Deep Purple – Perfect Strangers Live (CD / DVD) [2013]

Deep Purple – Perfect Strangers Live (CD / DVD) [2013]

Por Davi Pascale

Um dos momentos mais difíceis de um artista é quando retoma sua carreira depois de uma longa pausa. Vários questionamentos começam a rondar sua cabeça. “Será que ainda há interesse no que fazemos?”, “Será que conseguiremos causar o mesmo impacto?”, “Será que a nova geração irá se ligar em nosso trabalho?”, “Será que conseguiremos nos reinventar?”. Essas são as perguntas mais frequentes, ainda mais quando você teve um passado glorioso. Em 1984, o Deep Purple soltava nas lojas o LP Perfect Strangers. A prova viva de que é possível sim, olhar para frente, conquistar um novo público, mesmo depois de uma férias de 9 anos, e entregar um grande álbum.

Nove anos, aliás, levando em conta o registro que até então era o único sem o guitarrista Ritchie Blackmore: Come Taste The Band, gravado com Tommy Bolin. Perfect Strangers marcava não apenas a volta da banda, marcava o retorno da famosa MK II. Se formos contar o último registro com essa formação havia uma diferença de 11 anos entre um trabalho e outro. Hoje, Gillan e Blackmore são inimigos mortais, mas nessa época os dois se davam bem. Ian Gillan solta vários sorrisos para o guitarrista no palco e chega até a brincar com o musico em determinados momentos.

Interessante notar a diferença de mentalidade daquele tempo para os dias atuais. O DVD além de trazer a apresentação na íntegra, traz um curto documentário com imagens de entrevistas da época. Em determinado momento, a repórter dispara: “Desculpe-me fazer essa pergunta. Sei que pode soar ofensiva. Vocês não acham que estão velhos para isso?”. As imagens focavam os anos de 84 e 85 (ou seja, o período do lançamento do disco). Nessa época, os músicos estavam próximos dos 40 anos de idade. Alguns um pouco mais, outros um pouco menos. Hoje, uma pessoa nesse faixa de idade é considerada jovem ainda.

 

Registro marca a volta da lendária Mark 2 aos palcos
Registro marca a volta da lendária Mark 2 aos palcos

 

Outro depoimento interessante é o momento onde os músicos comentam a diferença da geração dos anos 70 para a dos anos 80. Diziam que não se identificavam com o heavy metal que estava sendo feito naquela época e que não entendiam essa mentalidade do cara que ouve heavy metal não poder frequentar shows de outros estilos, que 10 anos antes isso não existia. Sempre com aquela mentalidade da década passada como sendo algo distante. Parece aquele conversa de avós. “No nosso tempo…”. De todo modo, concordo com a critica dos músicos em relação ao publico.  Já em relação ao estilo, não concordo muito, não…

O registro serve para demonstrar também o quão incômodo continuavam sendo. Há imagens de fanáticos religiosos dizendo que a música que faziam era diabólica e logo em seguida Gillan pedindo, no meio de uma apresentação, para que os policiais fossem embora porque estavam criando tumulto onde não havia. No decorrer dos anos, infelizmente, veríamos essa perseguição com mais alguns artistas. Não foram os primeiros, nem os últimos.

É impressionante notar o poder de fogo que tinham nessa época. Energia realmente incrível!! Muitos gostam de dizer que Steve Morse é melhor do que Blackmore, como se musica fosse competição e como se técnica fosse tudo. Mas já que o assunto é inevitável, prefiro 1.000 vezes Ritchie ao exímio músico do Dixie Dregs. Steve pode ser mais técnico, mas considero Blackmore muito mais criativo (que digam os memoráveis e inúmeros riffs criados pelo rapaz durante sua trajetória com o grupo) e me passava mais emoção nas interpretações. Pode ser maluco, egocêntrico, o que for, mas fazia a diferença. Sua performance aqui é espetacular. Aliás, mais do que isso, diria que ele é o grande destaque do show. O rapaz, simplesmente, brilha em canções como “Under The Gun”, “Space Truckin´” e “Strange Kind of Woman”, faixa que considero o grande destaque da noite.

