, com Parker Lee nos vocais (McCormack, com sérios problemas da saúde, teve que se afastar do grupo e infelizmente morreu em 2019), Ingram e Galvin mantêm o grupo rodando por aí, embora o último álbum de estúdio tenha saído em 2010. A morte em 2020 do último membro original, o guitarrista Steve Holland, fez com que todos os fundadores do grupo se encontrassem na grande jam session do céu. Esse álbum ao vivo de 1996 é um bom registro da segunda fase da carreira do Molly Hatchet.
Phil McCormack (vocais), Bobby Ingram (guitarras), Bryan Bassett (guitarras), John Galvin (teclados), Andy McKinney (baixo), Mac Crawford (bateria)
Leslie Hawkins (backing vocals), Therisa McCoy (backing vocals),
Bounty Hunter
It’s All Over Now
Gator Country
Rolling Thunder
Devil’s Canyon
Down From The Mountain
Whiskey Man
Dreams I’ll Never See
Fall Of The Peacemakers
The Journey
Flirtin’ With Desaster
UFO – Live at Rockpalast (1980, lançado em 2015)
Esse inicialmente teve o DVD e o CD lançados em separado; aliás, por muito tempo pensei que apenas o DVD tinha sido disponibilizado oficialmente. O UFO fizera sucesso na Alemanha e no Japão antes mesmo de na Inglaterra, ainda com Mick Bolton na guitarra, e a participação de Michael Schenker consolidou sua fama no país, mas aqui a banda apresenta seu substituto Paul Chapman na guitarra solo – e por mais que eu adore o trabalho de Schenker, Paul não deixa a desejar em relação a seu antecessor, consolidando o UFO como uma das melhores bandas para ouvir quando se quer uma guitarra bem tocada. Gravado no Westfalenhalle de Dortmund em novembro de 1980, o show apresenta a formação com os fundadores Phil Mogg (vocal), Pete Way (baixo) e Andy Parker (bateria), o mencionado Paul Chapman na guitarra solo e Neil Carter nos teclados, guitarra rítmica e vocal (aliás, esse álbum é provavelmente o mais antigo ao vivo oficial com Carter no lugar de Paul Raymond, que se mandara para o Michael Schenker Group – ele vai aparecer aqui mais tarde, não se preocupem). UFO era uma banda absolutamente sensacional ao vivo, e a apresentação no Rockpalast não é uma exceção. A banda tinha atingido o auge com o fantástico Strangers in the Night e não deixou a peteca cair com No Place to Run. A primeira música é “Lettin’ Go”, justamente do então novo disco, mostrando que o UFO não perdera seu poderio com as mudanças de formação. De No Place… ainda são apresentadas “Mystery Train” (com Chapman dando um showzinho no violão na introdução – ainda que versões posteriores sejam mais longas) e a faixa-título; da “era Chapman” ainda se tem “Long Gone” e “Makin’ Moves”, que sairiam no disco seguinte (The Wild, The Willing & The Innocent). As outras 7 músicas apresentadas vêm dos discos com Schenker, como “Cherry” e “Only You Can Rock Me” (de Obsession), “Lights Out”, “Too Hot to Handle” e “Love to Love” (de Lights Out), “Doctor Doctor” e “Rock Bottom” (de Phenomenon). O então “novo UFO” transbordava de energia, com Chapman, Way e Carter agitando bastante o público junto de Mogg, enquanto o eternamente subestimado Parker segurava as pontas. Quando assisti o DVD pela primeira vez, não conhecia o poderio do UFO com Chapman e Carter ao vivo, e fiquei esperando por “Rock Bottom” – afinal, essa era o grande momento de brilho de Schenker nos shows antigos; o novo guitarrista não voava tão alto, mas não decepcionou. Mas, para mim, o grande destaque é mesmo a versão matadora de “Mystery Train”; além de toda a banda estar simplesmente perfeita, os solos de Paul no violão e na guitarra são fenomenais. Essa versão do UFO acabaria em 1983; a banda voltaria algumas vezes, mas nunca mais se reuniria com Chapman. Neil Carter voltaria ao UFO após a morte de Paul Raymond, e a banda nos anos 90 e 2000 ainda teria momentos de brilho, mesmo depois de perder Pete Way. Infelizmente, a saúde de Mogg impediria a banda de concluir sua turnê de despedida, mas pelo menos sobraram coisas ótimas como este show em Dortmund.
