Discos que Parece que Só Eu Gosto: Iron Maiden – No Prayer for the Dying [1990]

Discos que Parece que Só Eu Gosto: Iron Maiden – No Prayer for the Dying [1990]

Por Fernando Bueno

Como quase todos aqui, tenho bastante contato, seja pela internet ou pessoalmente, com pessoas que curtem heavy metal em geral, e muitas dessas pessoas gostam de Iron Maiden. Para muitos, foi a banda que os iniciou no mundo do heavy metal e os ajudou a moldar sua personalidade musical, porém nem todos são fãs incondicionais (alguns, claro, são fanáticos!!!). Claro que alguns não gostam da banda ou só se interessam por determinados discos, porém não existe quem consiga desmerecer a fantástica sequência dos sete discos lançados de 1980 até 1988. Já li e ouvi muitos falando que gostam de Iron Maiden até o Seventh Son of a Seventh Son (1988), último da citada sequência. Desse modo, No Prayer For the Dying, oitavo registro de estúdio do grupo, é meio que considerado uma quebra de qualidade na discografia do Iron Maiden, um álbum de transição em sua brilhante carreira, e é frequentemente esquecido pelos fãs.

No Prayer for the Dying marca a estreia do guitarrista Janick Gers (White Spirit, Ian Gillan Band, Fish, Gogmagog) substituindo Adrian Smith, e foi então a primeira modificação de um membro na formação do grupo desde 1983. Adrian contribuiu muito para a banda, principalmente nos três discos de estúdio anteriores, a saber, Powerslave (1984), Somewhere in Time (1986) e Seventh Son Of A Seventh Son (1988), e imaginou que poderia contribuir cada vez mais, inclusive em seu direcionamento musical. Na verdade, ele queria partir para algo mais acessível, e foi barrado pelo chefe Steve Harris. Possivelmente isso o deixou um pouco sem clima no grupo, e acarretou em sua decisão de sair (o que ele gravou depois na banda Psycho Motel dá mais ou menos uma ideia do que estava querendo fazer).

No meu caso, o disco que é tema desta matéria foi um dos primeiros álbuns da Donzela de Ferro que comprei. Já tinha o The Number of the Beast e o Maiden Japan, por exemplo, e o comprei logo no lançamento. Posso dizer que ouvi No Prayer For the Dying quase tantas vezes quanto o próprio The Number.

Durante esse período Bruce Dickinson tinha acabado de gravar seu, até então inédito, disco solo, Tattooed Millionaire (1989). Algumas das ideias que ele teve para esse disco já tinham sido apresentadas, e prontamente recusadas, para o próprio Iron Maiden. Com a saída de Adrian, e a banda precisando de um guitarrista, a entrada de Janick, que havia participado do disco solo de Bruce, pareceu até óbvia.

O resultado final do álbum foi muito influenciado por uma decisão que Steve Harris tomou antes de começar a gravá-lo. Steve percebeu que o fato da banda ter se tornado uma gigante fez com que os shows, os discos, a produção, a divulgação e tudo o que estivesse relacionado com eles ficasse grandioso demais. Assim, ele decidiu que deveriam fazer algo mais simples, mais pés no chão. Isso afetou diretamente na produção do álbum, que é claramente inferior, principalmente se comparado ao Somewhere in Time ou a Sevent Son Of A Seventh Son. A inclusão de teclados, que foi maciça nesses dois discos, foi deixada de lado, fazendo com que as músicas fossem mais diretas. O álbum foi gravado em um estúdio do próprio Harris, e as músicas foram registradas praticamente ao vivo. Os shows também mudaram: os palcos enormes e cheios de efeitos foram substituídos por apenas um paredão de amplificadores Marshall, o que já seria um sonho para 99% das bandas.

Duas faixas do álbum se tornaram singles, “Holy Smoke” e “Bring Your Daughter to the Slaughter”. A primeira (cuja capa você confere aqui ao lado) já é um bom exemplo de outra mudança que ocorreu nesse disco, a questão lírica. O Maiden passou a falar de questões do dia a dia, e essa faixa é uma crítica a grupos religiosos que só se preocupam com a grana e deixam a espiritualidade de lado. Na minha opinião, essa música seria mais adequada para abrir o disco do que “Tailgunner”, pois tem um riff de abertura mais marcante. Entretanto, “Tailgunner” tem um refrão que gosto muito, e a voz do Bruce está ótima nela.

