Discografias Comentadas: Marvelous 3

Discografias Comentadas: Marvelous 3
Doug Mitchell, Butch Walker e Jayce Fincher
Mitch McLee, Butch Walker e Jayce Fincher

Por Diogo Bizotto

Quem aqui nunca foi motivo de chacota por conta de suas preferências musicais? No meu caso, não são poucos os grupos e artistas que já me colocaram em situações que alguns podem considerar constrangedoras – para as quais eu costumo não dar a mínima. O Marvelous 3 é uma dessas formações. Com seu jeitão tipicamente noventista de unir pop rock com uma dose de poppy punk, o trio de Atlanta (Georgia) normalmente nem estaria entre minhas preferências, já que essa sonoridade dificilmente é do meu agrado. A força das composições de Butch Walker, porém, além de uma pegada power pop setentista, me conquistaram desde o momento em que travei contato com “Freak of the Week”, seu único hit. Guitarrista e vocalista, Butch já era conhecido por empunhar as seis cordas do grupo glam metal SouthGang. Ao lado de seus ex-companheiros Jayce Fincher (baixo) e Mitch “Slug” McLee (bateria), o músico formou o Marvelous 3 em 1997 e logo em seguida lançou Math and Other Problems, dando início a uma trajetória curta, mas intensa, deixando ao menos dois ótimos álbuns para a posteridade e seguindo depois uma carreira solo prolífica.


01 Math and Other ProblemsMath and Other Problems [1997]

O primeiro disco do grupo soa mais como um aperitivo do que estava por vir do que qualquer outra coisa. Por mais que haja alguns destaques, Math and Other Problems ainda ficou devendo no quesito composição, e mesmo as faixas mais interessantes soam como versões beta daquilo que seria apresentado em Hey! Album e ReadySexGo. No entanto, além das performances evidentemente enérgicas do grupo, pode-se destacar boas canções no tracklist. Uma delas é “Appetite”, faixa de abertura, aquela que melhor indica o caminho que seria explorado pelo grupo em seus dois discos seguintes, unindo energia quase juvenil, instrumental na linha mais pop do rock e uma pitada de poppy punk, além de bons ganchos e refrãos pegajosos. Mostra ainda o estilo bem humorado de abordar o cotidiano e relacionamentos presente nas letras de Butch, sem exageros e grandes extravagâncias, como nas power ballads oitentistas. Por falar em baladas, outra boa canção presente em Math and Other Problems é “Cars Collide”, mais uma a indicar caminhos que seriam melhor explorados posteriormente. “Bottle Rockets” também chega a empolgar, com seu riff bem hard rock e linhas vocais menos convencionais, chegando a lembrar “Working on the Highway”, de Bruce Springsteen. Com seu início meio grunge, mais displicente, “Katrina” é outro destaque, que merece ser ouvido enquanto se acompanha sua engraçadíssima letra. Além das citadas, “Leopard Print” e “Valium” também podem colocar sorrisos no rosto dos ouvintes, mas, como reafirmei, o melhor ainda estava por vir.


02 Hey! AlbumHey! Album [1998]

Lançado primeiramente de forma independente e com uma capa diferente da que está representada ao lado, além de um tracklist com uma ou outra diferença, Hey! Album chamou atenção da gravadora Elektra, que resolveu encampar o Marvelous 3 e soltou o disco de maneira oficial meses depois. Não é difícil imaginar o porquê. Mais variado, melhor composto e com uma produção mais caprichada que seu antecessor, o álbum exala energia em cada faixa, a começar pelo único hit do trio em sua curta carreira, “Freak of the Week”. “Viciante” é a melhor palavra para defini-la, uma vez que não raro a ouvi no repeat (uma curiosidade: é a faixa mais executada segundo meu perfil no last.fm), embasbacado com quão funcional é sua simplicidade: uma linha de baixo basicona, guitarra sem invencionices e um refrão bombástico. Pop rock bem melódico, de um jeito que o Marvelous 3 demonstrou dominar muito bem ao longo do tracklist. Além disso, fica também latente que, apesar de sua sonoridade estar alinhada com a época, muitas de suas influências vinham da década de 1970, como Cheap Trick, Big Star, Raspberries e David Bowie, colando ao grupo o justo rótulo de power pop. Apesar da simplicidade dos arranjos, é perceptível que Butch é um guitarrista com domínio de seu instrumento, capaz de mais variedade que seus contemporâneos do estilo. Mesmo assim, mantém as linhas vocais como fio condutor das canções, com o instrumental servindo como competente auxiliar. Citei, ao comentar Math and Other Problems, que “Cars Collide” indicava um caminho que seria melhor explorado anteriormente. Pois bem: as baladas são um ponto fortíssimo de Hey! Album. “Until You See” é uma delas, assim como “Let Me Go”, que chegou a receber um videoclipe (e é uma das minhas canções favoritas da banda), mas que não repetiu a performance de “Freak of the Weak”, e “Indie Queen”, na qual Butch arrisca interessantes falsetes e carimba mais um refrão com o padrão de qualidade que estava se tornando regra em suas composições. Em uma linha parecida vem “Lemonade”, surpreendentemente longa para os padrões do grupo (mais de seis minutos), incluindo ainda uma boa quantidade de linhas de teclado, mas que entrega outra boa performance. De resto, o álbum mantém uma uniformidade bem satisfatória, com faixas de personalidade única. “You’re So Yesterday” é bem diferente de “Every Monday” (segundo single), assim como esta não se parece com “Fastboat” (presente apenas na versão independente), e todas são boas.