Phil Mogg (vocais), Pete Way (baixo), Paul Chapman (guitarra), Neil Carter (teclados, guitarras), Andy Parker (bateria)
Lettin’ Go
Long Gone
Cherry
Only You Can Rock Me
No Place To Run
Makin’ Moves
Love To Love
Mystery Train
Too Hot To Handle
Lights Out
Rock Bottom
Doctor, Doctor
VAN DER GRAAF GENERATOR – Live at Rockpalast (2005, lançado em 2018)
Este show foi gravado em Leverkusen na turnê de reencontro da formação clássica do VdGG: Peter Hammill no vocal, guitarra e teclados, David Jackson nos saxes e flauta, Hugh Banton no órgão e baixo e Guy Evans na bateria; o quarteto se reunira para gravar o álbum duplo Present, que inclui um disco com músicas novas e outro com improvisos feitos no estúdio. Tanto o CD quanto o DVD têm ótima qualidade de gravação, e é comovente ver os quatro veteranos juntos novamente; ao longo dos anos, Jackson, Banton e Evans colaboraram com Peter Hammill em seus discos-solo, mas os quatro não tocavam juntos desde o início de 1977. O repertório revisita quase toda a discografia da banda (apenas Aerosol Grey Machine e The Quiet Zone, The Pleasure Dome não são representados), e a banda começa logo interpretando as duas músicas que compunham o lado A de Godbluff, “The Undercover Man” e “Scorched Earth” – posteriormente, do mesmo disco, revisitam “The Sleepwalkers”, com direito ao famoso cha-cha-cha no interlúdio instrumental. “Lemmings” (trazendo a introdução mais longa de guitarra de Hammill) e “Man Erg” (com Hammill ao piano) representam Pawn Hearts, e da fase inicial da carreira do grupo também se tem as ótimas “Darkness” (do 2º LP, The Least We Can Do Is Wave To Each Other) e “Killers” (de H To He, Who Am The Only One). Still Life comparece com “Childlike Faith”, e “Wondering” encerra o show da mesma maneira que fizera no último disco da formação clássica até 2005, World Record. “Present” está presente (desculpem, não resisti) com “Every Bloody Emperor” e “Nutter Alert” (em que Jackson se destaca no sax tenor). O tempo não diminuiu a intensidade da banda: Hammill está em ótima voz, Jackson continua dando um show à parte com seus saxes e flautas, Banton é um dos organistas mais subestimados do rock e o carequinha Evans mostra toda sua versatilidade na bateria. A turnê de reencontro já tinha sido registrada em vídeo e áudio no álbum duplo Real Time, gravado em Londres, que traz um show mais longo, mas esse Live at Rockpalast é uma excelente adição à discografia do VdGG, e nenhum fã deve deixá-lo de lado por seu repertório já estar em Real Time – David Jackson é categórico ao afirmar sua preferência pelo disco gravado na Alemanha. Uma apresentação de Hammill com seu K Group na década de 80 também foi lançada na coleção do Rockpalast, mas ainda não tive a chance de obter um exemplar.