O segundo single, “Bring Your Daugther to the Slautghter”, foi curiosamente o primeiro número 1 da banda na Inglaterra. Digo que isso é curioso já que o single que conseguiu este feito é de um disco sem tanta exaltação, e a faixa, apesar de ter se tornada clássica, não é nem de longe melhor que os clássicos dos discos anteriores. A banda teve problemas com sua letra, pois grupos religiosos entenderam que ela tinha a ver com sacrifícios humanos. Por causa dela, o Iron Maiden foi proibido de tocar no Chile, por exemplo.

O seu lançamento também traz outras curiosidades: o Iron é conhecido por saber promover seus produtos, então edições especiais são normais na discografia da banda. Os colecionadores adoram, e gastam muito dinheiro, em singles de 7”, 12”, picture, shaped, etc… E esse single foi o primeiro a ter capas diferentes, sendo que no caso foram três. Outro detalhe é que essa faixa já havia sido gravada por Bruce Dickinson, o compositor, com outros músicos, para a trilha sonora de “Nightmare on Elm Street 5: The Dream Child”, ou como foi lançado no Brasil, “A Hora do Pesadelo 5: O Maior Horror de Freddy”. Steve Harris achou que a faixa ficaria boa em uma versão do Maiden, convenceu Bruce a não colocá-la em seu disco solo, e provou que estava certo.

As três capas do single “Bring Your Daughter To The Slaughter”

A faixa título é talvez uma das mais subestimadas da carreira da banda. Suas frases de guitarras são belíssimas, e ela evolui da calmaria em seu início, passando por um ótimo solo e chegando a um final rápido e emotivo. Na época, eram muito famosos os comerciais do cigarro Hollywood, e sempre tinha uma música marcante de alguma banda famosa (em meio a outras nem tanto). Eu sempre pensava que “Public Enema Number One” poderia também ser tema do comercial, afinal seu refrão gruda na cabeça, e até hoje quando a ouço fico com ele por um tempão ecoando nos ouvidos.

Duas das faixas mais esquecidas do Iron Maiden, e que mereciam mais atenção dos fãs, são “The Assassin” e “Run Silent Run Deep”. A primeira tem uma introdução com um criativo trabalho de guitarras, enquanto a segunda talvez seja a melhor dessas faixas esquecidas e até desconhecidas. As estrofes têm as cavalgadas características do Maiden, seu refrão tem talvez o melhor trabalho de Bruce no álbum, e o solo é melodioso, daqueles que a gente pode cantar nota por nota junto.

Algumas faixas poderiam ser melhor trabalhadas e talvez tenham sido tratadas durante a gravação do álbum apenas como fillers (faixas popularmente conhecidas como “para encher linguiça”). “Fates Warning” tem até algumas coisas interessantes, enquanto por anos tratei “Hooks in You”, única faixa com contribuição de Adrian Smith, como a pior da banda. Hoje até tenho outras para assumir o ponto mais alto desse indesejado pódio, mas “Hooks in You” não melhorou em nada ao longo dos anos.

O álbum fecha com “Mother Russia”, com melodias marcantes, excelente solo, e andamento bem diferente do que a banda costuma fazer. Seu dedilhado lembra muito tudo o que o Iron fez depois da volta de Bruce para a banda em 1999. Os mais novos que apreciam essa fase vão se identificar e certamente gostar. Apesar de não ser longa, como “Rime of the Ancient Mariner”, “Alexander the Great” ou a faixa título do álbum anterior, considero-a um épico também até pela sua temática, sendo ultimamente a faixa que mais me faz buscar o álbum para ouvir.

Atualmente, as faixas de No Prayer for the Dying são ignoradas nos shows, e para ouvi-las ao vivo temos que procurar bootlegs da época. Na “No Prayer on the Road”, a turnê de divulgação do álbum, podemos encontrar sete da suas dez faixas sendo executadas nos shows, mas é claro que nem todas entravam em uma mesma apresentação (a saber, apenas “Fates Warning”, “Run Silent Run Deep” e “Mother Russia” não foram tocadas ao vivo).