 

Músicos estavam em ótima fase
Ritchie Blackmore é o grande destaque do show

 

O instrumental não tem o que tirar, nem por. Como já era de se esperar, os músicos soam perfeitos. Roger Glover entregava uma performance sólida. Ian Paice e Jon Lord faziam seus olhos brilharem quando tinham seus momentos de destaque. Contudo, Ian Gillan não estava em sua melhor fase. Nessa turnê, ele ainda não cantava com falsete, como passou a fazer a partir da tour de Battle Rages On. Aqui, ainda tentava subir nos agudos. O problema é que tinha hora que chegava e hora em que batia na trave. Quando cantava notas mais altas, parecia estar lutando com sua própria voz. A situação melhorava em “Knockin´ At Your Back Door” e “Lazy”, onde fizeram um tom abaixo, mas ainda me pergunto para que insistirem em “Child In Time”. Na hora dos agudos, o cantor usava e abusava de reverb e em alguns momentos contava com backtracking. Com tanta música para explorar, não dá para entender… Não me levem a mal, considero o Gillan uma das grandes vozes do rock, o tenho como um ídolo, mas aqui sua voz já começava a demonstrar cansaço. Ainda bem que soube se reinventar pouco tempo depois.

O show daqui foi registrado em Melbourne e misturava clássicos da banda com sons de seu (até então) novo álbum. Gostei muito de ouvir músicas como “Nobody´s Home”, “Under The Gun” e “A Gypsy´s Kiss”. Legal ver os caras explorando bastante o disco no repertório. Interessante também ver Blackmore trazendo um trecho de “Difficult to Cure” (Rainbow) para o set. Pode-se até questionar se havia necessidade de estar ali, mas não deixa de ser curioso. Meu único senão é que acho que deveriam ter colocado de bônus (ao menos no CD), o áudio de George Harrison tocando “Lucille” com eles no show de Sydney. Baita momento histórico que segue perdido. De todo modo, o registro é indispensável para os fãs do grupo e traz um momento singular da banda.

Faixas:

  1. Highway Star
  2. Nobody´s Home
  3. Strange Kind of Woman
  4. A Gypsy´s Kiss
  5. Perfect Strangers
  6. Under The Gun
  7. Knocking At Your Back Door
  8. Lazy
  9. Child In Time
  10. Difficult to Cure
  11. Jon Lord Solo
  12. Space Truckin´
  13. Black Night
  14. Speed King
  15. Smoke On The Water

2 comentários sobre “Deep Purple – Perfect Strangers Live (CD / DVD) [2013]

  1. Essa questão da perspectiva de tempo é curiosa, realmente. A banda estava ausente há nove anos no mercado, e já era considerada “acabada” na época. Hoje, uma banda fica oito anos sem lançar discos e é considerada “ativa”, de forma normal!

    Blackmore pode ser o que for em termos de personalidade, mas, no palco, ainda é o guitarrista mais impactante que já assisti ao vivo (com o Rainbow da fase Doggie White, em 1996). O cara é (ou era) um verdadeiro maestro em cena, comandando os outros caras e mandando ver em notas e solos “impossíveis” na guitarra. Já vi Gilmour, Satriani, Santana, May, Lifeson e uma porrada de outros “craques” (inclusive o citado Morse, que, a meu ver, não tem nem comparação com Blackmore em termos de estilo e capacidade criativa), e nenhum me impactou tanto quanto o senhor Ricardinho Maispreto!

    Esse DVD específico eu nunca assisti, só conheço o áudio, e acho que a MKII estava, na época, ainda em uma fase relevante. Perfect Strangers é um disco interessante (embora o mais fraco dessa formação até então), mas o posterior The House of Blue Light é muito fraco, ainda mais para uma banda do porte do Púrpura Profundo. A terceira “volta”, com The Battle Rages On, rendeu outro disco bom (talvez melhor que o Strangers), mas a turnê de divulgação “desandou a maionese” da MKII de vez. Depois, veio a “fase Morse”, e uma banda completamente diferente, tanto em personalidade quanto em estilo musical.

    Belo resgate, Davi, e belo texto, também!

  2. É pena que a banda não aproveitou esse período do reencontro… Blackmore e Gillan logo se estranharam de novo, e em “The House of Blue Light” a música “Bad Attitude” deixou claro que os dois não iriam se bicar nunca mais. Assisti o show no final dos anos 80 por meio de um VHS pirata que um amigo meu conseguiu (sabe aquela cópia da cópia da cópia da cópia de um vídeo pirata? Mais ou menos assim), e quando saiu o DVD, comprei – só para não rodar no meu aparelho nem no computador. Troquei na loja, mesmo problema. Aí troquei por outro DVD… Os shows dessa turnê eram bons, como atesta o “In the Absence of Pink”, com o show em Knebworth. Mas não sei se vai ter mais algum lançamento dessa época… Muito bom o texto, Davi, obrigado por trazer essa pérola de volta.

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