Peter Hammill (teclados, guitarras, vocais), David Jackson (saxofone, flautas), Hugh Banton (órgão), Guy Evans (bateria)
The Undercover Man
Scorched Earth
Every Bloody Emperor
Lemmings C
Darkness
Childlike Faith
The Sleepwalkers
Nutter Alert
Man Erg
Killer
Wondering
WISHBONE ASH – Live at Rockpalast 1976 (lançado em 2019)
Gravado no Sporthalle em Cologne (Colônia), este show com cerca de 90 minutos traz a segunda formação do grupo, com Laurie Wisefield na guitarra e vocal e os fundadores Martin Turner (baixo, vocal), Steve Upton (bateria) e Andy Powell (guitarra, vocal), e foi disponibilizado em CD duplo acompanhado de DVD. O ano de 1976 tinha sido complicado para a banda, que lançara em abril Locked In, considerado um dos seus mais fracos discos, e em outubro, New England, que melhorou um pouco as coisas. Ao vivo, entretanto, o grupo continuava bem. O álbum gravado no Rockpalast traz cinco músicas do disco mais recente (“Runaway”, “Lorelei”, “(In All of My Dreams) You Rescue Me”, “Outward Bound”, “Mother of Pearl”), mas apenas “It Started in Heaven” representa Locked In. Da obra-prima do grupo, Argus (1972), inclui-se “The King Will Come”, “Warrior”, “Time Was” (em versão reduzida, sem a introdução acústica) e “Blowin’ Free”, e o show se completa com “Persephone”, extraída de There’s the Rub (estreia de Wisefield no grupo), “Jailbait” (de Pilgrimage) e o b-side “Bad Weather Blues”. Tirando o ridículo visual de pirata maquiado de Martin Turner (acho que Malcolm McLaren deve ter tirado uma ideia para o Adam And The Ants daí…), o show é fantástico, com Wisefield e Powell, naturalmente, chamando a atenção com suas guitarras incendiárias e Martin bastante seguro nos vocais. Como sempre, o batera Upton se mostra mais pesado do que em estúdio e segura os ritmos para os guitarristas voarem alto. O show começa com as guitarras de Wisefield e Powell levantando o público em “Runaway”, que vibra bastante quando os dois guitarristas introduzem “The King Will Come”. A instrumental “Outward Bound” mostra bem o entendimento entre Laurie e Andy, Martin se destaca com belo vocal em “You Rescue Me”, Andy ganha seu momento no vocal solo em “Bad Weather Blues”, fazendo o público alemão participar – e as guitarras gêmeas brilharem. Também se pode destacar Wisefield mostrando sua voz suave em “It Started in Heaven” – a música é meio tolinha, mas não chega a comprometer. O final estendido de “Blowin’ Free”, como sempre, traz os guitarristas se desafiando, e “Lorelei” mostra a habilidade de Laurie na slide guitar. O Wishbone Ash é uma banda muito bem servida em termos de álbuns ao vivo, e o ano de 1977 é marcado por várias gravações, mas de 1976 não há muita coisa (mesmo a gigantesca box set At the BBC 1970-1988 traz apenas cinco músicas gravadas nesse ano). Além disso, embora existam muitos DVDs recentes, registros em vídeo dos anos 70 são relativamente raros. Live at Rockpalast 1976 dá aos fãs do grupo a chance de revisitá-lo em seus anos de glória.
Andy Powell (guitarras, vocais), Laurie Wisefield (guitarras, vocais), Martin Turner (baixo, vocais), Steve Upton (bateria)
Runaway
The King Will Come
The Warrior
Lorelei
You Rescue Me
Persephone
Outward Bound
Mother Of Pearl
It Started In Heaven
Time Was
Blowin’ Free
Bad Weather Blues
Jail Bait
Bonus tracks
O rock alemão, do final dos anos 60 para cá, sempre nos brindou com ótimas bandas como Accept, Can, Helloween, Kraftwerk, Nektar (sim, eu sei que eles são ingleses, mas fizeram sua carreira na Alemanha), Scorpions e Tangerine Dream. O Rockpalast sempre abriu as portas para os músicos locais, o que justificaria uma homenagem especial. Para os bônus desta seção, pensei em homenagear alguns dos meus favoritos do krautrock, trazendo Inga Rumpf (que liderou duas bandas alemãs que adoro, Frumpy e Atlantis) e Jane (numa versão mais recente – não achei gravação da banda original), bem como o segundo melhor guitarrista alemão de todos os tempos, Michael Schenker.