03 ReadySexGoReadySexGo [2000]

Com guitarras mais musculosas e na cara, além de uma pegada mais hard e um visual mais espalhafatoso, ReadySexGo mostra um Marvelous 3 mais alinhado com o passado glam metal do trio. Isso não significou uma mudança efetiva no estilo de composição de Butch, mas fica nítido que a atmosfera do álbum remete ao final dos anos 1980, com um senso de dramaticidade distinto daquele dos dois álbuns anteriores. O resultado disso, felizmente, foi mais um disco equilibrado, recheado de boas canções; ainda bem pop rock mas com um jeitão mais hard – inclusive nas timbragens e nos vocais de apoio (ouça “Grant Park”) – que poderia conquistar uma parcela maior de fãs. Bem, isso não foi exatamente o que aconteceu na época. Além de más escolhas para singles, “Get Over” e “Sugarbuzz” – boas músicas, mas longe de ser os maiores destaques –, o grupo se desentendeu com a Elektra (chamada por eles de “Neglectra”), alegando negligência e falta de interesse da gravadora na banda, culminando com sua saída do selo e o fim das atividades, encerradas oficialmente após um show em um parque de sua Atlanta natal. Não sei se o resultado teria sido diferente caso as escolhas para os singles fossem diferentes (se a banda foi mal promovida, é bem possível que não), mas julgo que seria bem mais adequado ter lançado “Beautiful” como um deles. Dona de uma ponte de de um refrão de tirar o fôlego, é sem dúvida superior às faixas divulgadas e gruda na mente do sujeito tal qual chiclete, e isso não é necessariamente uma coisa ruim. A pegada mais poppy punk é representada por “Little Head”, enquanto “I’m Losing You” traz alguma influência eletrônica (acreditem se quiserem, mas consigo enxergar semelhança entre seu refrão e o de “I Am a Pig”, do 2wo, projeto de Rob Halford e John 5). E as baladas? Ah, as baladas… É nelas que se encontra o fino do tracklist. Como disse anteriormente, é evidente em ReadySexGo uma pegada mais hard em relação aos dois lançamentos anteriores, e isso transparece nas faixas dessa natureza, mais bombásticas que o habitual. “Radio Tokyo” tem direito a introdução ao piano, escalada de peso, refrão cheio de vocais de apoio e um solo de guitarra que é uma viagem à década de 1980 ou mesmo a algum álbum do Meat Loaf. “Cigarette Lighter Love Song” não fica muito longe: seus créditos estranhamente divididos por Butch e David Bowie explicam-se no fato de que a melodia de “All the Young Dudes” foi tomada emprestada em alguns segmentos da canção, funcionando perfeitamente na construção de sua dramaticidade. Na ponta do lápis, ReadySexGo não chega a ser um disco tão bom quanto Hey! Album, mas passou perto.


Como citado acima, o trio encerrou atividades após a turnê para ReadySexGo, mas os músicos mantêm a amizade até hoje, tanto que shows de reunião já ocorreram várias vezes, mas sem a intenção de colocar o grupo na estrada definitivamente ou gravar material novo. Além disso, em diversas apresentações de Butch, Jayce e Mitch já subiram ao palco para executar músicas do Marvelous 3. A carreira solo de Butch segue no limiar entre o mainstream e o underground, incluindo participações especiais e presenças em trilhas sonoras. Mais próxima do mainstream vive sua carreira como produtor (função que já exercia no Marvelous 3) e compositor. Sua assinatura encontra-se em álbuns de artistas como Taylor Swift, Sevendust, Pink, Weezer e vários outros. Sua relação com a cantora canadense Avril Lavigne é especialmente frutífera, gerando hits como “Don’t Tell Me”, “When You’re Gone” e “My Happy Ending” – que, para finalizar esta discografia comentada do mesmo jeito que a iniciei, falando sobre “vergonhas” musicais, é uma baita música.

Um comentário em “Discografias Comentadas: Marvelous 3

  1. Eis uma das coisas mais bacanas do site, bons textos, como este do Diogo, que nos empurram pra ouvir bandas que a gente nunca ouviu falar.

    Já na filha aqui para ir atrás dessa, Diogo!

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