As diferentes capas de No Prayer For the Dying

Para acabar gostaria de falar um pouco sobre sua capa. Seguindo a linha proposta para o álbum todo, não tem a imponência que tiveram Powerslave ou Somewhere in Time. É o Eddie saindo de um túmulo e agarrando a garganta de um coveiro. Apenas isso. Em seu relançamento anos depois, a capa ficou ainda mais simples, com a retirada do coveiro, um pedido de Rod Smallwood a Derek Riggs. Rod não gostava dessa azarada figura, e convenceu todos que assim ficaria melhor. O Eddie desse disco também não apresenta o corte na testa (resultado de uma lobotomia) que ostentava desde Piece of Mind. Também foi lançada uma edição limitada do álbum com uma capa diferente, fazendo alusão à letra de “Tailgunner”. Com uma certa semelhança com a ideia usada no single de “Aces High”, essa capa é bastante procurada pelos colecionadores, que além da edição normal ainda precisam encontrar a versão picture do álbum.

O fato de eu estar enaltecendo esse disco e tentando mudar a ideia dos leitores não quer dizer que eu ache esse álbum tão bom quanto qualquer um dos anteriores. Acho todos eles superiores, e o fato de eu exaltar No Prayer For the Dying demonstra ainda mais o respeito que tenho por todos os seus antecessores. Então, o que acham de ir lá pegar seu CD ou LP (que devem estar empoeirados lá na sua estante) e voltar a ouvi-lo? Agora, talvez, com outros ouvidos…

Track list

  1. “Tailgunner”
  2. “Holy Smoke”
  3. “No Prayer for the Dying”
  4. “Public Enema Number One”
  5. “Fates Warning”
  6. “The Assassin”
  7. “Run Silent Run Deep”
  8. “Hooks in You”
  9. “Bring Your Daughter… to the Slaughter”
  10. “Mother Russia”

17 comentários sobre “Discos que Parece que Só Eu Gosto: Iron Maiden – No Prayer for the Dying [1990]

  1. Muito bom, conhece gente que ouviu o álbum no máximo 03 vezes e está anos a fio parado na prateleira ignorado. Eu dei mais chances a ele, numa época que eu ouvia muito maiden, quando enjoava dos álbuns dos anos dourados, recorria sempre ao NPFTD para "limpar" os ouvidos, então curti muito o disco, principalmente a faixa título, por ser baixista, gosto muito de tailgunner, pra mim é uma das melhores linhas de baixo compostas por Steve Harris, apesar de não ser um clássico. Concordo que Holy Smoke deveria ser a faixa de abertura e não sou muito fá de Mother Russia, acho ela muito parecida com a faixa título do álbum anterior.

  2. Cara, gosto muito desse album também, foi meu primeiro disco do Maiden que comprei na época em que foi lançado e tem várias músicas que gosto muito. Não concordo com os que malham tanto esse disco.

  3. Gosto muito deste disco por ser muito cru. metal simples com baixo, guitarras, bateria e vocal. a faixa título é belíssima. quando estou chapado de cerveja sempre a coloco para dormir. o disco tem muita coisa boa que infelizmente ficaram esquecidas pela banda no decorrer dos anos. é uma pena eles não tocarem "no prayer for the dying, holy smoke e raramente tocam bring your daughter to the slaughter". agradeço ao brother fernando bueno pelo comentário sobre o disco e espero que as pessoas escutem com mais atenção esse ótimo album do maiden. atualmente os caras parecem que estão em outro planeta. os discos já não agradam muito como antigamente mas mesmo assim eu os compro e os escuto para tentar entender melhor o momento da banda. valeu, um abraço a todos. Heavy Metal Is Forever!

  4. Gosto muito desse disco, pq ele não é melódico e tão comercial como o Somewere in Time e do superestimado Seventh Son(acho esse disco muito chato). Capta o pezo da banda dos primeiros 3 discos. É mais cru. Isso é muito bom.