INGA RUMPF – Live at Rockpalast 2006 (Lançado em 2024)
Inga Rumpf começou a ficar conhecida como vocalista da (ótima) banda alemã Frumpy no começo dos anos 70, com uma sonoridade que misturava prog, hard e um pouco de psicodelia. Posteriormente, derivando sua carreira para um estilo mais voltado para o blues e o soul, formou o Atlantis com alguns remanescentes do Frumpy, partindo para a carreira solo em 1975. Em 2006, ela foi convidada para abrir os shows de B. B. King na Alemanha e registrou este show em Bonn como Inga Rumpf & Friends, em que se destacava o excelente Jean-Jacques Kravetz no órgão, Joe Dinkelbach (teclados), Mathias Pogoda (guitarra), Thomas Biller (baixo) e Helge Zumdieck (bateria). Além de cantar, Inga ainda se acompanha (muito bem, aliás) na guitarra. A moça que um dia foi chamada de “Primeira-Dama do Rock Alemão” já era uma simpática e sorridente senhora de 60 anos nesta gravação, e, ainda que sua voz tenha envelhecido um pouco, ainda está em ótima forma ao revisitar material de toda a sua carreira, com direito a composições originais (Inga é autora ou coautora de boa parte do repertório) gravadas com o Atlantis (como a abertura “Let’s Get on the Road Again” e “Rock’n’Roll Preacher”), com o Frumpy (“How the Gypsy was Born”, a versão para “Backwater Blues”, de Bessie Smith, que a banda só tinha registrado em seu álbum ao vivo), bem como de sua carreira solo (como a faixa-título de “My Life is a Boogie”). Além disso, ela revisita clássicos como “It’s a Man’s World”, de James Brown, e “Undercover Agent for the Blues”, de Tony Joe White, gravada originalmente por ninguém menos que Tina Turner, comprovando sua versatilidade como intérprete. O álbum é uma bela aula de rock e blues, interpretada com alma por uma ótima cantora que sempre soube se acompanhar por excelentes músicos e escolher um bom repertório. Não conheço a carreira solo de Inga, mas seu trabalho com o Frumpy e com o Atlantis a tornou uma das minhas cantoras alemãs favoritas. O website oficial de Inga, além de pouco informativo, parece não ter sido atualizado nos últimos tempos, mas até bem recentemente ela estava na ativa, pois lançou Universe of Dreams em 2021, um CD duplo composto por um disco de músicas inéditas e um adicional contendo raridades, demos e músicas gravadas ao longo de vários anos, que comemorou seu 75º aniversário. Vários músicos conhecidos aparecem no álbum, mas não poderia deixar de destacar o fato de que ela é acompanhada (em músicas diferentes) por ninguém menos que os três guitarristas dos Rolling Stones, Keith Richards, Mick Taylor e Ronnie Wood.
MICHAEL SCHENKER GROUP – Live at Rockpalast 1981 (lançado em 2010)
Gravado em Hamburgo, este show gravado em Hamburgo traz o MSG em sua configuração com Gary Barden (vocal), Cozy Powell (bateria), Chris Glen (baixo) e Paul Raymond (teclados e guitarra), além, é claro, do chefe Michael Schenker, em repertório que inclui não somente material não só do próprio grupo, mas também quatro músicas do UFO. Em comparação com One Night at Budokan, o duplo ao vivo do grupo lançado em 1982 com a mesma formação que se apresenta neste álbum, Live at Rockpalast reprisa “Armed and Ready”, “Cry for the Nations”, “Into the Arena”, “Victim of Illusion”, “Lost Horizons” e “Rock Bottom”, e, como novidades, oferece “Natural Thing” (em uma versão bem mais acelerada do que a original do UFO), “Feels Like a Good Thing” e “Lookin’ Out from Nowhere” (ambas do primeiro álbum do MSG), além de “Doctor Doctor” e “Lights Out”, clássicos do UFO. Um detalhe que me saltou aos olhos é que o papo com a plateia é feito ou por Bardens ou por Paul Raymond – e este inclusive pede desculpas por falar em inglês; fico pensando por que Schenker não se dirige ao público no seu idioma nativo! No geral, considero o show do Rockpalast superior ao do Budokan em termos de energia e entrega da banda (Cozy Powell, sobretudo, está em plena forma do começo ao fim do show), mas a qualidade de gravação não é tão boa – os teclados de Raymond, principalmente, estão um pouco baixos na mixagem em várias músicas (sua guitarra, entretanto, não sofre do mesmo problema). As versões de “Armed and Ready”, “Cry for the Nations” e “Into the Arena” são melhores nesse disco do que no “One Night…”, em especial a instrumental. Quanto aos clássicos do UFO, cabe uma ressalva: embora o instrumental seja de primeira qualidade, os vocais de Bardens não são tão bons quanto os de Phil Mogg, e em “Doctor Doctor” mostram-se dolorosamente inadequados. Gary, aliás, termina o show com a voz bem ruim. Registrado antes do segundo disco do grupo, este Live at Rockpalast é um ótimo registro do Michael Schenker Group em sua configuração mais famosa, e Schenker e Powell, em especial, estão a todo vapor. É verdade que Chris Glen também não foi favorecido pela mixagem, mas Paul Raymond confirma sua excelência, desempenhando bem tanto na guitarra quanto nos teclados (quando audíveis). Mesmo que você tenha One Night at Budokan, vale a pena ir atrás deste.
PETER PANKA’S JANE – Live at Rockpalast 2004 (lançado em 2017)
O Jane era uma banda que teve alguns discos ótimos lançados na primeira metade dos anos 70, decaiu um bocado na metade seguinte da década, acabou, voltou, e rachou ao meio, passando a ser liderado pelo baterista Peter Panka até sua morte. Este show foi gravado em Bonn e traz Panka no vocal e bateria, Charly Maucher no baixo, Werner Nadolny nos teclados e backing vocals, e Klaus Walz na guitarra e backing vocals. Nadolny e Maucher fizeram parte do grupo nos anos 70, tocando em alguns discos na longa e confusa história da banda. Essa mesma formação aparece em outros dois álbuns ao vivo oficiais do grupo, Live 2002 e Live at Metas (2006), este último gravado na última turnê da banda com Peter Panka. No começo da carreira, o Jane fazia uma espécie de hard prog rock, e seus álbuns entre 1972 e 1977 são uniformemente bons, destacando o belo trabalho de guitarra e teclados que fez a marca registrada da banda. A maior parte do repertório revisita esse período clássico, com destaque para as excelentes “Daytime” e “Hangman”, do primeiro álbum (Together, de 1972), as duas músicas de Fire, Water, Earth, & Air (1976), a bela “Out in the Rain”, da obra-prima do grupo, Here We Are (1973). Gravado em Bonn, o álbum mantém um nível uniformemente elevado do início ao fim, com destaques para os teclados e guitarra se entrelaçando no medley “Windows/Spain” (a primeira música aparentemente nunca registrada em estúdio, a segunda proveniente do primeiro LP), para o novo solo de guitarra de Klaus Walz em “Hangman”, inclusive dando espaço para Maucher fazer um curto solo no baixo (mas admito que prefiro o original de Klaus Hess), para o trabalho de Nadolny, que não voa muito alto, mas brilha o tempo todo com seu órgão, e para as vozes dos músicos que se harmonizam bem em momentos como o encerramento em “So So Long”. Dos músicos que gravaram este álbum, apenas Walz ainda está vivo, e excursiona como Peter Panka’s Jane, apesar do baterista ter morrido em 2007; Nadolny saiu pouco depois da morte do colega, e passou a liderar sua própria versão do grupo como Werner Nadolny’s Jane, vindo a falecer em 2023 (e sua versão da banda também está ativa). O fundador do grupo, o guitarrista e vocalista Klaus Hess, após sair do grupo em 1982, participou de um retorno em 1992 e depois se afastou da música (imagino que ele se arrependa de não ter registrado a marca do grupo em seu nome…).