    1. Eu não acho o Seventh Son of a Seventh Son um disco chato, eu até gosto dele, mas não sou tão fã deste disco quanto boa parte dos fãs da banda diz que é. Só acho que ele é o lado oposto do Somewhere in Time: os teclados e sintetizadores eram mais exagerados neste do que no disco de 1986 do Maiden, e também foi em SSOASS que o grupo mais abusou da influência do progressivo do que em qualquer outro disco deles. E o conceito por trás do álbum e de suas letras é bastante difícil para analisar. Acho muito estranho quando alguém cita SSOASS como o melhor disco da Donzela…

      1. Eu gosto muito desse disco, assim como Somewhere in time. Esse disco comprei na época do lançamento e sempre escutava. Confesso que a vida corrida deixei meu vinil e meu cd de lado, mas após esse texto voltarei a escuta-lo.

        1. Eu acho que o Seventh Son ficaria melhor sem os teclados e se seu conceito fosse menos exagerado e controverso… Se fosse assim eu valorizava mais este álbum hoje do que no passado!

  5. Eu acho que o disco mais decente do Iron Maiden nos anos 90 foi “Fear of the Dark”, mas No Prayer for the Dying é um bom trabalho, apesar de ser um dos mais malhados pelos fãs.

  6. Foi o primeiro disco do Iron que eu comprei, lá nos anos 90 e eu ouvi bastante, bastante mesmo pra dizer que é um dos menos inspirados da vasta discografia, especialmente considerando o período até a saída do Bruce.
    Vejo um conjunto de fatores aqui, desde a saída do Smith (embora a chegada do Gers foi muito legal), à decisão de uma gravação mais “simples” (pra mim, soa simplória demais, quase tosca pros padrões do Maiden), etc. Pensa esse mesmo disco com um som mais encorpado como o Fear of the Dark! Sem dúvida exaltaria as boas músicas que têm aqui.
    Mas, na minha visão, é um disco nota 7 pra uma banda nota 10!

  7. Nos últimos anos, o Iron Maiden tem se “esforçado” em lançar discos tão esquecíveis que até parece que o objetivo da banda é mostrar que esses discos do início dos anos 90 (No Prayer for the Dying e Fear of the Dark) não são tão ruins. Os últimos três álbuns são tão marcantes quanto a seleção brasileira da Copa de 90…

    1. Eu vou ter que discordar. Sei que os discos recentes do Maiden são diferentes dos do início da carreira e é normal que muita gente não goste. Mas vou dar só um exemplo: o último disco tem The Writings on the Wall que hoje em dia é cantada pelo público da mesma forma que fazia quando Fear of the Dark foi lançada. Ou seja, se tornou um clássico instantâneo da banda. A banda mudou…só isso.

      1. Concordo com o Fernando. Gosto muito de “The Book of Souls” desde que o ouvi pela primeira vez, e o “Senjutsu”, embora esteja aquém do anterior, também é um bom disco. A banda se tornou um pouco uniforme em seus álbuns, mas acho que o Iron Maiden conseguiu envelhecer com dignidade. Nenhuma banda demora quarenta anos para lançar seu melhor disco, por que o Iron Maiden seria exceção?

      2. A banda desistiu de fazer grandes músicas para fazer músicas grandes. Não é à toa que não há músicas dos últimos 5 discos nos shows novos. Aliás, desde A Matter of Life and Death, as músicas novas só sobrevivem a uma turnê. Minha paciência acabou depois do Dance of Death. Acho que ouvi o Senjutsu uma vez e me lembro de ter acordado no meio do primeiro disco depois de um cochilo…Eles conseguiram aliar a chatice do progressivo dos anos 70 (mas sem a profundidade que as bandas daquela época tinham) com a falta de inventividade das bandas do metal moderno….não é nostalgia de tiozão. É só falta de paciência, mesmo. A vida é curta demais para perder tempo com uma música de 18 minutos que não diz nada.

        1. Entendo e concordo em partes. Mas confesso que adoro “Empire of the Clouds”!!!
          Mas o Senjutsu eu ouvi inteiro uma vez só, depois nunca mais. Pra curtir, ai contrário dos discos dos 80s, parece que a gente precisa ouvir muuuuuito mais vezes.
          No entanto, também concordo com o Marcello quando diz que seria meio incomum uma banda de mais de 40 anos fazer seu melhor disco agora.

          1. Pois é… Primeira vez que senti vontade de ir assistir a um show do Iron Maiden, para falar a verdade… Trazer de volta as músicas do “Somewhere in Time” e colocar com as do “Senjutsu” me surpreendeu!

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